Há algo de estranho na crítica cinematográfica, e essa estranheza pode ser percebida quando alguém se debruça sobre a recepção dada a dois filmes diferentes que ainda estão em cartaz, “O Estranho Caso de Benjamin Buttom” e “O Corajoso Ratinho Despereaux”.
“O Estranho Caso de Benjamin Button” é um filme medíocre e sem imaginação. É “Grandes Esperanças” estrelada por Forrest Gump. Não Tom Hanks; Forrest Gump, mesmo, o personagem idiota.
Inspirado em um conto mediano de Fitzgerald com cerca de 20 páginas, o filme dirigido por David Fincher (bom diretor de alguns excelentes filmes, como Se7en e “Clube da Luta”) só traz do original a idéia de um homem que nasce velho e morre criança, e mais nada. O resto é uma coletânea frouxamente amarrada da experiência de 100 anos de clichês cinematográficos em filmes para pessoas que choram fácil no cinema. Mesmo isso talvez já seja demais: em nenhum momento há um mínimo de possibilidade de identificação com a situação do personagem vivido inexpressivamente por Brad Pitt; nem sequer um olhar surpreso pelas situações que a a inversão da ordem das coisas pode causar.
O conto original não é um dos melhores de Fitzgerald. Na introdução a ele em The Short Stories of F. Scott Fitzgerald, Albert Bruccoli lembra que Fitzgerald encontrou dificuldades para vendê-lo. Inspirado por Mark Twain, Fitzgerald não conseguiu ir além do óbvio, e o conto acaba sendo simplista em excesso. Mas ainda assim é uma obra superior ao filme que inspirou — e, o que é melhor, bem mais curta. Enquanto Fitzgerald usava a parábola do “homem ao contrário” para fazer algumas observações sobre a sociedade americana e suas expectativas acerca de seus membros, e não atingia seu intento, Fincher consegue fracassar de maneira muito mais retumbante, e gasta quase três horas falando sobre nada. Não se aprofunda nas perguntas sobre a sociedade que o tema levanta; mas tampouco consegue mostrar quem é Benjamim Button, intepretado de maneira particularmente ruim por Brad Pitt. Benjamin Button passa pela vida como Forrest Gump, com a diferença de não ter alterações no QI ou comportamento aos 70 ou aos 15 anos. Fincher não tem imaginação, e não parece ter percebido as possibilidades que tinha em sua mão. O resultado é um filme vazio cujos melhores momentos são propiciados por um velho que conta, ao longo do filme, que foi atingido sete vezes por raios — provavelmente porque essas cenas têm tão pouco a ver com o filme que nos oferece um merecido alívio daquela modorra sub-dickensiana que são os encontros e desencontros de Brad Pitt e Cate Blanchett.
“Benjamin Button” é um filme ruim, falso, em que não shá verdade. Poderia ter sido uma boa comédia besteirol, dessas dirigidas pelos irmãos Farrelly; e Fitzgerald percebeu esse potencial, dando-lhe um tom de farsa que está ausente no filme. Fincher não percebeu que o único caminho para o absurdo seria a comédia, ainda que narrada seriamente, e realizou uma bomba de um sentimentalismo manufaturado e artificial.
Mas mesmo sendo um filme tão ruim, “Benjamin Button” vem colecionando críticas elogiosas por onde quer que passe. Um bocado de indicações ao Oscar, que é no mínimo um bom termômetro da indústria cinematográfica americana. Elogios de muita gente.
Então tá.
Do outro lado, há “O Corajoso Ratinho Despereaux”, desenho animado da Universal que está sendo exibido sob uma acolhida morna da crítica. Morna porque ela está mais preocupada em louvar as qualidades de outros dois desenhos deste último ano: “WALL-E“, da Pixar, e “Bolt”, da Disney.
“WALL-E” foi aclamado ano passado como uma obra-prima. É um excelente desenho, é verdade; mas jamais uma obra-prima. É apenas mais um, como os tantos que saem a cada temporada de férias. A Pixar, assim como sua co-irmã Apple de Steve Jobs, parece trabalhar sob um signo de infalibilidade presumida. Não há um novo lançamento seu, por medíocre que seja, que não seja objeto de elogios hiperbólicos da crítica. No entanto, se formos olhar para os desenhos que fizeram realmente diferença nesta década, veremos que não saíram de seus computadores, como “Shrek” — com a exceção provável de “Os Incríveis”, que na época chamei de “o melhor desenho infantil feito para adultos da história”.
Já “Bolt” só pode ser elogiado a partir da admissão de que a máquina de publicidade da Disney ainda funciona. Não é tão ruim quanto um “Bee Movie” ou um “Encantada”, mas está longe de ser realmente brilhante. É apenas mais um desenho animado que absorve alguns dos novos clichês do gênero — e aí, sim, pode-se dar à Pixar o seu merecido crédito por definir o novo padrão: “Bolt” deve muito a “Os Incríveis”. No entanto a crítica já viu nele o “renascimento da Disney”. Viu demais. Bolt se enquadra na mesma categoria de “Irmão Urso” ou “Nem que a Vaca Tussa”: filmes com um bom padrão de qualidade mas que acrescentam pouco ou nada.
Enquanto isso relegam “O Corajoso Ratinho Despereaux” a a um papel menor e injusto. É um crime. “Despereaux” é o primeiro desenho animado em quase 15 anos a conseguir resgatar a magia que um dia foi o playground dos desenhos animados da Disney. Há uma veracidade de conto de fadas, uma pureza narrativa, um respeito a valores universais que esão ausentes de virtualmente todos os desenhos dos últimos tempos. “Despereaux” tem elementos plásticos eventualmente brilhantes, como o estilo medieval de desenho utilizado em vários personagens, mesclados de maneira sutil com traços que remetem aos bons tempos dos Estúdios Walt Disney.
Walt Disney, o homem que criou todo um gênero — o longa metragem infantil de animação –, teria orgulho de um filme como “Despereaux”.
As reações distintas a “Benjamin Button” e a “Despereaux” mostram o estado pífio a que a nossa crítica chegou. Hoje parece pouco mais que a compilação dos releases dos estúdios. Não deve ser à toa que, na semana passada, morreu o último grande crítico brasileiro de cinema. Moniz Vianna morreu porque deve ter percebido que, dentro do estado caótico da crítica de cinema, já não fazia mais sentido.
A categoria não devia ser “Stating the Obvious”?
(A critica de cinema morreu faz décadas, logo depois da crítica literária. Hoje o que há são “críticos” que se acham o máximo por dizer que filme bom, para eles, é filme que faz sucesso comercial. Não me espantaria saber que são estes “críticos” que escrevem os releases dos estúdios, como bico de fim de semana…)
Acho que você tá ficando velho…
concordo com tudo… menos com a parte de Bee Movie. Bee Movie é muito bom… simples, mas muito bom.
Desperoux não vi… mas não vejo muito mérito em fazer desenho que remete aos bons tempos de Walt Disney; quer dizer, os bons tempos de Walt Disney tão muito fora de moda hj em dia…
Concordo, de maneira geral, a respeito de Benjamin Button: fui com altas espectativas ver o filme mas acabei ficando decepcionado e de saco cheio em várias partes. Embora o clímax tenha justificado um pouco as coisas, aquela recapitulação “algumas pessoas fazem alguma coisa” foi vergonhosa… Slumdog Millionaire, que concorre também ao Oscar, é infinitamente melhor, mais sincero e mais bem acabado.
Já sobre Wall-E, discordo de você. Claro que a questão dos “privilegiados da crítica” é importante, e merece ser discutida (no que seu post desempenha um ótimo papel), mas Wall-e foi aclamado universalmente não só pelo público como pela crítica também, inclusive na opinião dos “especialistas”. Lógico que isso não significa, necessariamente, nada, mas o filme merece o rótulo de obra-prima, a meu ver… a parte técnica leva a animação um passo adiante, com movimentos da câmera mais complexos e sofisticados, mas o que é realmente importante é o conteúdo, e aí o filme goleia. Sensibilidade apurada, personagens inesquecíveis, roteiro preciso, cenas sublimes… e ao mesmo tempo uma “visão sombria do futuro da humanidade”, uma mensagem que é passada de maneira irretocável…
Claro que gostar ou não do filme é opinião pessoal, mas a classificação de obras de arte como obras-primas ou canônicas é matéria para o tempo, que dirá o que sobrevive e o que é esquecido.
abraço
Outra coisa irritante no filme é a voz do narrador em off. Quando é usada para introduzir o passado do personagem é até aceitável, mas quando reitera o que estamos vendo na tela é rídicula. Parece que o roteirista ficou na dúvida se a platéia entenderia a “mensagem” do filme.
Resumo do filme em uma frase: 100 Segredos das Pessoas Felizes misturado com Amnésia…
obrigada pelas críticas. Brad Pitt eu não iria ver, mesmo. Sou preconceituosa assumida. Mas adoro desenhos e fiquei na dúvida com Desperaux. A crítica da FSP desancou e eu balancei. Você usou argumentos que eu entendo ( o que é ótimo, eu dificilmente entendo críticos) e me sensibilizaram. Vou lá ver e já volto 🙂
abração
A crítica autêntica (na falta agora de um adjetivio que calhe melhor), que pode ser aquela que não se impressiona fácil, não sumiu, apenas vem encolhendo, como tantas outras coisas. O pessoal vem se esquecendo das sutilezas…
Mas o caso de Benjamin Button é um tanto mais grave. E, para mim, apesar de ter gostado muito do vencedor do ano passado, serviu para eu abandonar de vez o Oscar como distinção crítica (coisa que há tempos já vinha menosprezando, e não somente ele, mas também Palma d’Or etc.) – mas que, claro, tem lá sua utilidade.
Quando ao assunto, indico-lhe um texto do Luiz Carlos de Oliveira Jr., acompanho o trabalho dele pela revista Contracampo, e a este chamo um crítico autêntico. O texto está na revista 92, dá para ver no site.
Caro Rafael:
Gostaria de parabeninzá-lo pela crítica ao filme “O curioso caso de Benjamin Button”. Foi perfeita e expressou bem a mediocridade do filme, que é tudo, menos arte. Chamem de auto-ajuda se quiserem. Não tenho nada a acrescentar a seus comentários, os mesmos que fiz aos meus fanáticos amigos, que não entenderam a razão de minha indisposição para com a obra. Fui o “velho” do grupo.
Abraços,
Thales.
Esse cara fumou maconha??? O Curioso Caso de Banjamin Button é um dos melhores filmes q já vi, e ganhará o Oscar hj pra calar a sua boca.
Ah, e a pessoa q disse q estava em dúvida se ía ou não e depois q viu a critica não foi,não sabe o q está perdendo.
…. n concordo com a maior parte da critica do caso de benjamim… quer dizer.. algumas sim.. da pra notar o vosso ponto de vista… mas um filme n é so isso… é o ambiente e clima q consegue fazer com q as pessoas se percebam a idéia principal e n só… peço desculpas se ofendo alguns, mas a minha opiniao é que o filme nao esta mal de todo e seria a meu ver um otimo filme pra se ver e ficar mais proximo de nossos proprios pensamentos… eu sei q a historia facilita muito… msmo assim… a evoluçao com q o filme decorreu é boa… e os detalhes… sao detalhes… nunca vi uma obra perfeita em toda a vida… e a quem estiver a se sentir o velho do grupo… eu aconselho com q viva mais a vida .. se divirta mais.. beba mais… f**** mais!!! e aprenda a resgatar ou criar formas mais radicais de se viver…. ser o “velho” em um filme n é mal… mas o “velho” em uma vida toda n deve ser muito agradavel…
Caro Rafael,
Com todo respeito, ridículo e fracassado são seus comentários…vc devia ter mais cautela ao criticar filmes,não percebendo que os fracos de pouca personalidade irão por suas palavras bisonhas e infelizes.Talvez vc gose de filmes violentos,com muito sangue,não é? talvez não tenha discernimento quando o assunto é mais puro e denso..fica mais difícil mesmo de enxergar,não é pra todo mundo..mais fácil é criticar quando não entendemos…curta Rambo,Missão Impossível..deve essa sua linha de filmes favorita… vc está ultrapassado.
Leonardo,
Infelizmente, o Oscar não parece ter correspondido às suas expectativas.
Daniel,
Com todo o respeito, você é só um idiota.
esse maluco eh um merda, belo criticoo
um filme com um tema bem curioso, mt bem feito o filme..
um dos melhores filmes q eu ja vi!!
ao inves de ficar falando, deveria tah se ocupando e fazendo algo de produtivoo!!
Caro Rafael,
Li hoje no LLL (do alex castro) sobre seu blog e vim direto para cá. Gostei muito (mas ainda retorno aqui para ler os demais posts com calma!).
Só queria dizer que fico feliz por não ser um dos poucos que ao sair do cinema comparou o Benjamin ao Forrest Gump. Disse a minha namorada ao sairmos do cinema sobre tal semelhança mas fui ignorado 🙂 Aí escrevi no meu blog umas observações a respeito. Não sou crítico de cinema, mas lendo hoje o que escreveste vi que não estava doido. Apesar disso, gostei do filme, ainda que com todos seus clichês. E ele causa certa estranhesa na maioria das pessoas que não pensam na morte e assuntos correlatos.
abs e parabéns.
Concordo que o final do filme “Benjamin Button” do “existe pessoas que fazem isso ou aquilo” foi decepcionante. E o filme me lembrou também o personagem Forrest Gump e que algumas partes parecem um pouco com “auto-ajuda”. Mas esses fatores, não indicam que o filme é horrível.
Você falandoparece aqueles metidos a “cult” que não suporta muito ver um filme “comercial” bom (com rara excecões.)
Não li a critica anteriormente, fui por curisosidade.
Maquiagem fantástica.
Agora ao filme como um todo:
Puxa!! Como esperava mais! Quando tinha a sensação que ele ia se aprofundar em algo, caia no vazio, pura frustração.Saí do cinema, certa que valia a pena ver a beleza de Brad Pit e a atuação de Kate Blanchet, e só.
Um erro eu ter indo ao cinema, um erro desprezar um material enorme desse e não se aprofundar em nada.
Você está em um nível ou dois abaixo na escala da evolução espiritual! Desculpe minha franqueza! Você relatou o seguinte sobre o filme de Benjamin Button: ” em nenhum momento há um mínimo de possibilidade de identificação com a situação do personagem vivido inexpressivamente por Brad Pitt; nem sequer um olhar surpreso pelas situações que a a inversão da ordem das coisas pode causar”!!! Começou muito errado nas críticas! Ou realmente você não tem este “paladar” para com a vida! Você tem apenas um olhar consciênte e racional! Formal! Apenas um exemplo para você entender: tem uma cena que ele, aos seus 7 ou 8 anos, é pego com a garotinha na madrugada dentro de uma casa de lençois brincando! Pelo menos é o que ele estava fazendo! Mas a Sra tia da garotinha, aos seus olhos, viu outra coisa! Pedofilia! E o pobre garoto com aparência de velho nem imaginava o que havia feito de errado! Lhe pergunto: esta cena não seria “um olhar surpreso pelas situações que a inversão da ordem das coisas pode causar”????