Don Rosa II

Eu já tinha ouvido falar do Don Rosa antes, mas foi o Inagaki quem me chamou a atenção para ele.

Li sua primeira história há algumas semanas e achei muito, muito boa. Não mais que isso. Um grande roteirista, um desenhista razoável, e tudo estava de bom tamanho.

Li a segunda e a terceira e minha opinião mudou radicalmente. O sujeito é um gênio.

A primeira história, na Tio Patinhas 472, é “Uma Carta de Casa”. Quanto ao traço, uma olhada com um pouquinho mais de atenção me deu a impressão de que Rosa, embora parta de princípios “barkianos”, tem uma influência insuspeita: Robert Crumb. Há algo de sujo em seu traço que me lembrou Fritz the Cat; obviamente seria algo como Crumb para o estilo Disney, mas ainda assim é um estilo muito mais “udigrudi” que o normal.

Mas há outros elementos, muito mais importantes. Não é a arte que faz de Rosa é um gênio: são os seus roteiros.

A diferença no relacionamento tradicional entre o Donald e o Tio Patinhas me chamou a atenção imediatamente. Donald era só o sobrinho atrapalhado, irritável, meio burro e submisso do tio quaquilionário. Rosa realçou outros elementos para criar um elo a mais entre eles, como um gosto comum por aventura. Mas o principal, mesmo, é que ele tornou Donald finalmente um adulto. O sarcasmo aberto, até amargo, com que Donald fala da avareza do tio não era algo comum no universo Disney. De repente, Donald se torna um igual de Patinhas: é um adulto como ele. E entre os dois há um abismo ético que não se via antes, não dessa forma.

É ainda nesse aspecto, a psicologia dos personagens, que Rosa acrescenta outros avanços. Ele tenta dar mais profundidade ao Tio Patinhas, tirando um pouco o foco de sua avareza e ganância e ressaltando o gosto pela aventura. Tenta humanizar o personagem e adaptá-lo ao início do século XXI. Rosa conseguiu o que ninguém antes dele havia conseguido: atualizar os personagens míticos de Walt Disney para uma era diferente sem conspurcar sua essência. A Marvel deveria ter olhado para ele antes de emporcalhar o Homem-Aranha com aquela palhaçada do Ultimate Sei-Lá-O-Quê.
Don Rosa é, como disse o Inagaki, um bom motivo para comprar a Tio Patinhas todo mês. Mesmo que isso signifique ter que ler aquelas histórias horrorosas e histéricas produzidas na Itália.

(Para quem não conhece o macete, velhíssimo, é só olhar para a primeira letra dos códigos que estão no primeiro quadro da história. Por exemplo, B99265 significa que a história foi produzida no Brasil, I é Itália, etc.; a Abril divulgou esses números com estardalhaço na época em que o estúdio brasileiro produzia grandes histórias).

2 thoughts on “Don Rosa II

  1. Não leio os gibis da Disney aqui, pois todas (eu disse “todas”) as estórias são italianas e aquele clima histérico a que você se referiu, me incomoda. Assino a Turma da Mônica para as minhas filhas, mas elas não ficam entusiasmadas com a pobreza visual e os enredos fracos e sempre certinhos do Maurício. Paciência…
    Ciao

  2. nunca me interessei pelo rosa, achava que era copia barata do barks… agora fiquei curioso

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