Carnaval, duas da manhã

Duas da manhã e eu tenho que procurar um lugar para comer.

Na lanchonete onde me sento os balconistas estão assistindo ao desfile da Viradouro. Passo a conversar com um deles sobre as usinas de açúcar em Sergipe, sua importância como berço de cidades, e fico conhecendo um novo verbo: “pejar”. É quando as usinas param sua produção, durante quase metade do ano.

E então aparece Dercy Gonçalves, de perna para cima.

Os outros balconistas se amontoam em frente à TV.

— Olha a calçola dela! Ela tá arreganhada! Ah, velha safada!

Um deles comenta:

— Mas mesmo velha, tem gente que ainda pega.

Imediatamente o outro acrescenta:

— Ele tá dizendo que ele pega.

— Pego mesmo! Se der mole na minha frente, eu pego mesmo!

A conversa continua. Quando me despeço, o valente me pede um cigarro.

— Ei, amigo, me arranja um desses pr’eu torar mais tarde.

(“Torar” é um verbo sergipano, provavelmente oriundo de estourar, que originalmente significava quebrar, mas que hoje serve para qualquer coisa. Pode ser comparado à gíria “detonar”. Um psicanalista faria a festa com o que essa palavra conta sobre a psique masculina nordestina.)

Eu dou o cigarro; e junto dou um conselho.

— Olha, cá para nós, é melhor torar a Dercy do que um cigarro.

E ele concorda, em meio a gargalhadas.

Bem vindo a Sergipe.

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