Diário de bordo

Assim que chego a Fortaleza, antes mesmo de ir ao hotel, vou direto à Ao Livro Técnico, que tem sempre um bom saldo de livros.

Ano passado a feira foi fraca, mas agora consigo achar “Memórias do Condado de Hecate”, de Edmund Wilson, e “Pnin”, de Nabokov, além de bobagenzinhas como um livro de Joel Silveira, “O Presidente no Jardim”.

Compro o livro, que já tinha lido, por causa de uma única frase:

Não aceito nem respeito mulher que se entrega por capricho. Mulher só deve se entregar por amor, por desejo ou por dinheiro.

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Uma de minhas taras inomináveis é a paixão por centros de cidade. Quando o mundo evolui cada vez mais parecido com uma cultura de bactérias, no ambiente esterilizado dos shoppings, os centros das cidades são o lugar onde a sua essência única ainda permanece.

Nenhum, claro, se compara ao centro do Rio. O de São Paulo chega perto, com aquela aparência de estar contando uma história de progresso no século XX. E eu tenho uma paixão especial pelo centro de Salvador.

O centro de Fortaleza é feio, sujo, acanhado. É típico das cidades nordestinas, esse desprezo por si próprio, a tentativa constante de parecer do sudeste. No caso de Fortaleza, o traçado em xadrez da cidade colabora para esse esquematismo.

Quando morei aqui me impressionei com o fato de caminhar quarteirões e quarteirões com um copinho de sorvete na mão, sem encontrar uma lata lixo.

A cidade continua sem lixeiras. Mas meus anos aqui me ensinaram a ser um pouquinho cearense.

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O baobá continua no Passeio Público. Não é um dos dois únicos no Brasil, como me informaram; em Suape há um terceiro.

Mas continuo achando que ele se diverte mais com suas putas decadentes que os outros. Se bem que o de Suape, em zona portuária, deve ter sua cota.

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Eu nunca, nunca vou conseguir me acostumar ao sotaque cearense. É engraçado, é doce, é espantado.

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Não trouxe meu computador e estou escrevendo isso num cybercafé rodando Linux. Se não fosse pelo maldito teclado ABNT 2, seria quase perfeito. Se eu usasse computador apenas para escrever e acessar internet, eu migraria imediatamente para o Linux.

3 thoughts on “Diário de bordo

  1. Meu irmão mora em Fortal e fui conhecer a cidade ano passado. Achei bem cuidada para os turistas, mas padece do fato de ter sido muito pobre até poucas décadas atrás.

    Não vi muita coisa antiga pra encher os olhos, a não ser aquela jóia do Teatro José de Alencar. Aquela igreja neogótica é imponente, mas meio vazia por dentro, sem um altar, o que é algo estranho numa igreja.

    Por incrível que possa paracer para quem não conhece, em Belém e mesmo cidades do interior do Pará, como Santarém e Bragança, tem muito mais daquele barroco singelamente decadente que você tanto deve gostar em Salvador.

  2. Galvão, sou de Fortaleza, nascido e (mal)criado. É isso mesmo o que vc. diz sobre o centro da Cidade. Sujo, decadente, sem apreço à sua história e com o total descaso da Administração Pública. Fazer o que?
    O Centro, que era vivo e colorido, migrou para o luxo da Aldeota e dos Shoppings. O resultado é que ficou somente o comércio popular e esse não merece o devido respeito. Mesmo assim ainda é o maior comércio da Cidade, circulando mais de duzentas mil pessoas por dia, o que ainda o faz buliçoso nas principais vias durante o dia.
    No mais, curta a Cidade no que ela tem de melhor.

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