Paulo Francis

A Primeira Leitura de janeiro trouxe um artigo sobre Paulo Francis, comemorando os 40 anos de lançamento de seu primeiro livro. A matéria, assinada por Bruno Garschagen, é francamente elogiosa; os depoimentos de amigos e admiradores também.

Há ali pelo menos uma falha, não muito grave: não inclui na bibliografia de Francis o seu último livro, “Waal: O Dicionário da Corte de Paulo Francis”, coletânea de trechos de artigos organizada por Daniel Piza e publicada em 1996. Curiosamente, todas as citações de Francis incluídas ali estão nesse livro.

A matéria também traz uma análise interessante das características do texto e das colunas de Paulo Francis: lembra que o seu estilo é uma espécie de precursor do que hoje se vê nos blogs. É verdade: o estilo pessoal de Francis casa, à perfeição, com os blogs deste início de século. Era pessoal, variado, “quente”.

Paulo Francis era brilhante. Não é preciso procurar muito para ver isso:

Dylan era idolatrado. É ainda, por alguns. Fez algumas coisas infelizes como ter um caso com a amiga de Mogadon Suplicy, Joan Baez. Fico imaginando os dois brigando e como arma final ele cantando “Blowin’ in the wind” e ela “Guantanamera”. É pior que barulho de murro em parede de quarto.

É impossível não cair na gargalhada ao ler trechos como esse, e é impossível não reconhecer o talento absurdo do sujeito. O problema começa quando se tenta alçá-lo a referência cultural do país.

A matéria, por exemplo, atribui “rigor intelectual” a Francis. Falso. Francis não era rigoroso sequer ao checar suas informações. Parecia preferir confiar em sua cultura, bastante vasta. Na verdade, o adjetivo que se aplicaria mais facilmente seria “abrangente”. E nisso ele era insuperável, como nenhum outro jornalista brasileiro jamais foi.

Era esse o seu papel, o de jornalista. Informava e, no máximo, podia servir de guia. O que ele escrevia, apesar de sua erudição e de sua verve, era quase sempre superficial, como é adequado a um jornal. Em tempos sem internet, muito do que ele escrevia era um reflexo do que acontecia na imprensa cultural de Nova York. E isso era extremamente válido e importante.

A matéria diz ainda que Francis morreu “no melhor de sua forma e como o jornalista mais influente do país”. E as coisas não são assim tão simples.

A década de 90 não foi muito generosa com ele. Começou com uma discussão pública e bastante áspera com Caio Túlio Costa, então ombudsman da Folha de S. Paulo. Costa era, em todos os aspectos, um jornalista inferior a Francis: mas estava certo ao questionar os seus critérios jornalísticos, e Francis, se sentindo desprestigiado, acabou saindo da Folha e indo para O Estado de S. Paulo. Tinha perdido aquela.

Ir para o Estadão foi um mau movimento. Ali não havia a pluralidade e a efervescência da Folha. Francis passou a falar principalmente para conservadores como ele, e boa parte da repercussão que tinha se perdeu.

Um último golpe seria o livro “Vida e Obra do Plagiário Paulo Francis”, de Fernando Jorge. O livro se dedicava a encontrar incoerências e coisas do tipo na obra de Francis. É curioso que Francis, que se antecipou aos blogs em 20 anos, pelo menos, tenha sido vítima de um fenômeno tipicamente blogueiro: o stalker, o desocupado que se dedica a um parasitismo deletério e obcecado, que alguns consideram uma espécie de homenagem e que outros, como eu, acham apenas um retrato pé-no-saco de uma mediocridade profunda. O stalker é um fã no espelho, aqueles espelhos de parques de diversões onde tudo é invertido e distorcido. De qualquer forma, o livro deve ter sido um golpe e tanto para Francis. E dizem que, quando morreu, estava deprimido diante do processo milionário que a Petrobras movia contra ele.

Em todos esses casos, os desafetos de Francis apontavam seus defeitos como jornalista. Perdiam de vista o que era essencial nele: sua noção do que era bom e mau em cultura, sua coragem em defender seus pontos de vista sem transigir com a demagogia, sua capacidade de provocar politicamente seus leitores. Ao mesmo tempo, mostram que é uma temeridade tentar fazer dele um pensador.

Havia muito de impostura intelectual em Francis. Por exemplo:

O socialismo, segundo Marx, só poderia ser concretizado em países que tivessem atingido o limite do desenvolvimento capitalista e este, gerando uma classe operária consciente de seus direitos e politicamente ativa, soçobraria em face da revolução proletária. Para ser franco, acho isso moralismo judaico.

Parece uma análise brilhante e original em sua “franqueza”. Não é. Foi tirada de Edmund Wilson em “Rumo à Estação Finlândia”, e é uma redução até um pouco inepta do pensamento de Wilson. No entanto, Francis faz parecer que é sua.

(E na minha opinião os dois estão errados. A fé marxista em uma nova moral proletária deve menos ao Talmud que a Rousseau. E desde Lênin ninguém além de anti-marxistas leva essa questão moral muito a sério.)

Essa impostura pode até ser aceitável em um jornalista cultural, embora com restrições. Mas é intolerável em um intelectual a ser tomado como modelo. Definitivamente, Paulo Francis não era um sujeito que se levasse muito a sério.

Mesmo assim, há um número enorme de viúvas de Francis entre a direita. É engraçado que normalmente esqueçam onde e como Francis ascendeu à fama: como jornalista de esquerda na Última Hora de Samuel Wainer, e depois no Pasquim. Ao contrário de suas viúvas, Francis normalmente sabia do que estava falando: trotskista de formação e grande leitor de Freud, tinha uma solidez cultural que a maioria da direita, hoje, nem sonha em ter.

Talvez por isso ele venha adquirindo uma dimensão que não deveria ter. Mas isso não é de agora. Francis morreu com menos de duas semanas de diferença em relação a Darcy Ribeiro. A importância de cada um deles não pode ser sequer comparada. Darcy foi antropólogo, ministro, senador, fundador da UNB; Paulo Francis foi apenas um jornalista. No entanto, o finado Francis mereceu a capa da Veja, enquanto o defunto Darcy ganhou meras duas páginas na seção de obituários da mesma revista. É assim que criamos nossas referências culturais.

31 thoughts on “Paulo Francis

  1. Pessoalmente, gosto da postura ousada de Francis, apesar de alguns deslizes. Mas o que você diz é correto, é comum ouvirmos comentários distorcidos sobre ele, sobretudo uma idolatria à sua cultura e erudição.

  2. O que se aprecia, e muito “é a arte de saber bater”. Humor na pancada. Francis tinha muito disso. O que ficava ruim na TV era muito bom impresso. Suas rusgas com Caetanos e Caio Tulios não foram tão importantes. Francis era melhor quando era bem “coached”. Assim rendeu muito bom no Manhattan Connection por conta do “médio-volante” Lucas Mendes. By the way, Lucas Mendes também escreve muito bem. Num dos primeiros livros dele tem uma passagem dos correspondentes brasileiros em NY indo atrás do Collor, que fazia cooper no Centra Park, que é de matar de rir.

  3. Concordo com o Leandro.

    Quem muito fala, acaba inevitavelmente falando besteira, mas o admirava por sua coragem em falar.

    Ele tem frases maravilhosas e outras vexatórias.

    Bah…mas eu tb tenho. E olha que num sou ninguém.

    Beijo

  4. perfeito, rafa.
    grande post falando do grande francis.
    :>)
    ótima a comparação com blogs. a diferença é que hoje, escrevendo em blogs, podemos facilmente checar nos GOOGLE da vida qualquer tipo de informação. “aquele artista já morreu? não lembro…” vc entra no google e acha rapidamente. na época do francis, tínhamos (hehehe) que contar com a memória, basicamente. aumentava a “taxa de erros”.

    beijo, cara.

  5. O que é mais curioso na atual onda saudosista em torno de Paulo Francis, é que muitas de suas viúvas não se cansam de tentar imitá-lo. E sem um décimo do brilhantismo de Francis. Basta atentar para alguns figurões da grande imprensa. Um deles até perdeu o emprego recentemente.

  6. O grande Francis merecia mesmo ser mais lembrado. Ele era uma figura incomum. Além de muito inteligente, era um homem de visão e coragem. Coisa rara nos dias que se seguem.
    gd ab

  7. O agitador do Bia quer que a gente brigue! Imagina que ele me mentiu que tu escreveste este post só para me provocar e entrou no MSN dizendo: vai lá no Rafa, vai lá no Rafa… Como se tu te dispusesse a escrever um enorme post para atacar o mosquito aqui. Vai te fuder, Bia!

    O fato é discordo cordialmente de quase tudo. Eu não vejo tanto brilhantismo no Francis e até tentei achar engraçado o exemplo Dylan-Baez, mas, puxa, nem isso. Eu gostava mesmo era dos erros dele, parecia um cara com Alzheimer e bom texto. Era uma estranha e injustificável doença. Não entendo qual brilhantismo pode substituir tal desinformação. Só se fosse um ficcionista cultural.

    Sua morte foi mais do que triste porque poderia ter sido evitada. Sentiu uma dor dois dias antes que todos sabem que é infarto e seu médico – um amigo – não deu importância. Já pensou? Poderíamos estar livres de seus imitadores agora!

    Grande abraço.

  8. Se eu concordar serei stalker? O que os detratores de Francis insistem em não concordar é que ele, como vc falou, tinha verve.

    Sim, isso ele tinha. Errava e muito. Se formos procurar nos jornalistas atuais veremos coisa semelhante, talvez até mais superficial ainda.

    O negócio é que ser jornalista é foda. O cara tem que escrever sobre milhões de coisas e ter um leque, como vc mesmo diz, abrangente.

    Abs.

  9. Noves fora as vastas ambições intelectuais de Paulo Francis e seus plágios, erros e pensamentos imperfeitos, o que eu achava abjeto no polemista era o papel de “valente a favor”.
    Até o seu (mal) dito preconceito contra o Nordeste era seletivo. Descia a madeira sem dó nem piedade em uma Luiza Erundina, usando um discurso abominável, ao mesmo tempo em que afirmava que compraria em carro usado do neocoronel Tasso Jereissati, conforme declarou em entrevista a Geneton Moraes. É uma pena que não cumpriu esta promessa. Poderia ter se lascado em um acidente automolístico, ao invés do infarto a la Petrobras, do qual tanto lamentam suas viúvas.

    Porém, ai, porém, às vezes provocava riso, mesmo que involuntário. Certa feita, polemizando com Jaguar, que escreveu um artigo acusando-o de psicografar Mussolini, Paulo Francis respondeu atacando o cartunista de “não ter estatura intelectual e ser comandado por mulheres”.
    Curto e grosso, Jaguar respondeu: “É melhor ser comandado por mulheres do que…Aliás, o que você fazia com aquele garotão em Búzios. Cala-te boca”.

  10. Noves fora as vastas ambições intelectuais de Paulo Francis e seus plágios, erros e pensamentos imperfeitos, o que eu achava abjeto no polemista era o papel de “valente a favor”.
    Até o seu (mal) dito preconceito contra o Nordeste era seletivo. Descia a madeira sem dó nem piedade em uma Luiza Erundina, usando um discurso abominável, ao mesmo tempo em que afirmava que compraria em carro usado do neocoronel Tasso Jereissati, conforme declarou em entrevista a Geneton Moraes. É uma pena que não cumpriu esta promessa. Poderia ter se lascado em um acidente automolístico, ao invés do infarto a la Petrobras, do qual tanto lamentam suas viúvas.

    Porém, ai, porém, às vezes provocava riso, mesmo que involuntário. Certa feita, polemizando com Jaguar, que escreveu um artigo acusando-o de psicografar Mussolini, Paulo Francis respondeu atacando o cartunista de “não ter estatura intelectual e ser comandado por mulheres”.
    Curto e grosso, Jaguar respondeu: “É melhor ser comandado por mulheres do que…Aliás, o que você fazia com aquele garotão em Búzios. Cala-te boca”.

  11. Inúmeras vezes mais vale o estilo que conteúdo. Dane-se a realidade. Viva a perenidade de uma frase bem colocada. A mais ver, definitivamente analisamos o mundo a partir de nosso mundinho. Comigo vez em quando acontece: “putz, esse beltrano teria dado um ótimo blogueiro”.

  12. Noves fora as vastas ambições intelectuais de Paulo Francis e seus plágios e erros e pensamentos imperfeitos, o que eu achava abjeto nele era o papel de “valente a favor”.
    Até seu (mal) dito preconceito contra o Nordeste era seletivo. Descia a madeira sem dó nem piedade em uma Luiza Erundina, usando um discurso abominável, ao mesmo tempo em que afirmava que compraria em carro usado do neocoronel Tasso Jereissati, conforme declarou em entrevista a Geneton Moraes. É uma pena que não cumpriu esta promessa. Poderia ter se lascado em um acidente automolístico, ao invés do infarto a la Petrobras, do qual tanto se lamentam suas viúvas.
    Porém, ai, porém, às vezes provocava riso, mesmo que involuntário. Certa feita, polemizando com Jaguar, que escreveu um artigo acusando-o de psicografar Mussolini, Paulo Francis respondeu atacando o cartunista de “não ter estatura intelectual e ser comandado por mulheres”.
    Curto e grosso, Jaguar respondeu: “É melhor ser comandado por mulheres do que…Cala-se boca. Aliás, o que você fazia com aquele garotão em Búzios”.
    Touché

  13. Francis faz falta porque tinha o que poucos tem: coragem de dizer o que pensa, mesmo sob o risco de dizer besteira. Dar a cara a tapa, mesmo que “sub-repticiamente”, era sua maior virtude.A perspectiva sob a qual uma figura como ele deve ser analisada ou lembrada é muito diversa e de impossível consenso. Francis era o tipo de pessoa que se amava odiar e isso se dava por muito mais que seu talento, memória, cultura ou desafeto. Isso se dava porque ele tinha coragem de provocar; ele não ensaiava, ele ia lá e falava (escrevia). Faz falta no jornalismo de hoje, tão condescendente e medíocre. Ótimo post, feliz comparação com os blogs. Abraços.

  14. Waaaaaaaaaaaaalll, Francis era meu ‘idalo’. Completo os comentários falando do seu lado ficcionista. Li dois romances (Cabeça de Papel e Cabeça de Negro) e duas novelas agrupadas no volume Filhas do Segundo Sexo. Eram livros que se lia de uma sentada, com uma narrativa que fluía maravilhosamente. Um terceiro volume da trilogia Cabeça foi anunciado mas não sei se chegou a sair. Ouvi dizer que ele ficou decepcionado com a recepção tida pelos seus dois primeiros. Mas concordo que ele mesmo não se levava muito a sério e, realmente, Darci Ribeiro mereceria mais destaque, numa comparação.
    Abraços.

  15. Achava o Francis um chato, superpretensioso e eivado por preconceitos vis. Como bem lembra o Rafa, ainda tinha o mau hábito de não checar sobre o que escrevia. para mim, Francis não faz falta alguma.

  16. Eu gostei do Francis, o Milton se preocupa muito com detalhes…
    Além disso, o post do Milton é muito arrogante, soa como se ele fosse o fodão e o Francis um merdinha(e o Francis não está mais aqui pra se defender! hehehehe)…
    Sei lá, é a minha opinião(ainda não completamente formada), vou olhar a Primeira Leitura pra ver se concordo contigo em relação ao que disseram por lá…
    Ah… EU NÃO SOU “VIÚVA” DO FRANCIS NEM DE SEU NINGUÉM!
    (Antes que alguém se anime a dizer isso…)
    Abraço Rafa!

  17. francis era genial e essa coisa de plágio é uma grande bobagem. picasso era genio mas plagiava tambem. tom jobim era genial e plagiou águas de março. francis faz uma tremenda falta neste momento de mensalão e megacorrupção do governo PT. ele (francis) q adorava ridicularizar Lulla e profetizou o seu despreparo. em pleno 2006 com o total fracasso das esquerdas dizer q francis era conservador soa totalmente fora de órbita. waal. e se o francis era conservador, o q seria, então, os “progressistas” luiz fernando veríssimo e marilena chauí?

  18. totalmente bobo esse comentário do franciel. francis estava certíssimo. é mesmo muito mais confiável comprar um carro de segunda mão de tasso jereissati do que um land rover q pertenceu a silvio pereira (dirigente do PT)

  19. Lamentáveis essas tentativas de reabilitar o Francis, desculpem. É profundamente triste ver que os jornalistas que vêem algum mérito nesta figura nefasta estão, na verdade, defendendo o direito a dizer mentiras, estrupícios e plagiozinhos vulgares de frases de efeito porque quem o fazia escrevia bonitinho…Acho que isto é, em parte, produto da velha briga corporativa dos jornalistas com a Universidade, que durante a ditadura passou a pautar os termos do debate cultural brasileiro. Que o país necessita de um jornalismo culturalmente forte, precisa; mas o fato é que, quando era a imprensa que pautava o debate cultural, quando um Euclides da Cunha, João do Rio, Mário Pedrosa, Nelson Werneck Sodré, Otto Carpeaux, expunham suas idéias nas colunas do jornal, era porque els combinavam legibilidade com honestidade intelectual escrupulosa, conhecimento das fontes e erudição genuína; não com cultura de botequim de Ipanema, lamento…

  20. Alô, Rafael! Passo por aqui depois de um tempo afastado e me deparo com esse belo post. Claro que há um exagero absurdo no dimensionamento do papel de Francis para a cultura brasileira, mas sinto muita falta de ler seus textos. Lembro de alguns insights maravilhosos sobre alguns filmes e algumas obsessões bem engraçadas (ele era vidrado pela Sandra Bullock, por exemplo). E bem lembrado: no final da vida, o cara meteu os pés pelas mãos. Suas viúvas adoram falar que a Petrobrás o matou, mas não conseguem ver que o cara disparava impropérios contra a Estatal sem o menor rigor e preocupação com a verdade. Abraço.

  21. a morte de paulo francis foi muy pouco.

    cúrioca que fala mal de parahyba/baiano tem é que morrer mesmo!!!!

  22. Digam o que disserem do Paulo Francis mas a verdade é que ele tinha algo que todos os colunistas e comentaristas do Brasil, senão o próprio Brasil, perderam: coragem.
    Ele podia estar certo, e normalmente estava.
    Podia estar errado e frequentemente estava (especialmente sob o ponto de vista ético).
    Mas quer saber?
    Foda-se!
    Ele chutava mesmo, pegava firme, acertava na veia, esnobava descaradamente e não raramente perdia as estribeiras.
    Mas a coragem dele de desacreditar até a si mesmo era algo admirável e merecedor até mesmo de um “stalker” que, qual urubu na carniça da celebridade, revira o lixo alheio em busca de uma projeçãozinha qualquer e uma polêmica besta.
    Construímos nossa “cultura” sobre aquilo que nos emociona, nos cativa e nos faz pensar.
    Paulo Francis, pro bem ou pro mal, fazia exatamente isso.
    Darcy Ribeiro fazia o que mesmo?
    Pois é.

  23. Toda unanimidade é burra, disse o quase unânime Nelson Rodrigues. Realmente Darci Ribeiro deveria ser mais lembrado que o Sr Francis

  24. Prezado Rafael,
    Eu nao vou comparar a obra de Nietzsche e do Francis,mas como o primeiro que nem era considerado um filosofo por seu pensamento fragmentario,o Francis atraves da analise das varias facetas da realidade,fragmentarias,mas com uma abordagem direta da multiplicidade da vida,uma condensaçao da historia,seja ela politica,economica,social,cultural,filosofica,nos
    mostrava,pelo menos a mim,a partir disso tudo,uma analise nova sobre a vida e suas circunstancias e,sim,como o Mainardi,considero Paulo Francis um grande pensador brasileiro.Abaixo um texto do Diogo:
    Paulo Francis morreu oito anos atrás. A opinião geral é que sou a versão piorada dele. Como responder? Que não é verdade? Claro que é verdade. Digo apenas que a culpa não é minha. Eu me empenho no meu trabalho. Leio, estudo, escrevo, reescrevo. Não faço melhor porque não consigo. Não tenho capacidade. O único fato que alego em minha defesa é que não sou um principezinho. Não herdei o trono de Paulo Francis na imprensa brasileira. Fui posto em seu lugar por falta de alternativas. Porque não encontraram ninguém à altura. Se sou a versão piorada do Paulo Francis, é porque o Brasil, como um todo, piorou. Ficamos ainda mais conformistas, ainda mais rasteiros, ainda mais venais. Pegue a turma de Paulo Francis dos tempos do Pasquim, por exemplo. Apareceu algum humorista de verdade de lá para cá? Não. Apareceram somente chargistas a serviço do regime, como Chico Caruso. Se eles vivessem na Alemanha nazista, estariam pintando caricaturas de judeus com o nariz adunco nas vitrines do gueto. Então não me cobrem por ser uma pantomima grotesca do Paulo Francis. É bem mais instrutivo me ver como aquilo que realmente sou: um simples reflexo da irremediável deterioração intelectual e artística do país.

    Oito anos depois de morrer, Paulo Francis continua sendo o mais influente pensador brasileiro. Não é novidade que o melhor da mentalidade nacional se encontra na imprensa. Isso acontece desde Euclides da Cunha. O problema é que Paulo Francis costuma ser mais recordado por seu temperamento do que por sua obra. Seus admiradores sentem saudade de seu talento para o deboche. Seus detratores reclamam de seu ar afetado. Como seria natural num país de analfabetos, discute-se acaloradamente a respeito de sua personalidade, mas ninguém parece disposto a reler seus livros. A republicação de sua obra nos últimos dois anos, pela editora Francis, passou em branco. Dedicaram-lhe apenas umas notinhas chochas nos jornais. É um erro. Uma estupidez. Um país pobre de idéias como o nosso não pode abrir mão de maneira tão leviana de um escritor como Paulo Francis.

    Quer um conselho? Releia seu livro de memórias Trinta Anos Esta Noite, publicado originalmente em 1994, no aniversário do golpe militar de 31 de março. Onze anos depois, ficou ainda melhor. Diz mais a respeito do Brasil e dos brasileiros do que Casa-Grande e Senzala. Paulo Francis, para usar uma de suas expressões, não escreve “à brasileira”. Não sentimentaliza, não enobrece, não edulcora seu passado. Ao mesmo tempo que se penitencia por suas velhas idéias esquerdistas, ele ridiculariza, uma a uma, toda aquela “gente nojentinha” que nos governou de 1950 em diante. Trinta Anos Esta Noite escancara o lado mais repulsivo do caráter nacional: adesista, fisiológico, acovardado, desonesto, reacionário, primitivo, roceiro. Paulo Francis refletia sobre as asnices brasileiras até mesmo quando lia Samuel Pepys. Ele morreu denunciando a roubalheira institucionalizada das empresas estatais. A Petrobras deveria pedir-lhe desculpas póstumas. Não existem mais intelectuais como Paulo Francis no país. Só versões pioradas.

  25. Você tem certeza que entendeu a citação de Francis sobre Marx e classe operária? Citação essa que pode ter se originado de Edmund Wilson, ok. Mas você disse que os dois estão errados, você argumenta sobre uma questão moral colocada erroneamente. Ninguém estava falando em moral. Francis disse apenas que ele, Francis, achava aquela citação parecida com moralismo judaico. É apenas uma opinião pessoal. Opiniões pessoais nunca estão “erradas”.

  26. Mauricio,
    Faz bem em não tentar compara Francis a Nietzsche. A Filosofia do último não era fragmentária. Como ele escreve em “Humano, Demasiado Humano”, os quadros em relevo atiçam mais a curiosidade porque mostram apenas parte e deixam o resto para quem vê deduzir. Assim Nietzsche expunha sua filosofia. Mas existem os seus conceitos principais através dos quais toda sua filosofia e todos os seus escritos podem ser unificados. O pensamento dele não é segredo para nenhum estudioso atualmente.

  27. Excelente texto.

    Eu nunca gostei do Paulo Francis e sempre achei que ele foi um dos mais abjetos personagens do jornalismo nacional.

    Saudações!

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