Os exilados

A primeira vez que escutei Exile on Main St, dos Rolling Stones, foi aí pelo final dos anos 80, meio às pressas. Eu não gostei. Pode parecer maluquice, confissão de mau gosto, talvez eu não tenha prestado atenção suficiente: mas não gostei. Para mim, o melhor disco da banda continuava sendo o Let it Bleed — e ainda acho que ninguém pode dizer que conhece rock se não conhece esse disco de trás para a frente.

Alguns anos depois, já nos anos 90, escutei novamente o disco, e então veio a epifania — porque não há outra palavra para descrever o que acontece quando se ouve, pela primeira vez, o riff inicial de Rocks Off. Exile on Main St é um disco absolutamente fantástico. É provável que seja o melhor disco de rock and roll já feito.

É fácil dizer que o disco é o resultado de dois fatores principais: o fim dos Beatles, que deixaram os Stones sem pai nem mãe e sem ter quem imitar, forçando os coitados a redescobrirem o seu caminho, e a saída de Brian Jones, que além de dar naturalmente mais foco e menos “psicodelia” aos Stones abriu espaço para um excelente guitarrista, Mick Taylor, que antes de cansar de ser roubado pelos Glimmer Twins trouxe mais qualidade técnica à banda do que ela jamais teve ou teria depois, com o Ron Wood.

Mas o Exile é mais que isso. Muito mais. É o resultado de uma evolução clara, consistente, de cerca de 5 anos. Depois de lançarem a tragédia que foi o Their Satanic Majesties Request, cópia vagabunda ao extremo do Sgt. Pepper’s dos Beatles, os Stones voltaram às suas raízes e deixaram de lado a sua obsessão com os Fab Four. E o que fizeram a partir dali foi, para dizer o mínimo, impressionante. É improvável que alguma outra banda, além dos Beatles, tenha uma seqüência tão absolutamente fantástica de discos geniais: Beggar’s Banquet, Let it Bleed, Sticky Fingers e este Exile. Um disco absolutamente, irrepreensivelmente fenomenal.

Infelizmente o esforço parece ter sido demais para eles. Depois desse disco, gravado em meio à heroína de Richards, à cocaína de Jagger e à manguaça generalizada dos dois na França, os Stones nunca mais fariam um disco excelente. Mas, cá entre nós, não precisavam. Milhares de bandas, ao longo desses 50 anos de rock and roll, gravaram durante décadas sem conseguir fazer um disco sequer que chegasse aos pés do Exile. Se os Stones tivessem gravado apenas esse disco, ainda assim seriam uma das duas melhores bandas da história.

Uns quatro anos anos depois o movimento punk deu vazão à sua ignorância musical e fez o mundo inteiro ouvir os seus gritos de rebeldia. O resultado foi revolucionário — menos pela importância ou qualidade de sua música mas pelo conjunto do movimento, em termos culturais. Mas se eles se revoltavam contra os Stones, a verdade é uma só: eles eram uns idiotas.