Alexandre — mas pode chamar de Sandrinha

Não assisti a “Tróia”. Me recusei desde que vi o primeiro trailer. Eu tinha a impressão de que aquilo seria mais uma bobajada histórica e deturpação homérica. Parece que acertei.

Quando vi o trailer de “Alexandre” torci o nariz outra vez. Pessoalmente, prefiro Michael Caine e Sean Connery sendo aclamados aos gritos de “Sikander! Sikander!”; para mim é o melhor filme sobre Alexandre, ainda que ele não seja um personagem.

Ao que tudo indicava, lá vinha um novo Alexandre galã, o mulherengo que ele nunca foi. A única coisa que me impressionou positivamente foi o fato de ele não usar estribos (invenção mongol e um dos responsáveis pela supremacia bélica de Gêngis Khan mais de mil anos depois). Era pouco.

Mas decidi agora que vou assistir ao filme. Embora duvide que seja historicamente acurado como se pretende, pelo pouquíssimo que vi até agora ao menos pareça ter essa preocupação. É um bom motivo.

E há a discussão sobre suas preferências sexuais, que está tomando conta da internet em mais um bom movimento de relações públicas. Querem fazer crer que a Grécia esteja revoltada por Alexandre ser retratado no filme com bissexual. É bem provável que os gregos tenham mais o que fazer e que isso seja um gimmick do estúdio para garantir o sucesso do filme, que custou caro e é dirigido por Oliver Stone, nunca uma boa garantia de sucesso de bilheteria.

De qualquer forma, a discussão sobre a bissexualidade ou homossexualidade de Alexandre é curiosa. Não me parece apropriado definir Alexandre como gay, por causa de suas esposas Roxana (mulher nova, bonita e carinhosa, que fazia os homens gemerem sem sentir dor e que estava grávida quando Alexandre bateu as sandálias) e Statira, filha de Dario. É ainda menos adequado chamá-lo de heterossexual por causa de Hefestion, o grande amor de sua vida, cuja morte fez Alexandre cortar as crinas de todos os cavalos e burros do seu exército e botar abaixo as ameias das cidades vizinhas em sinal de luto — e, en passant, crucificar o médico que tinha ido ao teatro e não pôde salvar o rapaz da intoxicação alimentar que sofreu.

Restaria dizer que Alexandre era bissexual.

Só há um problema em tudo isso. É a aplicação de conceitos modernos a uma época em que não existiam. Bissexualismo ou homossexualismo, como disse o historiador que supervisionou a gravação do filme, simplesmente não eram uma questão na Antigüidade. As pessoas não se preocupavam com isso — pelo menos não os homens.

O resto é bobagem. Até porque me parece perda de tempo discutir tão a sério a sexualidade de Alexandre, ainda que ela pudesse ser encaixada em rótulos pós-freudianos. Sua importância, até onde sei, não foi como amante — glória que reservo ao meu bom veneziano Giácomo –, e sim como guerreiro e rei. Isso deveria bastar.

5 thoughts on “Alexandre — mas pode chamar de Sandrinha

  1. O mundo está ficando mais reacionário. Quando lançaram o épico gay “Ben-Hur”, ninguém se incomodava com isso…

    E esta gente toda que se incomoda com o amor grego, que regredir no tempo até quando?

  2. Faço faculdade de História. Sempre ouso: “Mas aquilo que falam sobre fulano é verdade mesmo?!”

    Esse povo é tão fofoqueiro que não perdoa ninguém. Nem personagem histórico.

    Penso como você. Além dos termos não serem adequados, pouco importa a “orientação sexual” de Alexandre. O mesmo serve para Hitler e companhia.

    Beijos

  3. A bissexualidade em Ben Hur foi um detalhe bem trabalhado e só percebido com o tempo. Tal como Capitu, nada fica declarado. A bissexualidade em Alexandre é jogo prá venda. Não alcança o que foi feito em Ben Hur.

  4. A sexualidade de Alexandre é a coisa de menos importância na história toda, acho q isso é uma perda de tempo tão grande, é como se preocupar com a preferência culinária dele, ou seja muito falta do que fazer e pensar…Sinceramente a explicidade ou não de seus amores é apenas um complemento da história dele…Duvido se o caso fosse dele ser um garanhão haveria tal “polemica”

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