Comparações burras

Quase todo dia vejo alguma comparação entre o caso Betamax e o P2P. Nem mesmo leio mais essas matérias, porque já sei de cor a mensagem de todas elas: a indústria de entretenimento sempre reagiu equivocadamente às inovações tecnológicas. Citam o videocassete, o MP3 e a televisão como exemplo. Em todos esses casos, o cinema reagiu negativamente.

Acontece que não dá para comparar essas tecnologias. Não são a mesma coisa. E nem sempre a indústria de entretenimento foi realmente burra.

A reação da indústria fonográfica ao MP3 é histérica porque tem que ser assim mesmo: não há saída para o atual modelo de negócios se a troca livre de arquivos continuar aumentando. Iniciativas como o iTunes são paliativos que não poderão contornar o problema. Eles sabem que um novo status quo simplesmente acabaria com seu negócio — exatamente como o advento do fonógrafo destruiu a indústria de partituras.

Quando à TV, o cinema reagiu da única forma possível na época. Quando mudaram o formato dos filmes, em 52, saindo do 4×3 (que hoje é restrito à TV) e entrando em aventuras panorâmicas como o Cinemascope, não havia tecnologia que fizesse da TV uma aliada. A indústria precisava mudar a experiência de ir ao cinema, criar nele algo que o diferenciasse da telinha pequena da TV. Em curto prazo não foi muito eficiente; e as bilheterias continuaram caindo. Seria preciso um novo público e uma nova geração de cineastas, com um novo padrão estético e uma nova compreensão do mercado, o que só aconteceria nos anos 70.

A única reação realmente equivocada foi contra o vídeo-cassete. Ele viria a transformar o mercado e garantir uma nova receita para a indústria, mas não perceberam isso imediatamente. E mataram o Betamax.

Agora vem a reação ao MP3 e ao Divx. E mais uma vez eles estão corretos. Ainda não se descobriu uma solução — e eu pessoalmente não consigo ver nenhuma no horizonte — que faça com que essa indústria consiga dominar o compartilhamento de arquivos.

Eles se dizem gravadoras e produtoras, mas seu negócio sempre foi a distribuição. Eram imprescindíveis quando alcançar mercados custava muito — mas agora, que qualquer obra intelectual pode ser distribuída de graça, seu modelo de negócios corre o perigo de perder a razão de ser.

Costumo dizer que eles são muito mais inteligentes que a mídia que os critica e os acusa de cegos. Continuam sendo. E a razão é muito simples: só o dono do pé sabe onde seu calo realmente aperta. Eles viram o fim se aproximando, e estão apavorados.

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