Meus filhos da puta, mais uma vez

Plataformista, na verdade a minha admiração pelos “meus filhos da puta” passa longe da questão política. É uma questão de verve pessoal. Ainda que ela, sou obrigado a confessar, em grande parte derive de sua canalhice.

Já fiz campanhas para candidatos de todos os tipos, do PCdoB ao PFL. Já escrevi discursos e comerciais para gente honesta e para gente desonesta. Para bons e maus produtos e serviços também, mas isso não vem ao caso. E uma das coisas que aprendi é que honestidade e honradez não são exclusivos de nenhum partido ou tendência política. Já vi gente decente em partidos de direita e gente que não vale o que a minha gata enterra em partidos de esquerda.

É por isso que há muito tempo passei a avaliar pessoas e políticos por critérios basicamente pessoais. Não me interessam as posições de alguém, desde que sejam defendidas com honestidade intelectual. Me reservo, no entanto, o direito de concordar ou discordar delas. Decência pessoal ajuda, também. Mas quando lembro que adquiri uma antipatia irredutível a Jorge Luís Borges por causa de sua atitude canalha frente à ditadura argentina, acho que posições firmes demais nem sempre são um bom sinal.

No caso de ACM, é preciso separar as duas coisas. Muito do mito de ACM se deve à agressividade com que vai ao ataque, à facilidade como intimida seus adversários (embora não tenha conseguido com Itamar…). Mas na questão política, ele não é muito diferente de seus colegas. Por exemplo, no episódio da violação do painel de votação do planalto ninguém falou de gente como Heloísa Helena, paladina da moralidade enquanto faz acordos pouco éticos com Renan Calheiros. Os exemplos são muitos. ACM pode ser o retrato do diabo, mas é igual a muitos outros.

No fim das contas, o que fica é a constatação de que ACM é um bom administrador. É um sujeito que tem visão estratégica. Salvador hoje não é o caos absoluto graças, em boa parte, às suas intervenções no cenário urbano da cidade. É digno de admiração também o nível de respeito à cultura baiana que se percebe nele. Bem ou mal, bom ou mau, ACM é baiano. O episódio de como a Bahia levou a Ford (o início da investida baiana se deu numa Besta, saindo do aeroporto Dois de Julho, em maio de 1999) depois que ela desistiu do Rio Grande do Sul mostra que o sujeito e seu grupo sabem como fazer as coisas. Anos lidando com incompetentes de todos os tipos me ensinaram a valorizar a competência dos outros.

Enquanto isso, homens dignos e invejáveis como Waldir Pires, sem uma mancha sequer em sua biografia, fazem um governo horroroso. O que é melhor para o povo? Certamente não é credo político. Já acompanhei de perto governos de esquerda e de direita, e a conclusão triste a que cheguei é que, na maioria deles, o povo ganha mais quando simplesmente vende seu voto. Nem que seja por uma dentadura.

Lembro de uma conversa entre a politicamente correta Letícia Sabatella e Popó no “Altas Horas”. Naquela conversa fiada de programa chato de TV, Popó perguntou se ela gostava de boxe. Não. Ele perguntou então algo sobre ela ter, pelo menos, orgulho da luta do Popó como exemplo brasileiro. A resposta da Sabatella: “Não. Tenho pena.”

Popó pode ter origem humilde, mas é um gentleman e fingiu que não ouviu. Minha origem é um pouco menos humilde, mas meu pavio é muito mais curto e minha vaidade veio com defeito de fabricação no item ABS. Na mesma hora, eu teria respondido diferente: “Não sei por quê. Eu sou o melhor do mundo no que faço e você é só uma atrizinha de merda casada com outro atorzinho de merda” (na hora de xingar, nunca é demais xingar a família toda).

Para a Sabatella, como para muita gente, é fácil sair por aí dizendo que é de esquerda, se internar em acampamentos de sem-terras (que, acredite em mim, fede como poucas coisas) e dar uma de Rosa de Luxemburgo dos trópicos. Mas respeito ao povo, mesmo, é outra coisa. E tratá-lo como igual.

Gente como a Sabatella deve achar um absurdo a frase de Figueiredo. É politicamente incorreto dizer que povo fede. Mas quem diz isso certamente nunca pegou um ônibus para o subúrbio às 6 da tarde. Ou nunca viu um sujeito empestear um elevador às 9 da manhã, porque já estava no batente desde as 4. Para mim essa é uma atitude elitista, porque no seu cerne há uma condescendência paternalista típica de quem se acha superior àquilo. É fácil se horrorizar com essa constatação sentadinho numa poltrona confortável, morando em um “bairro bom”. Enquanto isso, o povo, mesmo, não tem nenhum pudor de debochar dos próprios odores.

(E, em último caso, é até uma questão de estética olfativa. Eu realmente prefiro o cheiro de cavalos suados a cheiro de gente suada e cansada. Também gosto de cheiro de curral e de leite sendo tirado. Tem gente que prefere perfumes da Avon, ora.)

Bem, isso tem pouco a ver com a minha admiração, como falei no início. Eu gosto de boas frases. Gosto de inventidade. Gosto da sinceridade de alguns deles, e da inteligência de outros. Esses são valores que independem de política. São universais. É por isso que gosto desses filhos da puta.

Mas, se isso serve de contrapeso, eu também sou um grande fã da Irmã Dulce.

12 thoughts on “Meus filhos da puta, mais uma vez

  1. Minha mãe era de uma cidade mineira chamada Curvelo. O marido da asquerosa Sabatella também. Em Curvelo, vivem minhas tias fanáticas religiosas (loucura fantasiada de catolicismo). Elas ADORAM a Sabatella, pois, quando o casalzinho certinho está lá, vão os dois à missa, para mais um espetáculo. O de “religiosos”. Já tinha certa implicância com relação àquela figurinha dita “do bem” (termo que DETESTO, diga-se de passagem). Agora, tenho repulsa. E fico feliz em saber que o cocozinho que ela faz (mas não admite e faz questão de ter cara de quem não caga) deve feder mais do que os excrementos do finíssimo Popó (Aliás, acho que escola não ensina elegância a ninguém. E saber regras de etiqueta NÃO TORNA NINGUÉM ELEGANTE.) Elegância vem de berço. Berço de ouro? Não. Pode ser berço feito de tábuas catadas num lixão. Felizmente, elegância é imune a contas bancárias fartas.

  2. Eu de novo: você conseguiu com seu post, senhor Rafa, dissolver um pouco do maniqueísmo que emperra o mundo. Certamente a Sabatella pertence ao time dos “bonzinhos”. Azar dela!

  3. Depois de achar a decência.. Não vem ao caso, ao meu ver, dizer se esse ou aquele bandido vestido de deputado é pior ou melhor que esse ou aquele governador. O importante é que pra mim, que não sou baiano, ACM fede pior que o povo, e eu nem sei que perfume ele usa. Acho que tenho mais referência se tratar de um figura como o Maluf, que é elas por elas com o grande cacique da Bahia. Ele fez, sim, grandes obras. Faraônicas, eu diria. A que custo? E sim, vou entrar no jargão de crítica esquerdista(!). Custa bilhões no bolso do contribuinte, pois essa é a soma que vai para o caixa-2. Em São Paulo, o que vejo, é que esses canalhas (e não me redimo de tal acusação) fazem todas as falcatruas, cagadas, roubadas possíveis, mas edificam mausoléus e projetos para inglês (e povo) ver. A bosta, no entanto, ficam para os partidos que vem depois (geralmente de centro-esquerda pra lá) que ganham força depois de denúncias de corrupção do atual governo de faraós.

  4. O problema está para além de esquerda e direita. Discurso de socialite tb não me comove. Elas estão muito-bem-obrigado e falam o que é de conhecimento de todos sobre os problemas do país. “Tenho 1bi no banco, mas o Brasil tem fome”! Quanto a partidos não consigo separar a merda da mosca, infelizmente, dirão alguns… para mim tudo fede igual. Agora digo: infelizmente fui criado com uma visão de utopia maniqueísta do mundo. Esforço-me para me esquivar dessa visão, e humildemente, acho que sou vitorioso algumas vezes. Pelo menos reconheço… é o primeiro passo, dizem… Não crio espectativas quanto a partidos, orientações ideológicas e etc. E sobre aqueles que tem um histórico impecável e fazem um governo “horroroso”, tenho minhas dúvidas… afinal, o que é horroroso depois de tudo isso? Mas provavelmente essa discussão vá se acabar logo pois ninguém está aqui para resolver os problemas do mundo. Somo apenas bons mortais…

  5. E juro que vou embora depois dessa: Aprendi que “polêmica e coisa do tinhoso”. Desculpem-me.

  6. Plataformista, faço suas as minhas palavras… Olha o Rafa deixando a gente na mão! O que será? Greve? Férias? Não pode, né? Beijos da Mônica.

  7. Ih… Troquei tudo aqui! Na verdade, faço minhas as suas palavras… Que mania a minha de dar uma de: “eu vi primeiro”! Mas foi sem querer… E não foi ato falho não, viu? 😉

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