Sobre os 80 blogs da revista Época

A Época fez uma lista de 80 melhores blogs. Obviamente, eu discordo de grande parte dela. Eu e todo mundo — mas é justamente por isso que listas são gostosas. Mesmo quando são ruins, servem para alimentar o debate. Pessoalmente, gostei da inclusão do Nelson Moraes, do Inagaki, da Lucia Malla, do Pedro Dória, gente que eu leio. São grandes blogueiros. Por outro lado, não gosto dos assuntos da maior parte dos blogs citados. Não gosto de bichos. Não gosto de moda. Não gosto de fofocas de artistas. Não me importo muito com dicas para ganhar dinheiro com a internet, até porque ainda não consegui ganhar dinheiro nem mesmo fora dela. Isso não implica um julgamento de valor sobre qualquer desses blogs: apenas mostra que nenhuma lista vai ser considerada “perfeita” porque preferências individuais nunca coincidem completamente com estatísticas.

Mas acho que a lista da Época tem um grande problema conceitual, e é isso que me incomoda.

Boa parte dos blogs com cuja inclusão eu concordo são blogs jornalísticos. No fundo, se se deixar de lado o nome que adotaram, são colunas jornalísticas em um meio diferente e aceitando comentários. Os blogs do Noblat, da Miriam Leitão, do Reinaldo Azevedo, do Josias de Souza são isso: a mesma velha estrutura da imprensa institucionalizada adaptada a uma nova mídia. São importantes, claro, mesmo fundamentais; mas seria mais adequado classificá-los como a estratégia de sobrevivência (bem sucedida, a propósito) de uma estrutura antiga do que aquilo que se entende — ou entendia — como blogs. Independente de sua importância, são apenas seções de revistas e jornais. São uma velhinha de pernas bonitas que passou a usar minissaia.

Esse é o problema com a lista, a ênfase no que se pode chamar de blogs da grande mídia, que têm a estrutura de empresas tradicionais de comunicação. Se é possível fazer alguma distinção entre jornalismo e blogs, ela está justamente na “pessoalidade” dos blogs. Não é exatamente o conteúdo que faz um blog, mas a maneira como ele é disponibilizado. Conteúdo se acha em jornal, em revista — e quanto mais profissional a estrutura por trás deles, melhor tem condições de ser o tal conteúdo. Mas nos blogs o que se pode achar é algo diferente, sempre pessoal. Num blog como o do Pedro Dória, não é sequer a informação o mais importante: é o seu trabalho de edição e a sua opinião.

O que faz a graça da blogoseira é justamente a superação da necessidade de infra-estrutura jornalística por indivíduos comuns. É, para usar uma expressão até antipática de tão usada, a democratização da produção de informação. O que a blogoseira fez foi trazer um bocado de vozes para a ribalta, gente ouvida por milhares de pessoas ao mesmo tempo e que não teriam outra possibilidade de expressão. E de vez em quando essas vozes são tão boas que merecem ser ouvidas.

Citando apenas um blog de que senti muita falta na lista, O Biscoito Fino e a Massa, não custa lembrar que o Idelber fez um grande trabalho nas últimas eleições presidenciais americanas e municipais brasileiras. Não apenas fornecendo informação, mas principalmente boa análise e pontos de vista que merecem reflexão. E logo depois lembrou a todos que a questão israelense-palestina, mesmo longe das manchetes, está longe de acabar. Não é o trabalho de uma equipe profissional; acima de tudo é o resultado de um ponto de vista único.

É essa característica individual dos blogs que faz a sua força. No caso do Idelber, ao falar sobre o problema na Palestina ele apresenta uma alternativa aos meios tradicionais de informação que só é possível porque qualquer um, inclusive ele, pode montar um blog. O resto é apenas tecnologia de publicação, mais nada. Algo que pode ser feito — e mais bem feito, diga-se de passagem — por meios de comunicação tradicionais.

O americano Nick Carr falou recentemente da morte da blogoseira. Tem lá seus bons argumentos. Mas além de forçar uma mudança nos meios de comunicação — se tanto: nada garante que essa mudança não ocorreria se não houvesse blogs, e na verdade fala-se em interatividade nos meios de comunicação desde muito antes de o primeiro maluco escrever um diário online –, e mesmo que milhares de blogs desapareçam todos os dias, há muita gente por aí que continua fazendo um belo trabalho, sobre os mais variados assuntos. Assuntos que não teriam lugar em outros meios de comunicação porque não apelam a muita gente.

Por isso não tem graça escolher um monte de blogs jornalísticos. Por isso a indicação de blogs como os do Nelson, do Pedro e do Ina é tão importante. São blogs como deveriam ser. É bom encontrá-los em meio a tantos blogs corporativos.

15 thoughts on “Sobre os 80 blogs da revista Época

  1. Não gostei dos argumentos do Nick Carr. A comparação de blogs com o rádio amador não é muito coerente. Estes nunca fizeram exatamente o broadcast. E têm uma enorme diferença de recursos. Blog se cria com poucas clicadas e sem empatar grande capital. Basta o computador, que pode ser até de uma lan house. Também achei óbvia a constatação de que muitos blogs se transformaram em mainstream, com pesadas primeiras páginas. O fato não demonstra uma mudança geral. Era de se esperar. A verdade é que ainda é formato fácil de ser produzido e contendo conteúdo capaz de concorrer com a grande mídia, esta sim esgotando seu modelo. Grande parte do conteúdo dos jornais é ainda dedicado a colunas e artigos assinados, onde a concorrência com os blogs empata. Até mesmo para a apuração de notícia, algo que a grande mídia tem enormes recursos, com contratos com agências, grandes equipes, carros, é possível haver competição em blogs de segmentos especializados.

  2. Rafael,

    Eu não poderia concordar mais com o que você escreve. De fato, é da essência das listas, de tudo que envolva escolha, uma grande dose de injustiça. Tal como você realça é da essência dos blogs e das listas serem, no fim das contas, produtos de uma individualidade.
    Eu fico muito chateada com a ausência do Idelber nesta lista porque a importância desse trabalho que é oferecido a todos – e com uma qualidade que dificilmente se encontraria em blogs corporativos – vem praticamente desde que ele começou e foi se intensificando. E o Biscoito já é amplamente conhecido. 😉 [que frase, meu deus!] Todo mundo concorda que é justíssimo escolher o Ina, o Ao mirante, Nelson! e o Pedro Dória da mesma forma que é injusto o Idelber não estar.
    Bem, só nos resta pensar que lista é feita exatamente para esses esquecimentos revelarem mais a respeito de quem escolhe do que de quem foi escolhido ou não.
    Por fim, devo dizer que a sua lista(e do Biajoni) está fantástica.
    Mas, com toda as listas.. etceterrá. etceterrrá….
    Um beijo e obrigada mais uma vez, pela sua gentileza e elegância em partilhar o que sabe.
    Meg

  3. Rafael:

    Blog bom tem que verter um pouco de sangue, senão vira coisa de babaca.

    Minha lista.

    – Rafael Galvão.
    – Diogo Mainardi.
    – Gerald Thomas
    – Lola Aronovich

    Poucos concordarão com minha lista esquizofrênica. Bom… lista é uma merda.

  4. Rafa, obrigada pela menção. Vc é dos maiores blogueiros deste país, independente de lista de revista.

    E concordo c/ vc: faltou o Idelber – e faltou muito. Apesar de entender a necessidade da “pluralidade”, o Idelber é muito mais “blogueiro” (no sentido profundo do termo, como gerador de informação e comunidade) q Noblat, Josias, tio Rei (?!?!?!) e cia. ltda.

    Eu particularmente tenho reticências com blogs de veículos de jornalismo. Leio, mas tenho sempre aquela sensação de coluna, muito mais que post.

  5. Rafito

    Concordo com o que disseste, assino embaixo.

    Vou além e digo que costumava ler alguns dos blogs citados, mas muito já perderam o propósito, o “joie de vivre”, o “fogo nas entranhas” rsrsrs e eu me desinteressei.

    Posso estar sendo pretensiosa ao afirmar isso, afinal, meu blog é nanico perto dessa gente, mas acho que, em 3 anos me mantive fiel ao propósito que me induziu a criá-lo: ser fiel à minha esquizofrenia, ter liberdade, ser meu playground particular.

    Sou feliz com ele desse tamanho, com o seu fluxo de visitas com a falta de periodicidade com a qual escrevo nele e com seu conteúdo.

    E no final, como disse bem o Santiago: toda lista é uma merda.

    Odeio listas.

    Beijos!

  6. Disse tudo. Senti falta do Idelber, d’O Hermenauta, e até mesmo de vossa senhoria, que representam muito melhor a blogosfera propriamente dita. O Fernando Rodrigues, por exemplo, é um grande jornalista, mas não tem (ainda, pelo menos) o menor cacoete de blogueiro.

  7. Lista!Basta a telefônica.Caro Rafael,quero aproveitar o post para falar um pouco de blog, esse espaço livre e democrático que veio para tornar-se um grande defensor da liberdade de expressão, principalmente em um país onde a imprensa tem dono,e não é muito afeita a uma isenção, principalmente a televisão(é bem verdade que já melhorou muito).Muitos que sonharam em ser jornalistas mas que o destino não lhe foi favorável,hoje tem a oportunidade de realizar este sonho, criando um blog, dentro do segmento de seus conhecimentos, estando assim capacitado a transmitir aos internautas cultura e entretenimento,com responsabilidade e respeito ao leitor, nessa troca contínua de informação e conhecimento numa interatividade imediata, fazendo amizades e aprendendo cada vez mais uns com os outros, proporcionando um enriquecimento cultural. Acho que com o passar dos anos cada vez mais a blogosfera crescerá, fazendo com que toda a mídia seja mais livre e independente ajudando cada vez mais no aperfeiçoamento democrático.Vivemos uma época de grandes mudanças e ser contemporâneo deste momento é um privilégio que nos faz participar com mais entusiasmo, pois estamos comunicando em um meio que não tem fronteiras, pois alcança todo o mundo.Um abraço,Armando – http://www.fetichedecinefilo.blogspot.com (posto bambém em http://www.lygiaprudente.blogspot.com )

  8. Boa análise, concordo com vc. Como eu já disse por aí, o fato do tema estar rodando é positivo, creio.
    Como vc, discordei de grande parte das escolhas, tendo em vista a quantidade de blogs interessantes que estão por aí.
    Mas lista é lista…uma merda.
    Beijos.

  9. uma vez mais concordo contigo
    blog bom, mesmo, é algo como este, no ina, do alex, do idelber, do bia ….
    sem grande estrutura de bastidor, pessoal
    mas os jornalisticos, ao menos servem para trazer aquela noticiazinha rápida, de ultima hora, temperada com a opinião ou o modus escrevendi do jornalista em questão
    ao menos para isso são muito bons
    de resto, blog bom é algo que, além de mui pessoal, traga “algo”, como os acima citados, dentre inúmeros outros
    grande abrassss

  10. A lista de blogs da Época é uma merda.
    Tirando dois ou três lá citados, o resto não presta prá nada.
    abraço ! Pat

  11. concordo com vc, rafael, no meu blog (sem leitores) escrevi alguma coisa sobre isso, das diferenças que percebo desde quando comecei a escrever blog há 8 anos…

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