Aracaju ao longo de 15 quarteirões

Na frente do hospital, sentados na calçada, um casal olha para o vazio. Uma menina apóia a cabeça no joelho do rapaz e chora baixinho.

Mais adiante, um homem chega e é recebido pela filha, que tenta sem sucesso enxugar as lágrimas.

Na igreja em frente o padre reza a missa alheio a tudo.

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Sentada na calçada diante do Conservatório, a moça diz para a amiga:

— Tem que ter uma corzinha, pra poder enxergar. Gosto de branquelo, não. Meu namorado é um negão.

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Na calçada, a família coloca suas cadeiras e conversa sobre a vida, ocupando todo e espaço numa tentativa de aproveitar a brisa da noite. E o tempo parece que não passa, que é a Aracaju de 30 anos atrás, em que as pessoas ainda tinham pouco medo umas das outras, e viam a cidade como uma extensão de suas casas.

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Em frente à Catedral um menino anda de bicicleta. Uma menina fala com ele e recebe uma resposta dura. Os amigos dos dois incitam:

— Ele lhe chamou de vagabunda!

A menina, gordinha, uns 13 anos, aceita a provocação e vai atrás do ciclista que pedala rápido em direção aos fundos da igreja.

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O casal de comerciários anda de mãos dadas em direção ao ponto de ônibus, sorrindo ao fim de um dia de trabalho. Parecem fazer planos para um fim de semana que, eles sabem, vai demorar muito a chegar.

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Sentadas no batente de uma loja fechada, duas prostitutas fumam maconha. Suas expressões, antes de serem tristes, são cansadas. Cansadas da noite que apenas começa e cansadas do que deixaram para trás. Bandeirolas de São João decoram a rua.

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Prostitutas e vendedores de churrasquinho de gato olham para a esquina ao longe, paradas no meio da rua.

— Os dois saíram correndo, alguma coisa aconteceu.

Na esquina oposta, um homem conversa com dois policiais que riem, mãos pousadas em seus .38 niquelados.

— Os cabra correu de medo, uns frouxo.

Amanhã devo mudar meu roteiro de caminhada noturna.

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