O que a contra-revolução ainda não entendeu

No Brasil, como foi dito no post anterior, isso não interesssa: aqui jornalista é aquele que fez um curso específico e é devidamente registrado no Ministério do Trabalho. Não há espaço para especulações, do ponto de vista legal. É um exemplo do que dizem: qualquer coisa que só exista no Brasil, e não seja jaboticaba, não presta.

Mas o resto do mundo começa a discutir uma questão importante. Este artigo na Slate faz a pergunta (e já no título dá a resposta): “Quem é jornalista? — Quem quiser“.

Ali estão os principais argumentos contra aqueles que vêem a democratização da produção de informação como uma ameaça ao jornalismo:

Jornalistas intitucionalizados argumentam que blogueiros não fazem reportagem convencional, não são acurados, não são responsáveis, ou não são pagos — e logo não são repórterer genuínos.

São todos argumentos falsos.

Nada impede um blogueiro de fazer uma reportagem convencional. Há poucos meses, o Alex deu um novo ângulo ao caso de um bordel virtual fechado no Rio. Acurados? Por favor, este blog cometeu recentemente um belo erro de informação porque confiou em uma informação falsa, irresponsável e nada acurada do Estadão. E citar o caso clássico da Escola Base é covardia: basta ficar nas centenas de notícias mal apuradas que os jornais publicam todo dia.

Há outro aspecto, e esse está na própria definição de jornalismo. Eu, por exemplo, tenho sido bastante bem informado sobre aspectos interessantíssimos de Piacenza através do blog do Allan. O post da Lucia sobre as Ilhas Marshall me deu mais informações sobre aquele lugar do que toda a mídia tradicional. Esta não pode dar esse tipo de informação, geralmente, porque tem que ser tudo para todos; e este é um mundo cada vez mais fragmentado. Há necessidade de notícias de todos os tipos, para todos os públicos.

O fato de as pessoas não serem pagas para isso é um empecilho, realmente. Mas o fato é que quando alguém não quer ver uma revolução, nada adianta. Na prática blogs, com raras exceções, são hobbies, e a maior prova de sua adaptação aos novos tempos está no fato de têm “ameaçado” a mídia tradicional; são hobbies mais bem feitos que muitos jornais por aí, e no dia em que se tornarem um mercado de trabalho podem vir a ser melhores. É uma questão conjuntural, apenas.

O cerne dessa mudança, no entanto, não está somente nisso.

O último post é um exemplo — embora frágil, por se tratar muito mais de uma peça de opinião que uma reportagem — do que pode ser esse jornalismo. O Idelber complementou a informação dada, acrescentou dados; as questões levantadas pelo Roger e pela Lulu aprofundaram o debate. E assim como ele, qualquer um pode corrigir uma informação falsa com uma facilidade inexistente em outras mídias, ou acrescentar novos pontos de vista.

Porque blogs, mais que qualquer outra coisa, dizem respeito à formação de comunidades. É isso que faz a diferença. Quantos daqueles que comentam em um blog já mandaram carta para um jornal corrigindo uma informação, a não ser que sejam diretamente interessados? O fato de ser necessariamente um canal de duas vias é um dos fatores que fazem um blog ser diferente de mídias tradicionais. E com possibilidades que um jornal tradicional sequer pode vislumbrar.

Eles continuam aferrados a noções que estão mudando rapidamente. A banda passa em frente a eles, coitados, mas ele não conseguem ouvir.

13 thoughts on “O que a contra-revolução ainda não entendeu

  1. Deixe-me te dar um toque, vc, ao invés de escrever vêem (que é do verbo ver), usa vêm que seria do verbo vir). É só um toque, é que eu já tinha visto em outros posts vc cometer o mesmo erro e acho que é valido te mostrar esse errinho. Ok?
    Abraços!

  2. Bom, sobre o comentário do Fernando Henrique, acho que quando um blog começar a cobrar, ele deixa de ser um blog e passa à lista dos “tradicionais”.
    O que faz um blog diferente é justamente isso, o fato de ser um hobby, de ser feito por puro prazer. Talvez falte uma obsevação mais criteriosa sobre o assunto tratado, mas a visão pessoal (que aproxima o leitor) compensa uma possível falta de profundidade. Quanto ao fato de muitos blogueiros escreverem a revistas, lembro de um caso hilariante entre o Milton Ribeiro e a Veja. Pergunte a ele.
    Ciao

  3. Acho que no céu há lugar pra todas as estrelas. Eu fico no meio desta discussão pois me formei em Com. Social (uma faculdade imprescindível, enquanto todos só falam em jornalismo, jornalismo..) e optei no fim do curso por jornalismo. Não trabalho muito oficialmente no meio, mas tenho a atividade na veia, no sangue. E considero que muitos possam tê-la também. Por quê não? A única coisa que acho meio absurdo nisso tudo é acreditar que fazer uma matéria jornalística é algo fácil: existem técnicas, melindres, jeitos; existe isso tudo como em qualquer outra profissão: artista, artista-vida-escritor, artista-exibicionista, advogado, nutricionista, acadêmico, etc, etc. E existe uma faculdade onde você aprende um pouco de tudo; não aprendemos só como escrever “risco de morte” ao invés de “risco de vida”; não fazer “nariz de cera”, enfim. Sei lá, ando percebendo que não são os jornalistas que têm medo de blogueiros e sim o contrário. Bobeira, porque o céu está aberto e mal ou bem, pra entender de Teoria da Com. basta iniciar o aprendizado com um só ponto: o meio é a mensagem. E a categoria jornalística talvez esteja preocupada com a webilóide e seus “progressos”. Outra que os jornalistas são bobos porque não percebem algo notório: se os blogueiros estão se manifestando, isso é sinal de que quem vai aguentar a Geni são vocês/nós! Afinal de contas, o cidadão tem sua parcela de “culpa” e deve saber como procurar a informação sem depender de artifícios midiáticos. E outra coisa interessante: vamos poder comprovar nossas habilidades outras que não são o “escrever objetivamente e sermos curiosos com ética”; vamos poder dizer: “ei, eu entendo de arte, psicanálise e cinema, então também quero meu bolo no meio de vocês!” Abraços, Rafael! E vamo que vamo!

  4. Eu acho que a “Blogosfera” tem revelado maravilhosos jornalistas e escritores geniais. A maioria não está preocupada em se mostrar jornalista, repórter, fotógrafo… O que noto é que a maior parte dos blogueiros usa o sistema para exercer sua criatividade, para “desabafar” enquanto se expressa e acho isso muito bacana. Claro que existem aqueles que se julgam o máximo quando, na verdade, não têm técnica alguma – mas toda mdimensão tem sua escória.

  5. A hilária e incrível história lembrada por Allan, de Milton Ribeiro escrevendo cartas para a Veja com o objetivo de corrigir informações erradas, foi relatada pelo Milton lá no meu blog, na caixa de comentários

    deste post.

  6. Já tive opinião diversa da sua quanto a possibilidade do jornalismo ser exercido por qualquer um, sem exigência de um diploma, de conselho, etc, mas, hoje, vejo que eu estava errado. Seus argumentos sobre a democratização do ato de compartilhar opinião e informação resumem bem a questão.

    Abraço

  7. afe! nem acredito que: 1) fiquei fora da discussão QUENTE. 2) estejam realmente discutindo ISSO. 3) alguém tenha qualquer dúvida que BLOGS fazem hoje mais pelo JORNALISMO que QUALQUER jornal. 4) blogs nem sempre juntam comunidades -, como o maior desafio dos jornais foi FIDELIZAR leitores. como leitor digo: sou FLUÍDICO: se está bom aqui hoje, fico; se não, mudo. 5) não dá pra dizer, pois, no fim, fazemos mesmo parte de um GRUPO… mas esse grupo que leio, e que reúne galvão, idelber, alex cruz, monica, etc… faz um JORNALISMO PORRETA DA PORRA, invejável por todos.

  8. O que torna todos vocês “Bloguistas” maravilhosos é justamente fazerem o que fazem por prazer e sem aquelas preocupações comuns a mídia tradicional, como cumprir os cruéis prazos ou só escrever aquilo que realmente vai vender.
    A existência de vocês é um presente para pessoas como eu, que não têm a paciência de vocês para escrever mas que adoram perder seu precioso tempo por aí a procura de boa leitura.

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