Molto bella

4 da manhã do sábado e vou fazer o check out no hotel. Desço com minha filha dormindo no meu colo.

Na recepção dois italianos bêbados com um saco plástico com água e cerveja. Com eles estão duas mulheres: uns vinte e poucos anos. Uma, a que tem cabelos mal pintados de louro e uma tatuagem tribal imensa no cóccix, é cearense, pelo sotaque; a outra pode ser de qualquer lugar entre o Rio Grande do Norte e Sergipe. As mulheres preenchem o formulário de check in da Embratur.

Os italianos estão bêbados. Passam a mão pelos corpos das mulheres, beijam-nas com ardor, mostram aquela lascívia de quem passou a noite em busca de algo que finalmente vai conseguir. Seus movimentos tentam ser fluidos, a fluidez da embriaguez, e mostram a falta de força, de punch dos europeus. Amantes que se querem sensuais, mas que não vão satisfazer suas musas, pelo menos não aquelas.

As mulheres conversam esporadicamente entre si, ocupadas consigo próprias. Não olham para mim nem para a minha filha no meu colo.

“Ele me chamou de molto bella, molto bella“, diz a morena para a loura, com a entonação cínica de quem já ouviu aquilo muitas vezes, e há muito deixou de acreditar.

O italiano que fala mais alto encosta-se com força na bunda da loura, os mesmo movimentos fluidos e embriagados e fracos. Passa a mão onde pode, beija seu pescoço com a volúpia dos incompetentes, mal consegue esperar subirem para o quarto.

Quando o elevador fecha a porta, olho para o funcionário do hotel com o mesmo sorriso cínico da morena ao espalhar aos quatro cantos que tinha sido achada molto bella, molto bella.

“Freqüência boa, a daqui.”

O funcionário olha para mim, se desculpando com um meio sorriso envergonhado:

“A gente não pode negar o check in, pode ser processado por discriminação. É difícil acabar com a prostituição desse jeito.”

Eu não falo mais nada, mas começo a pensar em evitar o Ibis das próximas vezes que for a Fortaleza; talvez jogue fora meu cartão de fidelidade da Accor. E como minha filha estava dormindo posso me permitir rir dos italianos, que saem do lugar onde vi mais mulheres bonitas por metro quadrado para passar uma noite inteira atrás de duas prostitutas baratas em Fortaleza, e então voltar à sua terra vangloriando-se de suas aventuras sexuais na terra da luz e da luxúria.

Originalmente publicado em 5 de dezembro de 2004

2 thoughts on “Molto bella

  1. TCS TCS TCS…

    Que tanta certeza é essa sobre a fraqueza ou incapacidade dos europeus em satisfazer duas (afinal) profissionais?
    Que tanta certeza é essa de que as minas lá da terra deles são tão competentes quanto bonitas?
    Talvez esses italianos que vêem pro Brasil não passem de uns fuleiros incompetentes mesmo, acima de tudo carentes de coisas básicas que uma sofisaticada e consumista conterrânea já não possa ou não queira lhes dar – e já que é pra vender, a puta brasileira sai mais barata que a esposa italiana…
    Por outro lado, talvez as bonitonas que ficaram por lá estejam bem satisfeitas vivendo no lugar onde há mais homens bonitos por metro quadrado do mundo, sem fazer idéia de onde fica Fortaleza com suas putas pobre e feias.
    Muitos pontos de vista para o mesmo episódio, mesmos personagens…
    bj

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