E assim se passaram 10 anos

A Folha de S. Paulo resolveu fazer um caderno comercial em comemoração aos 10 anos da internet comercial no Brasil, na semana passada.

10 anos, já.

Acessei a Internet pela primeira vez em agosto de 1995. Ainda não havia provedores em Aracaju, onde eu morava, mas um amigo meio alucinado, Maurício, conseguiu uma daquelas contas experimentais da Embratel — na época estatal — e ligava para Recife todas as madrugadas.

Nós já acessávamos BBS, principalmente uma “conferência” de bobagens chamada Abobrinhas, em uma rede chamada SyNC-Net. Mas a internet era outra coisa.

O que mais me surpreendeu naquelas poucas horas foi a quantidade de informação que se podia ter. Nao foi a web que me seduziu naquela madrugada: foi a Usenet, e mais especificamente o rec.music.beatles. Até hoje esse grupo é, provavelmente, o maior repositório de informação sobre Beatles existente, superando até mesmo os livros de Mark Lewinsohn. Eu fiquei maravilhado. Aquilo era mais que trocar mensagens e baixar pequenos arquivos obsoletos. Aquilo era o futuro.

O resto é história.

Foi só no ano seguinte que passei a usar a internet diariamente. Lembro de pagar 90 reais por 80 horas de acesso mensais, algo como 220 reais hoje se formos usar o dólar como padrão. Só no final de 97 o acesso ilimitado chegou a Aracaju, por 60 reais. Dos programas que usava naquela época — Netscape, Eudora, mIRC, iPhone, Free Agent, WSGopher (alguém ainda sabe o que é isso?), ICQ (meu UIN tem 6 dígitos, apenas) –, o único que sobreviveu no meu computador foi o CuteFTP, e mesmo assim porque estou acostumado e FTP não é algo que mude todo dia (a versão que uso é a 4; ele ja está no 7). E eu ainda usava o Windows 3.11 em um 386, o velho e bom Percival.

Talvez por isso eu tenha olhado com atenção o caderno da Folha. Não é a pior coisa do mundo. Serve, quando menos, para mostrar que ao contrário da lenda a Microsoft foi rápida ao perceber a revolução da internet: seu browser — se é que se pode chamar essa coisa chamada Internet Explorer de browser — foi lançado dois anos depois do Mosaic; para uma empresa do seu tamanho, é um feito e tanto. Aqui e ali ele levanta uma ou outra lembrança, aqui e ali comete erros crassos (como por exemplo ao chamar o Pirch de “rede”, quando era apenas um programa, concorrente do mIRC). Erra na perspectiva: mal se refere a blogs, por exemplo. Comete alguns atos de má-fé, como ao negar ao JB a primazia entre os jornais na internet, chamando-o de apenas “um dos primeiros”. Quando tenta contextualizar os velhos tempos, usa uma Quick Take, a câmera digital pioneira da Apple. Mas ninguém usou a Quick Take. Eu nunca a vi na minha frente.

Mesmo assim o caderno dá uma visão razoável desses 10 anos. O problema é que, de acordo ele, a internet basileira é o UOL. De modo geral essa edição é basicamente uma grande propaganda do provedor do grupo Folha. E os portais são a razão de ser da internet.

Pior que isso, negam ao iG a sua importância. Não fosse pelo iG e pelos provedores gratuitos que se seguiram, como o iBest e o Click21, a internet demoraria mais para se popularizar. Por essa abordagem, negam também ao BOL a sua parte, por ter sido o primeiro e-mail gratuito realmente popular no país, mais até que o Zipmail.

Acho que vou ficar com as minhas lembranças, não com as da Folha de S. Paulo.

8 thoughts on “E assim se passaram 10 anos

  1. Parei de acreditar na seriedade dos especiais dos jornais quando Brizola foi chamado pelo O Globo de ‘O último estadista do Brasil’. Enaltecer o errado parece regra pra certas publicações.

    Prefiro ver a internet com meus próprios olhos: meu primeiro 486, o ‘íncrivel’ monitor SVGA que tinha, os primeiros sites, a raiva de não ter comprado ações do Yahoo e do Amazon, o crescimento exponencial dos sites de notícias que me deram a oportunidade de ainda viver na Nova Zelândia e Inglaterra, países que deixei pra trás mas nunca esqueci, e agora a possibilidade da exposição de idéias através de blogs, que são, pra mim, umas das coisas ferramentas de comunicação mais interessantes que já criamos.

  2. A primeira vez que eu acessei a internet foi em 92. Muitas lembranças desde lá. Lembro que existiam meia duzias de chats e o Zaz era legal. Ter e-mail no zipmail era o máximo. Modem 28k era o must.

    Ter 10 horas mensais era muito e as vezes até sobrava.

    Eu acessei a internet antes disso, graças ao emprego do meu pai na EBT, mas os acessos de 92 são os que eu mais me recordo.

  3. Também fui apresentada em 95, pela BBS NETPE. Papai era viciadão. 🙂
    Mas comecei a usar quase diariamente na faculdade em agosto de 1996, em terminais de Vax… aqueles com tela preta e letras verdes sem HD.
    Demorou muito pra ter uma rede decente lá na Eng. Civil da UFPE.

  4. Bá. Eu usava o Pegasus Mail, lá em 1994. Depois fui para o Eudroa Light. Mas acesso só no Colégio (estudava na Escola Técnica da UFRGS e por isso tive essas barbadas). Era conhecido como “Jacaré” no webchat da BRNet, um provedor de Brasília. Internet em casa tive só em 96, pelo VIA-RS, provedor do governo do estado. Antes de tudo isso, às vezes ficava na fila de um único terminal “público” do prédio de Informática da UFRGS para poder bisbilhotar o Vortex (acho que era esse o nome) e mandar um avô-e-mail para algumas seletas pessoas. Mas isso tudo parece que foi há uns 300 anos, não 10. 🙂

    Abraço, tchê!

  5. Eu usava a MandicBBS em 1994 e usava modem Zoltrix 1200bps sem correção de erros. Era mais rápidos, às vezes, mandar mensagens por motoboys. E a Falha de São Paulo deixou de ser séria há muito tempo.

  6. Quer dizer que o seu computador era Percival? O primeiro Apple II com que brinquei se chamava Rafael. Mentira. Mas legais estas reminiscencias. Lembro do serviço de teletexto que a Telesp oferecia em SP. Tinha chat e dava ate para acessar o Bradesco. Muito tempo mais tarde (1995) conheci o AOL nos Estados Unidos e o mix de conteudo proprietario e o WWW. Em 1996 comecei a graduacao e ai sim tinha internet de verdade nos win 3.1 com trumpet e nos muito mais empolgantes terminais burros. Deveia ter nascido um pouco antes para poder ter aproveitado a festa das .com no Brasil

  7. Pô, ninguem falou no Gopher, mail e na revolução que foi o Mosaic? Ninguem é desta época?

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