Parece que ninguém percebeu a gravidade da manchete d’O Globo do último domingo, em que o jornal avisa que os bárbaros estão às portas da cidade: o tráfico do Rio passou a vender crack. Parece que o destino das capivaras é mais interessante. Deve ser, mesmo.
Por mais paradoxal que seja, o mesmo tráfico que promovia a violência quase imensurável do Rio era responsável pelo seu controle. Parece deboche, mas é verdade: crack não era vendido no Rio, não em larga escala, porque suas margens de lucro mais baixas não interessavam ao tráfico.
Quem mora no Rio já conhece os códigos da violência e sempre usou isso como consolo. O tráfico tirava o pequeno marginal da rua, que descobria ser mais lucrativo ganhar 300 reais para empinar pipa no morro. Agora, com a liberação do crack, nem mesmo isso.
Mais que qualquer outra droga, o crack é um desagregador social importante, e muito rápido. Se torna muito facilmente combustível de meninos de rua. A cocaína podia ser o motor da violência entre gangues no Rio, que atingia o sujeito comum quase como efeito colateral; o crack pode se tornar o motor da violência nas esquinas, que faz do cidadão o seu próprio objetivo.
Com a queda dessa última barreira, tudo indica que o nível de violência cotidiana — o sujeito que lhe assalta na rua para lhe tomar o relógio e vender por quaisquer 30 reais — vai aumentar, e muito, no Rio. A situação já estava feia: os tiroteios noturnos já vinham se aproximando de bastiões como Ipanema, e os jornais do Rio já haviam estampado, este ano, sua indignação com o fato de os marginais terem ousado conspurcar o Leblon e seu IDH de país europeu.
Pelo visto, a coisa vai ficar ainda pior. E tinha gente que não pensava que isso fosse possível.
Enquanto alguns gostam de discutir o crime organizado cresce o crime desorganizado. Muito mais violento e muito mais difícil de ser controlado. Aqui em Belo Horizonte os viciados em crack são chamados de “noiados”, ficam separados na cadeia porque até mesmo os criminosos têm medo deles. Matam sem contemplação por dez reais.
Como psiquiatra, já atendi inúmeros jovens que experimentaram e se viciaram em crack. Praticamente é uma sentença de morte. Com certeza o usuário de crack descamba para a violência, pois a droga é avassaladora. Será que o Alto Comando do Tráfico (ACT) está querendo acabar com sua própria renda?
O crack me assusta. Saber q o ACT do Rio estah “liberando” o crack eh talvez a pior noticia do ano depois da eleicao de Bush.
Rafa,
Já perdi um amigo por causa do crack… foi rapidinho… custei descobrir que era um “noiado”, como bem lembro o Guto…
Sempre pode piorar. Sempre.
Concordo contigo, mas o problema é saber se dá pra levar fé na matéria. Neguinho força muito a barra.