A “Buceta” do Bia

É meio esquisito escrever sobre um livro que vi nascer e que, por acaso, tem um personagem com meu nome e sobrenome.

Mas escrever sobre um livro do Bia é sempre bom.

Esqueça o que ele diz, porque a memória do Bia é ruim que dói. “Buceta” foi concebido em 2005, no vácuo do seu primeiro livro, “Sexo Anal”. No comecinho de junho, para ser mais exato: foi quando o Bia me mandou um primeiro esboço do livro, basicamente uma cena, ainda bastante diferente do que ficaria na versão final. Já tinha um Rafael Galvão ali. O sujeito era baiano, beatlemaníaco e escrivão.O Bia diz que o personagem foi inspirado em mim; eu prefiro acreditar que ele gostou do meu nome, só. Porque escrever qualquer um escreve; mas ser personagem é para poucos. E se eu acreditasse nisso ia começar a ficar mais metido do que já sou. E faria uma brincadeira aqui, escreveria sobre o livro como se fosse o personagem, e então a bagunça se instalaria completamente. Não, obrigado.

Mas mesmo com um personagem bom como um Rafael Galvão, o Bia desistiu rapidinho do livro — que já tinha o título e o subtítulo definitivos — e retomou o que deveria ter sido a sua primeira novela: “Virginia Berlim”, lançado há uns dois anos e que veio com um CD com a trilha sonora do livro.

Dois livros não poderiam ser mais diferentes. De um lado o policial leve e rápido de “Sexo Anal”; do outro, um romance claustrofóbico e psicologicamente mais profundo. A diversidade dos livros é um elogio claro à capacidade do Bia, e uma prova de que como escritor ele vinha evoluindo.

Eu pensei que o Bia tinha desistido de “Buceta”. Até que no final do ano passado ele apareceu de novo com “Buceta” — agora um livro inteiro, com começo, meio e fim. Depois de ler as primeiras páginas e ver que o meu nome continuava ali, fiquei com medo e preparei com antecedência a minha habitual coleção de insultos: “Seu puto, você tá pensando o quê? Muda o nome desse personagem!”. Imaginei que o Rafael Galvão do Bia terminaria em uma orgia com travestis, manchando para sempre a minha já frágil reputação.

Depois que eu me acostumei com um homônimo, as coisas ficaram mais fáceis. E pude olhar o belo livro que é “Buceta”.

Não é possível olhar para “Buceta” sem imaginar que é a continuação de “Sexo Anal”. Pelo título, pelos personagens, pelo ritmo que é uma das marcas registradas do Bia. O Bia tem estilo próprio, três livros depois já dá para perceber sem chance de engano. “Sexo Anal” era um livro leve, engraçado, bem humorado. “Buceta” tem tudo isso — mais é mais bem construído, mais bem estruturado, acima de tudo um avanço no estilo do Bia. Mesmo que ele aponte as diferenças, vai ser mais fácil enxergar as semelhanças entre os dois livros — e é aí que essa evolução estilística entra. “Buceta” é um livro melhor do que foi “Sexo Anal”. E SA já era bom.

Eu tenho algumas críticas ao livro. O excesso de pontos de exclamação, principalmente na voz do narrador, é um deles, que às vezes a torna parecida com as dos personagens. Outro é a forma como reticências se imiscuem em diálogos que talvez devessem ser monólogos. Eventualmente os personagens falam de maneira literária demais.

Mas os defeitos de estilo são pequenos, comparados à delícia que é ler o “Buceta”. O livro flui rápido, a trama envolve. Não é um policial noir, nem longe: está mais para um policial pink, bem humorado, com uma visão cínica do mundo enganadoramente disfarçada em humor leve e em situações esdrúxulas, mas ainda assim familiares. A começar pela capa, com uma foto de Rock Hudson que exemplifica, de maneira perfeita, o espírito do livro. O talento do Bia está aí, em estender os limites do real, do crível. É o que faz de “Buceta” um grande livro.

Vale a pena ler “Buceta”. O Bia é um dos melhores novos escritores brasileiros. E com “Buceta” mostra que tem fôlego e um universo narrativo próprio. Não é pouco.

14 thoughts on “A “Buceta” do Bia

  1. é estranho, se o nome do livro fosse CARALHO ou OS CUS DE JUDAS ninguém se espantaria. mas o nome chulo do órgão feminino é ofensivo, né?
    :>)
    obrigado, rafa. esse livro foi por você.
    ;>)

  2. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    Eu acho que ele tá tendo problemas por conta do nome do livro.
    Bia,
    Faz o seguinte:
    Quem reclamar vc oferece “Sexo Anal”.
    Simples.

  3. Olá Rafael. Interessante esse post.
    Já faz tempo que acompanho seu blog. Recentemente, criei um também.
    Gostaria que conhece:
    http://www.coisasuteiseinuteisdavida.blogspot.com
    P.S. como sou jornalista, muito me interessa a discussão da lei de imprensa [graças à Deus revogada] e a obrigatoriedade do diploma. Falo isso porque tomei a liberdade de postar “o seu post” com essa discussão, no meu blog – devido a importantância e seriedade da mesma.

    Cláudio

  4. Gostaria de dirimir qualquer dúvida. Eu jamais criticaria o nome do livro, minha participação foi para elogiar, mas fiquei sem folego pela minha relação muito íntima com o título, coisa de amor, aliás, é tudo que mais me fascina nas mulheres, acho que Deus foi perfeito na criação, e vou além, se mulher não tivesse buceta eu nem falaria com elas.

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