Faz 12 anos que deixei, de uma vez por todas, de comprar revistinhas de super-heróis.
Já tinha deixado antes, várias vezes. Das primeiras por falta de dinheiro, depois porque passava por ciclos de desinteresse e cansaço.
Ainda assim, acompanhei essas revistas com alguma regularidade durante umas três décadas, mesmo que pulando alguns períodos de quando em vez. Quando comecei a ler as danadas, no início dos anos 80, elas apresentavam basicamente as histórias do começo dos anos 70, boa parte das quais já publicadas pela EBAL e RGE. Foi a melhor fase do Capitão América — meu primeiro super-herói —, e o início de uma das mais chatas do Homem-Aranha. Stan Lee ainda escrevia muita coisa e era tudo muito repetitivo: o Capitão-América se sentia deslocado no mundo e tinha problemas com a namorada. O Homem Aranha se sentia deslocado no mundo e tinha problemas com a namorada.
Para uma criança de dez anos, era um mundo atraente e com o qual ela podia facilmente se identificar. Larguei aí pelos 13.
Mais tarde, acompanhei a revolução iniciada por “O Cavaleiro das Trevas” e aquelas que se seguiram: Watchmen (a série em quadrinhos mais superestimada da história), “A Piada Mortal”, “Asilo Arkham”, umas tantas por aí — sem falar no Spirit de Will Eisner — e voltei a comprar as revistas mensais.
Mas isso durou pouco tempo. Em 1992 a necessidade de cativar novos leitores fez com que os quadrinhos descambassem por caminhos estranhos. Para mim, o começo do fim se deu com a morte do Super-Homem. Descobriram uma fórmula mágica para conseguir um aumento expressivo de vendas por algum tempo, e dali em diante todos os super-heróis morreriam corriqueiramente, real ou figuradamente.
A gota d’água foi quando substituíram o Peter Parker pelo seu clone, numa história impossível para quem tinha lido as histórias originais. Parei de ler as revistas nesse momento, e voltei quando a Abril lançou aquelas edições premium caríssimas. Logo depois a Abril perdeu a Marvel e desistiu da DC, e eu desisti também.
Algum tempo depois voltei a comprar as revistas do Batman, porque ele vinha sendo bem tocado. O Homem-Aranha, por sua vez, tinha umas fases razoáveis e outras muito ruins, porque se tornou um personagem convoluto demais, com reviravoltas inacreditáveis demais; mas também voltei a comprar suas revistas algum tempo depois.
Parecia namoro de adolescente, com vaivéns constantes até que se cansa de uma vez. Deixei de comprar as revistinhas definitivamente em 2012, quando me irritei com problemas de distribuição das últimas que ainda comprava — “Batman”, “Homem-Aranha” e “Vertigo” — e acedi ao cansaço que elas já me causavam há algum tempo. Adeus, passem bem.
De lá para cá, de vez em quando batia uma certa saudade das revistinhas de super-herói. Chegava numa banca e me espantava com a abundância delas, títulos e mais títulos que me faziam perguntar onde é que arranjam tantos compradores, afinal. Não faço ideia dos números de circulação; imagino que não se comparam a seu auge na Abril. Mas dia desses percebi que, quarenta anos atrás, havia muito mais personagens à disposição. Cada revista trazia três, quatro personagens diferentes, uma fórmula simples da Abril que tornava suas revistas mais interessantes que as originais americanas. Passei a achar que não estão lendo mais histórias do que eu lia. Apenas estão pagando mais por elas.
Mas de uns dois meses para cá resolvi baixar algumas revistas na internet. Alguns malucos reúnem os lançamentos de cada semana nos Estados Unidos e os disponibilizam nos torrents da vida.
E são coisas tão estranhas para este ancião.
À primeira vista, são mudanças demais. As revistas do Aranha estão ainda mais chatas e confusas para mim. Universos demais para quem não consegue lidar sequer com um. Mary Jane Watson está casada com outro sujeito? Otto Octavius virou o Homem-Aranha? É complicação em excesso, e algo que me parece uma bagunça dos alicerces originais sobre os quais se construíram esses personagens. É como os X-Men tivessem contaminado todo o universo Marvel, e ele não ficou melhor por isso. O Batman me parece um pouco melhor, porque seu filho é um personagem bem interessante e atualiza a dinâmica da dupla dinâmica, se perdoam isso que acabei de escrever.
É claro que sei que aqueles que acompanham essas revistas devem pensar diferente de mim. Que tudo para eles faz sentido, e suas sensibilidades são diferentes da minha. Pode ser, estou pouco me lixando. A verdade é que não consigo mais ler essas revistas. Passo os olhos, leio apenas algumas partes de cada uma delas.
Percebi que super-heróis já não me interessam, de nenhuma forma. Mas ainda me interesso por Bruce Wayne, Peter Parker, Steve Rogers.
É assim que leio essas revistinhas hoje, sempre que lembro de baixá-las: pulando as partes em que seres improváveis combatem o mal dando murros e pontapés, como faziam para as crianças de quase 100 anos atrás, e tentando acompanhar a vida privada de personagens fictícios que conheço há décadas demais para contar. O que transformou os super-heróis nos quadrinhos em algo um pouco mais que entretenimento para crianças, a ser abandonado a partir da primeira mão num peitinho, foi justamente a percepção que ainda mais importante que os poderes ou as peripécias ou a simples porradaria de sujeitos vestidos de maneira improvável eram os problemas do cotidiano que suas identidades civis poderiam ter. Foi essa a grande revolução que a Marvel protagonizou no início dos anos 60. Era Peter Parker, estúpido.
Eu fui muito fã de super heróis, mas quase não tenho lido ultimamente.
A última série que acompanhei foi “Superman, Filho de Kal-El”, sobre Jonathan Kent. É uma série do jeito que eu gosto: onde os dramas dos personagens são o principal, e as aventuras contra vilões malucos são apenas o pano de fundo.
Depois o personagem mudou pra uma revista mais convencional e eu parei de acompanhar.
Então as nossas motivações são semelhantes.
Inclusive lembrei de um post antigo seu, sugerindo algumas histórias para o Homem Aranha. Você lembrou que ele já teve um romance com uma mulher mais velha, mas que foi tolhido pelo moralismo da época em que foi publicado. E que agora seria uma ocasião ideal para enfocar isso.
É esse tipo de histórias que eu gosto de ler. Mas não sei se estão sendo publicadas, e tenho preguiça de pesquisar.
Acho que eu tava falando da Betty Brant. Não sei exatamente se muito mais velha, mas com certeza mais independente, mais adulta. Se não me engano, nesse post eu falo do meu horror ao descobrir que Gwen Stacy teve filhos com Norman Osborn (história que ao que tudo indica depois mandaram esquecer, mas como desver uma desgraça dessas?). É esse tipo de maluquice que me incomoda.
O formato das histórias de hoje não cativam. É exatamente o que você disse: é maluquice demais, multiverso demais. Na estante continuam as mesmas revistas de 20 anos atrás: Gotham Central, o Conan da Dark Horse, Spawn, Homem Aranha: Azul, Namor: As profundezas….