Meus verdes anos II

Zilma, professora de português, entra na sala.

— Rafael, trouxe o livro?

— Não.

— Saia.

— Professora, eu não fiz nada!

— Mas vai fazer. Saia.

***

Santos, professor de inglês, cuja tese de que “tchê” era uma palavra e “oxente”, não, gerou algumas discussões:

— Vocês sabem quantas vezes as bombas atômicas que os Estados Unidos e a União Soviética têm podem destruir o mundo?

Eu levanto a mão.

— Uma, professor.

— Nada disso! São mais de 500!

— Uma, professor.

— São mais de 500!

— Só tem um mundo, professor.

***

Rosa Virgínia, de geografia:

—… Nostradamus preveu que o mundo…

— Nostradamus não preveu nada, professora.

— Como não? Eu tenho o livro!

— Dizem que ele previu algumas coisas. Mas não preveu nada.

***

Zilma me pega dando cola a Fabiano numa prova e me tira um ponto.

A redação daquele dia foi mais ou menos assim:

“Algumas pessoas xingam suas professoras. Xingam de vagabunda, de piranha, até de coisas ainda mais feias como prostituta. Isso não se deve fazer. Isso é feio.”

***

Dênisson quebra o pau com Santos e vai para a coordenação de disciplina, que julga o caso grave o suficiente para ir ao padre. Enquanto ele espera, me sento ao seu lado para fazer companhia.

Inara volta e leva os alunos que estão ali para a sala do padre Carvalho. E diz para eu ir também. Não adiantam os meus protestos de inocência. Eu também vou para o padre, revoltado com tamanha injustiça, reiterando meus protestos de inocência, enquanto alguém — Paulo? Dênisson? — enfia a mão no aquário e tenta matar os peixes do padre. Foi a única vez que o padre Carvalho não passou a mão na minha cabeça. Não gostou muito dos meus protestos.

O Arquidiocesano tinha acabado de inventar a punição retroativa. E talvez a preventiva.

4 thoughts on “Meus verdes anos II

  1. Hehehehe, adorei as historinhas…

    Eu tenho uma verdadeira, quando eu e meu irmão gêmeo sentávamos na primeira fileira da sala, e ficávamos trocando olhares cúmplices quando nossa professora Zuila (nunca esqueci esse nome!!!) dizia coisas como essa, referindo-se ao estado de Iowa:

    – Olha gente, vamos pronunciar certo: não é “IOVA” não, viu? É “IOUA”, o W tem som de U…

    Ou essa:

    – A maior cidade americana tem um nome em português que é melhor usar. Vamos usar “NOVIORQUE”, porque ficar falando “NIORQUE” é coisa de gente exibida…

  2. Não posso dizer que fosse um santo, mas um professor de ciências entrava na sala e perguntava: “Allan, vamos estudar ou contar piada?” E fazia o que eu dissesse, sem insistir. Mas eu respeitava os limites que ia descobrindo. Corrigir professor é atitude suicida. Como foi que você sobreviveu? 🙂
    Ciao

  3. Bem feito! Como diz minha mãe, você parece que não era boa bisca camarada. Abraço.

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