O deputado me pede para escrever uns textos para uma candidata a vereadora — que promete bastante e em quem o seu partido está interessado — e supervisionar sua gravação. Não importa que eu seja redator do programa dos majoritários, não importa que eu não goste de sentar atrás de um monitor de vídeo: esse é o tipo de galho que a gente sempre quebra.
E lá vem ela, trazendo a filha a tiracolo.
A menina tem peitos arrebatadores, impressionantes, controlados a muito custo pelo decote perdulário, e se torna difícil tirar os olhos deles enquanto interrogo a mãe para decidir o que ela deve dizer. Ela não é exatamente a menina mais bonita do mundo, mas um tio filósofo dizia que quem come cara é bexiga. Pergunto seu nome e sua idade — 16 anos de belas coxas e belo, belíssimo umbigo.
Eu, provavelmente meio alto pela quantidade balzaquiana de café que ando bebendo, resolvo que vou aliviar um pouco a minha tensão.
Começo a chamar a candidata de sogrinha. Quando termino a gravação pergunto à menina o dia do seu aniversário, e então digo a sua mãe que exijo ser convidado para a festa no tal dia de 2006. A mãe dá uma risada e eu anoto: se essa menina voltar a aparecer por aqui é porque a mãe liberou.
Somos todos animais políticos, afinal.
Nas eleições de 1996 uma candidata a vereadora resolveu quebrar as regras e me pediu para escrever o seu texto da TV.
Eu não escrevia texto para vereador. Eles que se virassem, a barra já estava muito pesada (aquela seria a única eleição que eu perderia) para que eu perdesse tempo com o amontoado de malucos que brigavam pelo dinheiro dos santinhos, camisas e cabos eleitorais e pela oportunidade única de falar bobagem em tempo exíguo na TV.
Mas ela confiava em seu charme. E no de suas meninas.
Tia Fulana era cafetina, dona de um puteiro famoso, ou assim dizia um jornalista que já fora respeitado mas tivera sua carreira destroçada pela cocaína, seu cliente e amigo. Era uma ruína de mulher, e ruínas de putas são sempre mais deterioradas, mais tristes. Ela invariavelmente chegava à produtora acompanhada de duas ou três de suas protegidas, ou funcionárias, ou sobrinhas.
E lá veio ela, rebolando, tentando flutuar no ar: “Gatinho, escreve um texto pra mim”. Pronunciava “gatchinho”, com o sotaque pseudo-carioca bizarro e arrastado que alguns sergipanos usam quando querem parecer sofisticados.
Dava um sorriso sexy, exalava um perfume de mulher velha, peitos gelatinosos apertados numa blusa de lycra. Deve ter achado que eu tinha uns 18 anos; e provavelmente julgava seduzir o garoto encantado ante possibilidades de sexo com uma mulher experiente — ou, sendo mais realista, que estaria disposto a trocar uns 15 segundos de texto por promessas de suas meninas oxigenadas.
Eu dei o meu melhor sorriso e disse que não podia, que não era autorizado a escrever, que aquilo iria custar o meu emprego — ou qualquer outra besteira que eu conseguisse inventar.
E então o seu sorriso foi perdendo o calor e parecia disfarçar uma raiva surda, e eu tinha a impressão que ela estava silenciosamente me xingando de viado filho da puta. O meu sorriso aumentava.
A cada negativa ela percebia que seu tempo já tinha passado. E me deu as costas e, rebolando, foi para o estúdio, com suas meninas sorridentes a tiracolo.