Um artigo curioso na Primeira Leitura de dezembro: Hugo Estenssoro faz uma resenha de The Mith of Hitler’s Pope, do rabino David G. Dalin. O livro procura derrubar a idéia de que o papa Pio XII fez vista grossa à perseguição dos judeus pelos nazistas.
Não li o livro, o que faz deste post apenas um comentário sobre a resenha e sobre os aspectos ressaltados nela.
O problema de Dalin, como apresentado, parece ser a fraqueza de grande parte da argumentação. Dalin torce ao máximo interpretações, inclusive retirando-as de seu contexto histórico, para recriar a imagem que teve o papa até 1963: a de um líder que, embora pudesse ter feito mais, ao menos fez sua parte. E isso é uma inverdade.
A resenha afirma que Dalin “consegue também fundamentar suas afirmações com erudição e elegância. Assinala, por exemplo, que Hitler dificilmente teria desenvolvido planos de seqüestrar o papa se ele fosse seu aliado”. Não consigo ver a elegância em simplesmente dar uma opinião na base do “se”, mas essa afirmação equivale a dizer que Hitler dificilmente teria invadido a União Soviética se Stalin fosse seu aliado. No entanto, foi exatamente isso o que aconteceu. Dalin parece subestimar o que há de temporário em política para justificar os atos do papa, e parece não entender que alianças são quase sempre efêmeras — ainda mais em tempo de guerra. Hitler, mesmo tendo entre seus defeitos uma ignorância crassa e um profundo eurocentrismo — uma das razões para perder a guerra –, sabia disso.
“A decisão de acolher uns 3 mil judeus em Castelgandolfo, durante a ocupação alemã de 1943, foi simplesmente um ato de coragem”, como afirma o livro? Talvez. Mas essa coragem talvez empalideça quando imaginamos as manchetes do dia seguinte, em caso contrário: “Vaticano se recusa a acolher uns 3 mil refugiados judeus”. O custo moral, mas principalmente político, para o Vaticano seria muito maior, e Pio XII sabia disso. Não se está dizendo aqui que o asilo dado tenha sido resultado de covardia; apenas relativizando a “coragem” que julgam ver ali.
É preciso lembrar que, além de líder espiritual, o papa era o chefe de um Estado soberano. E dentro dessas condições parece humilhante comparar 3 mil judeus salvos principalmente por falta de opção aos 1200 que Oskar Schindler, trabalhando dentro do sistema e sem metade das garantias de que o papa dispunha. Se os 3 mil refugiados representam um ato de coragem para um homem com o poder papal, os judeus de Schindler representam um ato divino.
“O fato de Pio 12 não ter excomungado Adolf Hitler ou os carrascos dos judeus (…) é uma questão bem mais complexa, embora a secular história da Igreja demonstre que os resultados são quase sempre contraproducentes”. Provavelmente o imperador alemão Henique IV, humilhado e ajoelhado na neve de Canossa, aonde tinha ido suplicar ao papa Gregório VII a suspensão sua excomunhão, pensava nesses aspectos curiosos das coisas de Deus. Certo, é preciso admitir que no século XX excomunhões significam pouco ou nada. Mas há uma diferença entre “contraproducente” e “ineficaz”.
Dalin tem razão ao afirmar que “não há razões concretas para pensar, como fica claro com o material exposto no livro, que um enfrentamento aberto com o Terceiro Reich teria melhorado ou aumentado a capacidade do Vaticano para contrariar, evitar ou atenuar a barbárie nazista”. Assim como São Paulo não tinha nenhuma razão para acreditar que ser apedrejado em Listra ou açoitado em Filipos faria alguma coisa pelo crescimento do cristianismo. Se se posicionar abertamente contra o nazismo, e reconhecer o crime contra a humanidade na perseguição aos judeus, poderia ou não ter surtido algum efeito, é algo que pode ser deixado à imaginação de cada um. O certo é que o silêncio de Pio XII não fez absolutamente nada nesse sentido.
É esse o defeito principal nessa abordagem do papel da Igreja Católica em relação a essa crise. Ela borra a linha que separa heróis de covardes — ou, se essa palavra parece muito forte, de “prudentes”. Pode-se aceitar do alemão comum o silêncio, até mesmo a colaboração. Mas tal atitude é inaceitável no líder espiritual de milhões de almas. É a coragem que, por exemplo, os primeiros cristãos tinham de sobra, ainda que em meio a uma névoa de fanatismo. A coragem que milhares de cristãos alemãos tiveram ao esconder judeus em suas casas. A mesma coragem que faltou a Pio XII.
Não tenho nada a comentar, a não ser que adorei o artigo.
Seu blog é a minha principal fonte para entender a Segunda Guerra Mundial…
Abração!
O que me impressiona é que uma revista que se pretende politicamente moderna, abrace com tanta ênfase o catolicismo, chegando ao ponto de fazer crítica ideológica do filme “Cruzadas”.
A direita é mesmo bizarra.
Que me crucifiquem, mas a igreja só apóia os que possam lhe trazer algum proveito. Ao demais, no mínimo, ignora. Sempre foi assim, desde os tempos antigos e não mudará, mesmo perdendo fiéis em todo o mundo.
A Igreja fez o que fez porque precisava preservar sua independência, sobreviver a Hitler e continuar a difundir sua mensagem de desapego aos bens materiais e coragem frente ao perpetradores do Mal.
Eu tenho o livro O Papa de Hitler. Não consegui ler. Estou viciada em blogs… Passo horas e horas lendo blogs e minutos lendo livros.
Eu hein…
Realmente deve ser muito difícil harmonizar interesses políticos, religiosos e econômicos. Mais difícil ainda deve ser tomar meias medidas tentando agradar a todos.
…E carregar a culpa pelo resto da vida.
A omissão da igraja durante as atrocidades alemães durante a segunda guerra será muito difícil de ser esquecida.
gd ab e ot fds
É uma verdade que o Papa Pio XII poderia ter feito mais pelos judeus e todos que sofriam com a segunda guerra.
Faltou mais cárater a Igreja, por fazer “vista grossa” a tudo que estava acontecendo na época…
o governador Roberto Requiao do PR foi condenado na ONU por maltratar presos por uma agencia de protecao dos direitos humanos e nao leio nada sobre isso em lugar nenhum…
Rafitxo!!!
Eu perdi a sua volta… 🙁
Tava ocupado nestes primeiros dias do ano…
Anyway…
Pense numa raiva que dá quando publicam uma merda dessa num veículo de direita!
Porra, bora brincar de deixar os artigos tendenciosos pros folhetins dos esquerdinhas que lá eles estão em “boa companhia”…
Putz…
Mas, once the shit is done we’ve got to live with it…
:@
Bora simbirá que a vida não dá descanso a ninguém não… 😀
Ó, lembro que comecei a ler seu blog por causa do “As alegrias que o Google me dá”, pois, qual não foi a minha surpresa quando digitei meu nome sem aspas nem pocilga nenhuma nele e o primeiro link era do “Propositalmente Incorreto”! Caiu por terra a teoria daqueles que diziam que isso só acontecia com quem, como você, coloca o próprio nome como endereço do blog. 😛
Abração, espero ler muitos post’s seus este ano!
Algumas teorias fazem sucesso porque trazem conforto aos maiores interessados. Daqui a pouco estaram fazendo uma descartando o terrorismo alemão como a pior coisa que já existiu na fase da terra, para colocar a culpa nos americanos. Não é mais confortável?
Bom fim de semana! Beijus
Rafael,
“Mas essa coragem talvez empalideça quando imaginamos as manchetes do dia seguinte, em caso contrário”
Que manchetes? Ondem? Ninguem denunciava perseguição alguma. Isto é um sofisma delirante.
Agora, quem torce, no caso, é quem acusa. Dalin lida com fontes primárias. A critica ideológica contra o Papa é tola.
O Papa salvou mais judeus que Oscar Shindler ou qualquer outro indivíduo. Se fosse nazista, não teria denunciado o nazismo como uma heresia odiosa. O resto é ideologia.
Todo mundo sabe que a Igreja Católica tá mais pra partido político e fornecedor supremo e mundial de neuras do que pra qq outra coisa. Eu tenho e li o Papa de Hitler e te digo: a falta de alternativas é capaz de deixar a mente incrivelmente clara. E no caso, ele como pontífice supremo da instituição deveria ter nivelado tudo a somente duas opções: fazer o que é certo ou o que é errado. É isso.
O resto é, e sempre vai soar como justificativa capenga.
Nossa, faz tempo que não passo por aqui. Ainda que seja dia 16, quero te desejar um feliz ano novo. Para variar, vc continua escrevendo muito bem! Um beijo grande.
Delance,
A crítica ideológica ao Papa é tola por quê? Se estou falando de política, e não de fé religiosa, me parece mais do que justa. Mas eu não estou falando de ideologia, e sim de história. Fatos. Pio XII fez ou não o que podia para defender os judeus. É disso que se fala aqui.
Ninguém denunciava perseguição onde? O mundo inteiro estava enganado? Se você quer dizer com isso que ainda não se sabia do Holocausto (que ainda não tinha sequer começado em 1941), tudo bem. Mas desde as leis de Nuremberg, a partir de 1933, já havia muita gente denunciando a perseguição aos judeus. Pio XI fez muitas; o próprio Pio XII fez várias declarações nesse sentido.
Onde você leu, neste post, que Pio XII era nazista? O que se disse aqui é que ele fez vista grossa e deixou de tomar medidas possíveis. Forçar uma declaração para justificar uma defesa me parece desnecessário.
E se você considera que o papa e Schindler — que foi só um exemplo: há vários outros mais; inclusive, se a crítica ao catolicismo te incomoda, muitos padres e bispos — tinham a mesma capacidade de ação, aí a coisa complica. Além disso, colocar o papa como um simples “indivíduo” é forçar demais a barra.
Dá uma olhada aqui: http://www.jcrelations.net/en/?id=759 É o relatório preliminar da Comissão Histórica Internacional Católica-Judaica encarregada em 1999 pelo Vaticano de investigar as atividades de Pio XII.
A esquerda não se atreve a falar sobre esses assuntos, André. É complexo demais, entende?
Rafael,
Você por acaso sabe a razão de o Idelber ter encerrado o blog ?
Concordo com o Pedro Dória (por onde soube da notícia):
Vai fazer falta !
Não li o livro de Dalin e muito menos o artigo da Primeira Leitura, mas os comentários do livro, em especial do Thomas Woods Jr., me pareceram indicar uma obra bastante razoável.
Vale lembrar que a perseguição aos judeus, no mundo das Jim Crow Laws, lichamentos, dos campos de concentração para americanos descendentes de alemães e japoneses, parecia bem menos revoltante que agora.
Até por quê, não entendo por quê se critica tanto o Papa por sua suposta omissão e não os EUA pela restrição à entrada de imigrantes judeus em seu país depois de 1924.
realmente durante a 2º guerra a igreja foi omissa ao naõ tomar uma posição frente a humanidade sobre a questão do NAZISMO DE HITLER.
existem homens fortes e fracos a igreja não sabe escolher os que os guia.
Bom, parece-me que Oskar Schindler era católico. Seguiu fielmente os ensinamentos da Igreja sobre a igualdade entre todas as raças.
Só que esta questão do Papa já virou motivo de pregação ideológica e política. O mesmo aconteceu quando a Igreja canonizou o papa João XVIII. A imprensa se pôs a criticar a Igreja, porque este papa teria sido um adulador de fascistas, o que não se provou até hoje.
Falta destacar também que o Papa criou uma comissão pontíficia, pedindo para que os sacerdotes e leigos católicos ajudassem os judeus perseguidos em suas necessidades. Por isso que Castel Gandolfo abrigou 3 mil, e outras igrejas e monastérios da Europa também abrigaram, assim como católicos que observaram este pedido do Papa.
Pedir para que o Papa fizesse mais do que isso já era pedir demais, pois que qualquer um virava uma mosquinha afogada no leite naquele período obscuro da nossa história.
Embora o fato de o Papa PIO XII poder ser produto do meio, por seu pai ter dedicado a vida trabalhando para o vaticano e sua mãe ser intensamente católica, não o isenta da culpa por tamanha insensatez e falta de amor ao próximo, afinal é isso que Deus mais quer de nós, que tenhamos amor ao próximo.
Muitas críticas infundadas ao Papa Pio XII. Existem vários livros que desmetem esta boataria. Vejam o que diz Albert Einstein a Revista TIME em 1940: “Quando aconteceu a revolução na Alemanha, olhei com confiança as universidades, pois sabia que sempre se orgulharam de sua devoção por causa da verdade. Mas as universidades foram amordaçadas. Então, confiei nos grandes editores dos diários que proclamavam seu amor pela liberdade. Mas, do mesmo modo que as universidades, também eles tiveram que se calar, sufocados em poucas semanas. Somente a Igreja permaneceu firme, em pé, para fechar o caminho às campanhas de Hitler que pretendiam suprimir a verdade. Antes eu nunca havia experimentado um interesse particular pela Igreja, mas agora sinto por ela um grande afeto e admiração, porque a Igreja foi a única que teve a valentia e a constância para defender a verdade intelectual e a liberdade moral”.
Caro companheiro, adorei o seu artigo, mas eu queria lhe pedir um favor se não fosse demais.
Tem como vc digitalizar o seu livro e colocar a disposição?
Adoraria lê-lo, mas não tenho dinheiro pra comprá-lo, ficarei grato co a sua solidariedade.
abraços.
“A decisão de acolher uns 3 mil judeus em Castelgandolfo, durante a ocupação alemã de 1943, foi simplesmente um ato de coragem”,
Meu caro, Segundo o diplomata e historiador JUDEU E. Pinchas Lapide, que foi cônsul em Milão, na sua obra “Three Popes and Jews” (Londres, 1967), “Pio XII, a Santa Sé, os núncios do Vaticano e toda a Igreja Católica teriam salvado de 700.000 a 850.000 hebreus da morte certa, no regime nazista. ” de quem descende boa parte da população judaica do mundo
VOCE DISSE. “Se se posicionar abertamente contra o nazismo, e reconhecer o crime contra a humanidade na perseguição aos judeus, poderia ou não ter surtido algum efeito, é algo que pode ser deixado à imaginação de cada um. O certo é que o silêncio de Pio XII não fez absolutamente nada nesse sentido”.
Veja o que disse o também Judeu .Robert M. W. Kempner, referindo-se à sua própria experiência durante o processo de Nuremberg, afirmou em uma carta à redação, depois de o “Commentary” ter publicado um trecho do livro de Guenter Lewy em 1964: “Qualquer movimento de propaganda da Igreja Católica contra o Reich hitlerista não só teria sido um ‘suicídio voluntário’ (…) mas teria também acelerado a execução capital de um maior número de judeus e sacerdotes”. assim pare de dizer que o Papa só fez se omitir
http://pt.wikipedia.org/wiki/Papa_Pio_XII#Cr.C3.ADticas.2C_pr.C3.B3s_e_contra
VOCE DISSE. O fato de Pio 12 não ter excomungado Adolf Hitler ou os carrascos dos judeus (…) é uma questão bem mais complexa, embora a secular história da Igreja demonstre que os resultados são quase sempre contraproducentes”. Provavelmente o imperador alemão Henique IV, humilhado e ajoelhado na neve de Canossa, aonde tinha ido suplicar ao papa Gregório VII a suspensão sua excomunhão, pensava nesses aspectos curiosos das coisas de Deus. Certo, é preciso admitir que no século XX excomunhões significam pouco ou nada. Mas há uma diferença entre “contraproducente” e “ineficaz”.
Meu caro a Igreja excomungou o nazismo desde 1932
Em agosto de 1932, a Igreja Católica excomungou todos os dirigentes do Partido Nazista. Entre os princípios anticristãos denunciados como hereges, a Igreja mencionava explicitamente as teorias étnicas e o racismo.
http://portalcot.com/reporter/a-igreja-excomungou-o-nazismo/
13 Declarações de líderes judeus em defesa do Papa Pio XII. http://www.cleofas.com.br/virtual/texto.php?doc=ESCOLA&id=esc0156
COMUNIDADE JUDAICA. Leia, o texto defende o Papa e a Igreja. http://www.riototal.com.br/comunidade-judaica/juda9b9.htm
Assim eu não conheço nenhuma instituição que tenha salvo tantos Judeus da morte no holocausto quandoa Igreja Católica