Facebook

Eu gosto de Facebook.

Até então eu não gostava tanto assim de redes sociais. Sou um mastodonte para essas coisas, passei batido pelo Orkut, Twitter nem sei quem tu és. Mas do Facebook eu gosto.

E gosto mais porque descobri também que amo ver as pessoas reconstruindo seus passados com frases bem escolhidas, de maneiras mais ou menos sutis, porque a história da gente é a gente que faz, e o passado é uma obra em eterna construção. O sujeito que como eu não comeu ninguém a vida inteira passa a ser fodão; o moço que ninguém respeitava se comporta de maneira superior a todos, esperando que afinal de contas esse negócio do mundo ser dos nerds seja verdade. O bullying na escola passou a não existir, os tapas não doeram, e a foto na Europa esconde a bolsinha da CVC.

É assim mesmo, e talvez isso seja bom: as pessoas merecem ser felizes e ter a história que gostariam de ter, porque aquilo em que a gente acredita muito se torna realidade em nossas lembranças, quem vai dizer que não? E agora o que é verdade em nossas memórias pode ser verdade também nas memórias dos outros, porque o poder agora está em nossas mãos, longa vida à internet. E se a gente consegue convencer os outros, talvez consiga convencer a nós mesmos.

É por isso que gosto tanto ver as declarações de amor eterno e tão grande de casais que, eu sei, fora do Facebook se pegam de porrada, fazem troca de casais e às vezes se apaixonam pelos outros, corneiam o marido ou esposa amados — não é interessante como a gente sempre sabe da intimidade dos casais, a intimidade verdadeira? E isso me ensinou muito: aprendi que mesmo rolando na cama com outra pessoa eles ainda amam suas mulheres. E daí que ela deixa o amante lhe dar na cara, mas não o marido, se é dele que ela gosta, e a brasileira é mineira com marido e sueca com os outros?

A única mudança, menos sutil do que parece, é que antigamente a gente achava que as outras pessoas eram mais felizes por omissão. Ou seja, a gente achava que o casal tal era feliz porque não os via brigando, porque eles não lavavam sua roupa suja diante de nós, não se estapeavam na nossa frente; e por isso nos surpreendíamos quando se separavam: “mas eles pareciam tão felizes!” Hoje isso mudou, as pessoas passaram a mistificar as outras de forma ativa, e agora a gente acha que o casal tal é feliz não porque não os vê brigando, mas porque eles dizem que são felizes o tempo todo, sem que ninguém pergunte. E fulano que não vê o filho há seis meses mostra aqui e ali as fotos dele, os dois juntos sorrindo e meu filho, como eu te amo, gente, vê como eu sou um paizão?, e talvez, quem sabe, daqui a tantos anos o filho tome isso como atenuante, é, o puto realmente gostava de mim.

Todos dizem isso, claro, através do Facebook. E com tudo isso, com esse império de mentiras que não são mentiras, de verdades que não eram verdades, é engraçado como mais pessoas se tornam mais infelizes porque comparam a felicidade aparente dos outros com a sua própria, e vêm que suas vidas jamais serão como as vidas dos outros parecem ser, como as vidas dos outros nunca serão.

10 thoughts on “Facebook

  1. Eu gostava do twitter no começo e agora já me cansou! Odeio exaltação de egos! O facebook parace um play dos prédios do subúrbio onde as crianças descem para brincar somente quando ganham brinquedos novos. Mesmo assim, gosto mais do facebook, do que de qualquer outra rede social. Eu me divirto!! 🙂

  2. Daria like no seu comentário, se fosse no Facebook. ;-]

    Tenho essa mesma impressão, Rafa. Os meus amigos constróem bolhas de felicidade, bolhas grosseiras e sutis (sei lá, citando Augusto Cury numa foto de praia ou fazendo auto-ironia com um texto do Louis CK), e essas bolhas vão crescendo. Chega num ponto em que a bolha estoura, aquela alegria meio forçada, meio real, desaparece e só sobram algumas palmadinhas virtuais nas costas.

    É por isso que ultimamente venho usando o Facebook com menos frequência, apesar de ainda entrar bastante e ler o que meus amigos estão dizendo. Vejo todos eles construindo bolhas gigantescas, mas quando os encontro pessoalmente, estão todos igualmente fodidos, do mesmo jeito que eram antes, com a mesma timidez e falta de sangue no pinto, tão diferentes do que aparecem na linha do tempo. E eu também sou assim, por isso tento dar esse passo pra trás, pra não cair muito da tentação de criar essa onda de alegria atropelada.

  3. também uso o facebook e me sinto feliz por enquanto, porque ainda posso dizer isso: ” eu uso o Facebook” e não ele me usa. Uso pra encontrar gente, até antigos amigos e parentes que de outra forma eu teria preguiça de procurar. Lá eu acho e a cada dez anos marco alguma coisa. Sem o constrangimento da desculpa, uma vez que, melhor do que o papel, o facebook aceita tudo…
    Mas também fico pasma com o que as pessoas dizem que são. Gente que eu conheço e sei que não é nada daquilo. Olha, sou psicóloga por formação, e sempre me achei boa observadora, mas o FB quase me fez tremer nas bases. Fiquei achando que não entendia nada das gentes e da vida. Até a ficha cair… Sinistro, cara, muito sinistro!

    PS: devo te adicionar ou vc me adiciona? 😉

  4. E como a gente faz para “Compartilhar” esse texto? Vou ter que “copiar-colar” o link…

  5. Ctrl C, Ctrl V. Agora que está no FB, facilita pra gente e coloca aí o botão para compartilhar direto. 🙂

  6. Ah Rafa…escrevi um post dias desses sobre o comportamento do ser humano no Facebook e tem muito disso aí que você escreveu… 🙂

  7. Mas meu … é agora como era antes, exceto que tá mais escancarado.
    E mais, creio que é nóia minha, hoje em dia se esconde é mais nada mesmo: ninguém acredita que o cara é verdadeiro, ou a mulher é virtuosa, mesmo pq isso também já caiu em desuso.
    O político antes engava, mas não tanto assim, e todo mundo queria mesmo era a dentadura e o par de botinas, ou o que fosse.
    E hoje?
    Ah não … desde o primórdios, mudamos é nada, senão as tintas.

  8. É por isso que o nome é Facebook, e não soulbook ou heartbook… quem vê cara não vê mais nada. Ou vê.

  9. O face é uma passagem Rafa…assim como foi o icq, orkut e tantos outros…Já o comportamento humano, esse é estável. É uma reta! A tecnologia pode evoluir ou regredir, sempre teremos os mesmos defeitos e as mesmas qualidades. E quer saber…não é porque os seres que erram, erram, que eu posso dizer que são de todo mentira. Assim como os que acertam, não posso dizer que são de todo verdade. Somos todos constantemente inconstantes e enquanto os segundos posteriores confirmam nossas verdades, nos julgamos no direito de julgar aquelas verdades que não conseguiram durar. É rezar para que a nossa também dure, senão… Ou então fazer como o ditado esperto. “Boca fechada não entra mosquito”.

Leave a Reply to Gustavo de Santana Cancel reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *