Disney e o passado

Um site magnífico para quem lembra das revistinhas Disney de eras passadas: o Vila Xurupita’s Brazilian Covers apresenta todas as capas das revistas Disney publicadas no Brasil nesses pouco mais de 60 anos, de maneira bem simples e organizada.

Mas há outro ainda mais completo, o InDucks, um banco de dados abrangente com cada história incluída em cada revista Disney publicada em vários países, o que inclui o Brasil. É um trabalho hercúleo de documentação, e um tesouro de informação ao mesmo tempo pouco importante e inestimável. Pouco importante porque são só revistas em quadrinhos de algumas vidas atrás, útil apenas para sessões sem sentido de nostalgia; inestimável porque para muita gente que não tem medo de sessões sem sentido de nostalgia é um documento acurado de parte de suas vidas.

Deve ser o meu caso. De muitas dessas capas lembrei imediatamente. Algumas apenas sei que tive, pela época em que foram publicadas, embora não lembrasse delas. Mas lembro bem, por exemplo, dos números 1470 da Pato Donald e 1471 da Zé Carioca, quando as suas logomarca foram mudadas depois de 30 anos. Comprei a Mickey 340 e a 341, agora também com logomarca diferente. Foi lendo a Zé Carioca comemorativa de 20 anos da revista, em julho de 1981, que fiquei sabendo do torpedeamento do Lusitânia — infelizmente, só fui descobrir quando, e que diabos aquilo tinha significado, muitos anos depois. Li a Tio Patinhas 170, em 1979, e descobri a palavra “sarraceno”. Na Tio Patinhas de Ouro 2 ouvi falar de uns sujeitos na Pérsia — que já não existia àquela época — chamados dervixes.

Era o tempo em que as revistas traziam impresso um pequeno aviso na capa: “Manaus, Santarém, Boa Vista, Altamira, Macapá, Porto Velho, Rio Branco, Jiparaná (via aérea): Cr$ 00,00 – CÓD. 0051” — e isso significava, basicamente, um aumento de cerca de 30% no preço de capa. Era um Brasil diferente e a região Norte ficava mais longe. Tão longe que até hoje eu não sei onde fica Jiparaná.

O site avivou algumas lembranças antigas, mas também corrigiu outras. Sempre achei que a primeira Almanaque Disney que eu havia comprado tinha sido a 90; na verdade foi a 76, em setembro de 1977. Há muitos anos comecei um post neste blog dizendo que “Ainda lembro do dia em que comprei o meu primeiro Almanaque Disney. Foi em agosto de 1977.” Eu estava errado. Na verdade foi em setembro, e comprei porque, de brinde, vinham umas moedas douradas; crianças, macacos e corvos gostam de coisas que brilham. A confusão vem porque nesses meses eu morava num hotel em Salvador. Também achava que tinha comprado a “Anos de Ouro do Mickey” no final daquele ano, mas isso aconteceu dois anos depois — mas do local eu não esqueci: na banca do Renato, um sujeito que me lembrava o Emerson Fittipaldi, banca que fica ainda hoje no Largo da Barra.

Além disso, ver a palavra “Bingola” — um joguinho de tabuleiro com tampinhas de Coca-Cola, se não me engano — nas capas de várias revistas me lembrou que eu brinquei com isso, o que quer dizer que comprei, ou pelo menos li, outras revistas antes da tal Almanaque Disney 76. (Uma busca por “Bingola” mostrou que há por aí gente mais maluca do que eu, gente que guardou suas tampinhas até hoje. Ano passado um sujeito estava vendendo sua coleção por 1.500 reais no Mercado Livre.)

É impressionante que eu ainda consiga lembrar de capas de revistas que li mais de 30 anos atrás. É difícil saber se a minha fascinação por elas — e o valor que lhes dou — vem do seu valor real ou porque elas simplesmente fizeram parte de minha vida e de minha formação — ou seja, no final das contas essas revistas não eram tão boas assim, eu é que era suficientemente ignorante para julgá-las excelentes. Talvez seja uma mistura dos dois; reler as histórias publicadas nessa época mostra que, se minha memória afetiva talvez tenha aumentado sua importância, ao mesmo tempo elas são infinitamente superiores ao que se tem publicado da Disney ultimamente, com exceção das histórias de Don Rosa.

O melhor nessas revistas é que havia um universo variado de personagens e temáticas. Não eram apenas os personagens tradicionais de Disney, aqueles que até hoje vivem em Patópolis; mas havia uma variedade de elementos paralelos — as histórias das Aristogatas, de Banzé, Hawita e tantos outros, e quadrinizações dos filmes das Disney — que emprestavam àquelas revistas uma abrangência que outras não têm. Além disso havia uyma seção aparentemente retirada da série True-Life Adventures, com informações sobre o mundo animal, e os cartuns da Zoo Disney. Havia também um bom núcleo de histórias brasileiras, especialmente as do Zé Carioca e do 00-ZÉro.

E algo de que eu tinha esquecido: um bando de meninos e meninas maluquinhos, na faixa dos 8, 10 anos, que queriam se corresponder com outras crianças e davam seus endereços publicamente — algo impensável nos tempos paranóicos de hoje, em que a meninada não vai mais à esquina sozinha.

O site também acaba sendo uma crônica visual da decadência dos quadrinhos Disney no Brasil. Quem conhece as revistas feitas há 30, 40 anos lembra da impressão com cores sempre chapadas, os defeitos da colorização manual e das tecnologias de impressão disponíveis; lembra das variações de letras a cada história, também feitas à mão. De lá para cá houve imensos progressos técnicos. Tudo, da finalização à colorização e às letras, é feito no computador. As impressoras trazem cores mais ricas, com mais nuances tonais e mais controle sobre o resultado final. O tempo operou suas mudanças também na lingua, e hoje ela se apresenta mais coloquial.

No entanto basta uma olhadela superficial nas capas para ver que, paralemente ao avanço técnico, houve um retrocesso terrível no campo das idéias.

Cada capa trazia uma gag visual significativa, piadas simples e muitas vezes excelentes. A novas capas das revistas Disney, ao menos as poucas que ainda se sustentam, perderam isso. Ficaram mais parecidas com as revistas de super-heróis, puro lixo pouco criativo, artesanato que se faz sem pensar, e com vistas apenas a chamar a atenção do eventual comprador. As capas refletem um pouco a pobreza das histórias mais novas. A julgar pelo pouco que vejo aqui, a Disney não conseguiu se atualizar sem perder sua essência — algo que eventualmente conseguiu nos longa-metragens animados, como “A Bela e a Fera” e “Rei Leão”.

E há a questão do negócio em si.

Há 30 anos — e as capas de diversas revistas mensais e edições especiais comprovam isso — esse era um negócio excelente. Hoje, diante do tamanho do império de dívidas da Abril, não tenho essa certeza. No começo deste século, por exemplo, ela não teve problemas em se desfazer dos super-heróis da Marvel e, cerca de um ano depois, da DC. No entanto se apega às revistas Disney, mesmo que pareça não mais saber o que fazer com elas. Por uma matéria lida há uns dez anos na finada Gazeta Mercantil, parece que é por razões sentimentais: o Pato Donald foi a primeira revista publicada pela editora, em 1950, e sempre foi questão de honra para o fundador, Victor Civita. Isso torna ainda mais incompreensível e injustificável o trabalho porco que realizam com essas revistas. A única coisa decente que ainda publicam é uma tal de Disney Big — mais ou menos a mesma coisa que a antiga Disney Especial, mas sem o fio temático que era a marca daquelas revistas e cada vez mais limitado ao universo de Carl Barks. O resto é lixo mal editado — e é deprimente que, com mais de meio século de histórias, eles não consigam simplesmente escolher as melhores.

Mas isso interessa pouco. Passei horas procurando as revistas que ajudaram a me formar — aquelas do final dos anos 70, começo dos 80. E a cada reconhecimento, a cada “essa eu tive”, a criança que eu fui um dia ficou mais forte e, por alguns momentos, mais feliz.

E aí, Sergio Leo, o mundo acabou?

Ontem os senadores brasileiros aprovaram em primeiro turno uma Proposta de Emenda Constitucional que traz dos mortos a exigência de diploma de comunicação social para o exercício do jornalismo, derrubada há pouco mais de dois anos num daqueles raros momentos de sanidade do STF.

Em tempos d’antanho este blog defendeu o fim da exigência do diploma. Porque jornalismo não é profissão que precise oferecer uma defesa à sociedade na forma de diploma individual; porque a lei era uma intromissão desnecessária do Estado no que essencialmente é a sociedade falando consigo própria; e pelas próprias origens da nefanda, uma lei de ditadura concebida para controlar jornalistas.

Mas já há muito tempo, uns 20 anos pelo menos, essa discussão era desnecessária e anacrônica. Sua queda ou manutenção, na prática, significava coisa nenhuma. Novos jornalistas continuariam a ser necessariamente recrutados nos bancos das faculdades, simplesmente porque a oferta é grande demais e, de modo geral, recém-formados são mais qualificados que focas vindos de outras áreas. Não consta haver muita gente vindo de fora querendo ser jornalista. E há tantos estudantes implorando por uma primeira chance que a seleção já não é feita entre os que têm e os que não têm diploma, mas entre aqueles nas multidões de recém-formados que têm algum talento e estão dispostos a trabalhar por muito pouco em nome de uma primeira oportunidade.

Não foi a exigência do diploma que criou essa situação. Foi basicamente a evolução natural do mercado. Este é cada vez mais um mundo de especialistas superficiais, cujas origens estão nas crianças que, por várias razões, são obrigadas a fazer escolhas de vida fundamentais aos 17 anos de idade. É isso que gera o excedente de mão de obra que afasta os eventuais não-jornalistas das redações. E esse fenômeno que se vê no jornalismo também se repete em outras profissões, mesmo as que não exigem diploma, como a publicidade: é nas faculdades que são recrutados os estagiários de criação, mídia ou qualquer coisa assim, porque por pior que sejam — e, também generalizando, essa meninada parece vir cada vez pior, cada vez mais ignorante —, ainda assim têm uma formação específica melhor do que quem nunca fez um layout em toda a vida. Ou seja, não é necessário diploma para garantir esse tipo de evolução socioeconômica. O mercado já se encarregou disso faz um certo tempo.

Mas para o Sergio Leo, e tantos outros jornalistas, a queda do diploma parecia significar o maior golpe que a profissão poderia sofrer. Em seu momento mais empolgado, o Sergio invocou neste blog a maldade intrínseca dos patrões, que seriam a favor da queda do diploma para ter à sua disposição mão de obra farta e barata — como se “mão de obra farta e barata” não fosse quase sinônimo de “recém-formado”.

Pelos bons argumentos, e pelo fato de ser um excelente jornalista, o Sergio merecia ser ouvido. Poucas pessoas escrevem tão bem sobre relações internacionais, com tanta clareza. Pessoalmente acho que isso se deve ao seu imenso talento pessoal, e não exatamente à sua formação específica em jornalismo; mas não é isso que está em questão aqui. De qualquer forma, é justamente por esse respeito que pergunto: e aí, Sergio Leo? Dois anos depois, o mundo acabou? As redações foram infestadas por padeiros ávidos por assinar seu nome em uma matéria com chamada de capa? Estagiários no seu e nos outros grandes jornais do país — e nos pequenos, também — passaram a ser recrutados nas faculdades de matemática? Os donos de jornal utilizaram os milhões de pedreiros, garis, advogados, médicos e guardas de trânsito que agora podem ser jornalistas para chantagear a classe por salários mais baixos, quase de fome?

Mais que isso: o caos reinante nas redações justifica a volta dessa exigência estranha que nos levaria de volta à companhia de bastiões da imprensa de qualidade como Congo, Costa do Marfim e Honduras — embora agora de maneira democrática, como deve ser?

***

Nos dias seguintes à derrubada do diploma, eu e muitos outros servimos como destinatários involuntários de grandes desabafos de jornalistas indignados com o que consideravam ataque à sua profissão.

Jornalistas de todo o país se manifestaram e apontaram o início do apocalipse, o fim da profissão, o desrespeito absoluto à catiguria, essas coisas. Jornalistas se revoltaram ao serem, como quiseram fazer parecer, comparados a cozinheiros — por sinal um episódio típico do modus operandi de certo segmento da imprensa brasileira, não apenas pelo elitismo e bacharelismo que parece fazê-los pensar que uma profissão é mais importante do que outra, mas pela má-fé demonstrada ao destacar uma frase de seu contexto e fazer o mais baixo sensacionalismo a partir dela.

No final das contas, a mobilização vazia de jornalistas no pós-queda acabou sendo uma prova de miopia e de incapacidade de ver o mundo como ele é — além, é claro, de prova da incapacidade da categoria de se organizar politicamente. E esse é o tipo de coisa que se pode cobrar deles mais de dois anos depois, especialmente às vésperas de uma volta ao antigo status quo.

Mas a pergunta a ser feita agora, na minha opinião, deveria ser outra: como alguém que se propõe a mostrar e explicar para mim o mundo em que vivo pode-se arrogar esse direito se não consegue sequer compreender fatos que lhe afetam diretamente? Com que moral um jornalista vai tentar interpretar um fato para mim se ele mesmo não consegue entender corretamente os sinais que o mundo lhe dá a cada novo dia? Ou, se entende — algo do que duvido, a julgar pelas manifestações vistas há dois anos —, não tem a honestidade necessária para me dizer como as coisas realmente são?

Talvez isso explique o nível geral da imprensa deste país. Não foram jornalistas sem nível universitário que perpetraram a cobertura desmoralizante das eleições do ano passado — o que por si só deveria desqualificar qualquer tentativa de justificativa do diploma como garantia ética, erro que tantos defensores da obrigatoriedade cometem. Agora, um ano depois, cabe também perguntar quem fez mais mal à profissão: Gilmar Mendes e sua alusão a padeiros ou o papel indigno que os principais jornais deste país desempenharam na cobertura da última campanha presidencial?

Eu tenho uma resposta para isso, e acho que ela está certa. No entanto, preferia estar errado. Preferia concordar com tantos jornalistas e achar que a queda do diploma iria destruir a profissão. Porque só a incompetência de gente aboletada na desculpa da falta de preparo teórico poderia explicar o que está acontecendo com a imprensa deste país.

De como deixei de lado as preocupações e aprendi a amar a opinião das massas

Como quase todo mundo, nunca gostei muito de consensos, de unanimidades; mas gostava menos ainda das opiniões da maioria; elas costumam ter a burrice das unanimidades e a falta de perspicácia da opinião minoritária, e aliam a isso uma arrogância bastante sentida por qualquer um que discorda.

Sempre achei, por exemplo, que um camelo é um cavalo criado por um comitê — é o tipo de coisa que ainda se diz em departamentos de criação de agências de publicidade, por exemplo. Mas deixei de me preocupar e aprendi a amar a bomba, e é por isso que, ao ler este artigo no Wall Street Journal argumentando que críticos profissionais de literatura ainda são fundamentais, eu torci o nariz.

Há um ou dois anos comprei Empire of the Summer Moon: Quanah Parker and the Rise and Fall of the Comanches; atendia a um fascínio antigo pela formação do Velho Oeste americano, uma curiosidade também antiga sobre os comanches — povo transformado como nenhum outro pela chegada de uma nova tecnologia, o cavalo — e a uma recomendação entusiasmada do New York Times ou do Wall Street Journal, não sei bem. Fui na Amazon e comprei, ponto. Nunca olhava aquelas críticas de leitores. Confiava mais na opinião de críticos profissionais.

Em alguns momentos da leitura deu vontade de jogar o livro na parede. Uns erros bobos — o autor diz que os comanches foram os únicos a desenvolver a criação de cavalos, esquecendo, por exemplo, dos Nez Perce que criaram o appaloosa, e os navajos e apaches eram grande cavaleiros, também –, uso excessivo de hipérboles, eventual falta de contextualização (ele se refere à baixa taxa de natalidade dos comanches, mas populações nômades obrigatoriamente têm taxas de natalidade muito baixas). Mas o que realmente irritava era uma linguagem que até para gente que, como eu, tem pavor ao politicamente correto, eventualmente soava incômoda. As referências aos “selvagens”; e, principalmente, trechos que eventualmente pareciam ser uma tomada de posição ostensiva demais ao lado dos colonos brancos.

Não me arrependi de ter comprado o livro. Acho inclusive que a linguagem utilizada ajuda a ter uma idéia clara do que o choque de civilizações representou, e provavelmente foi utilizada para se apropriar do espírito da época. Mas isso me despertou uma certa curiosidade e fui ler as resenhas na Amazon. E percebi que se as tivesse lido antes, poderia ter uma idéia melhor do que me esperava; poderia inclusive julgar se esse era o melhor livro para os meus propósitos.

Uma parte dos leitores reclamava que o livro não era suficientemente politicamente correto, não mostrava os índios como heróis impolutos. O que para eles era defeito para mim é qualidade. Não me sinto à vontade com a maior parte das queixas modernas sobre o tratamento aos índios americanos entre os séculos XVI e XVIII. Me incomodam muito os tratados não cumpridos pelos EUA, porque têm outro nível de complexidade política; mas as guerras de conquista para mim são compreensíveis no contexto do século XVI, por exemplo. Não justificáveis; mas compreensíveis. Os mesmos índios que perderam as guerras contra os brancos ganharam de outros índios; e ninguém reclama dos visigodos que destruíram Roma, por exemplo (sobre esse período recomendo um livro chamado Empires and Barbarians, de Peter Heather.). A visão do índio como inerentemente bom e superior ao europeu mercantilista — visão que parece ter se consolidado nos últimos 60 anos, pelo menos — me incomoda.

Outra parte elogiava profusamente, fazendo parecer que o livro era o que de melhor se fez sobre o assunto. Isso não deveria ser um defeito, mas era: significava que incomodou pouco algumas pessoas, que manteve intactos seus preconceitos e pressuposições. Além disso, por já conhecer o livro, eu sabia que ele estava longe de ser perfeito. Bom, especialmente para quem conhecia pouco a história dos comanches, mas não perfeito. Além disso, quem gosta muito de qualquer coisa normalmente não consegue fazer boas críticas. Paixão cega.

Mas uma grande parte elogiava o livro com ressalvas. E essas eram as críticas realmente úteis, e as que me fizeram entender que a opinião coletiva nem sempre é ruim. O conjunto de análises, os pontos individuais que várias delas levantam, acabam formando um panorama acurado do livro. Você pode tirar dali o que irá te incomodar ou não no livro; pode descobrir se ele tem o que você procura, ou não.

É por isso que eu, que já escrevi post descendo a lenha em coisas como o rottentomatoes, me rendi à opinião das massas. Aprendi como utilizá-las, na verdade, e meus preconceitos foram embora.

É muito simples: vejo primeiro o número de resenhas positivas e negativas. Se um livro tiver mais críticas negativas que positivas, ele certamente não presta, e procuro outra coisa para ler. Desconsidero também a maioria das críticas que dão cinco estrelas, são bobos deslumbrados; e evito as que dão uma, porque esses normalmente são idiotas confessos. Essas opiniões extremadas, no entanto, não são de todo inúteis, e vale a pena lê-las para ter uma idéia do que mais chama a atenção nas pessoas; No entanto, são as críticas de duas a quatro estrelas que fornecem uma compreensão maior e mais equilibrada do livro.

Isso não vale, claro, para obras de ficção. Casablanca não é genial porque, digamos, 80% dos usuários do rottentomatoes acha isso, mas porque eu acho. A obra de arte não pode e não deve se submeter a critérios de massa. Mas hoje em dia eu leio principalmente não-ficção, história e assemelhados em particular, e para isso o repositório de experiências individuais de sites como a Amazon ajuda a dar um bom norte.

E isso traz um novo problema: a decadência da imprensa cultural deste país. Não sei se por falta de preparo ou por interesses comerciais, ou se a própria forma da crítica na imprensa diária se diminuiu e vulgarizou em excesso; mas o fato é que está ficando cada vez mais difícil respeitar a opinião da imprensa, não só a do Brasil, mas a de todo o mundo. Não dá mais para saber o que é crítica incompetente ou desinteressada.

Por causa disso demorei alguns meses para comprar uma nova biografia de McCartney chamada Fab, de Howard Sounes. Havia ainda poucas críticas quando fiquei sabendo dele. Controlei o ímpeto inicial e esperei que as resenhas atingissem um número suficiente para dar um panorama mais completo do livro. Foi apenas quando vi os resenhistas darem uma estrela ao livro porque ele não era suficientemente respeitoso com um homem genial e maravilhoso e lindo e cheiroso como McCartney que me decidi a comprá-lo. Não me arrependi.

Dos tempos d’antanho

Descubro que sou de uma era já passada, em que as pessoas eram educadas para poupar as outras de seus problemas e da exposição desnecessária de suas vidas. Que as vidas das pessoas não precisavam — na verdade, não deviam — ser um livro aberto. E no entanto vivo em um tempo em que a exposição pessoal parece ser a regra. Em que as pessoas ficam famosas por ter vídeos de suas aventuras de alcova publicados na internet, ou por exibir peitos siliconados na TV, nada mais que isso. Não é um mundo que me agrade particularmente — embora eu me veja forçado a confessar que a visão de peitos não me é desagradável, siliconados ou não, firmes ou flácidos. Mas isso não importa, que o que me agrada ou desagrada não é importante e não interessa a ninguém. O problema está no fato de que este não é um mundo que eu entenda, e à medida que vou chegando à meia-idade, ele me espanta mais e menos ao mesmo tempo. Eu sou velho.

Os anos perdidos de Elvis

Um artigo falando de um livro recente sobre Elvis Presley me chamou a atenção porque o livro parece uma grande bobagem. A sua premissa é a seguinte:

Elvis became a rock-n-roll icon in 1958, but his service in the Army put his career on hold. Upon his return, he got sidelined back into the musical-movie business with less than awesome accolades. His music was still popular, (he was still considered “The King”,) but the move took him in a direction that castrated his creativity; and this kept him isolated from the true impact of the changes going on in popular music, i.e., the British invasion–headlined by the Beatles.

Há aí um erro factual: Elvis se tornou um ícone pop dois anos antes, com o lançamento de Heartbreak Hotel. Mas o problema é que a premissa do livro é incompleta, quase falsa. Não parece compreender os movimentos de Elvis, nem inseri-los em seu contexto. Por isso define os anos 60 como uma espécie de gap na carreira de Elvis, que aparentemente era boa antes e voltou a ser boa depois. E isso não é verdade.

Ao contrário de outros nomes do rock, cujas ações muitas vezes criaram modelos a serem seguidos pelos que viriam depois, Elvis só pode ser entendido em seu próprio tempo. É um equívoco tentar julgá-lo pelos padrões que a cultura pop estabeleceu nos anos 60 e que, com mudanças aqui e ali, continuam válidos até hoje. A explosão de criatividade e experiências musicais que caracterizaram a música pop nos anos 60 em todo mundo — a Tropicália, por exemplo, não faria sentido em outros tempos, e não seria possível sem Chuck Berry ou o próprio Elvis 10 anos antes — mudaram o papel do artista dentro da indústria musical. Deram autonomia criativa aos músicos e estabeleceram o padrão a ser seguido: o de Bob Dylan e Lennon/McCartney, artistas autônomos, compositores e intérpretes, sempre com algum tipo de posicionamento político em relação ao mundo, e desempenhando melhor ou pior o papel de catalisadores das aspirações de uma geração.

Mas Elvis é de uma geração anterior. Era basicamente um tabaréu do Tennessee, um caipira cujas referências estavam no que havia de mais conservador na sociedade americana.

A partir do momento em que se leva isso em consideração, é fácil perceber que suas ações faziam todo o sentido e sua carreira, afinal, foi razoavelmente bem administrada. Tudo o que ele fez depois que estourou como ídolo adolescente — servir o Exército, migrar para o cinema, voltar à música como uma espécie de mela-calcinhas para velhotas dispostas a assistir aos shows em Las Vegas — foi parte de uma estratégia simples, consciente e, dentro dos seus horizontes limitados, sensata de posicionamento comercial.

Nos anos 50 a adolescência ainda estava sendo inventada. E do ponto de vista comercial fazia todo o sentido para Elvis se posicionar como um bom moço de família, um all-american boy com um verniz muito fino de rebeldia, o suficiente apenas para realçar o sabor. Artistas populares costumavam — ainda costumam — vir com prazo de validade; e mais que isso, em 1959 todos viam o rock and roll definhar aceleradamente. Segundo as regras do showbiz, essas mudanças em sua imagem ampliariam seu alcance e o fariam alcançar novos públicos. Principalmente, evitariam que se tornasse mais um entre tantos ídolos adolescentes que apareciam e sumiam na semana seguinte. Elvis queria a permanência. E sem os compromissos estéticos que a geração seguinte assumiria, esse era o caminho natural. Ele certamente nunca teve nenhuma aspiração a ser um John Lennon ou um Jim Morrison: seu modelo certamente estava mais para Bing Crosby — e, se não me engano, Mario Lanza era um dos seus ídolos. Em um tempo em que ele, o maior nome da música jovem, se apresentava em tablados de feiras agropecuárias estaduais, disputando espaço com a melhor torta de maçã ou a maior abóbora ou o porco mais gordo, buscar estabilidade no establishment da indústria de entretenimento americana era algo lógico. Por isso, de volta aos Estados Unidos, Elvis redefiniu prioridades e investiu em sua carreira cinematográfica.

Se o livro realmente se refere a esse momento como um ponto baixo, simplesmente não entende sua carreira nem a construção do seu mito. Porque foi no cinema que Elvis solidificou todas as condições para ser um ícone americano, acima de quaisquer considerações artísticas ou musicais.

Entre 1956 e 1969 Elvis Presley estrelou 31 filmes, e durante os anos 60 foi o ator mais bem pago de Hollywood. Eram dois, três filmes por ano. Do ponto de vista artístico ele tem pelo menos um ponto em comum com Pasolini: seus filmes em preto e branco, como King Creole e Love Me Tender, são os únicos que prestam. Se nenhum deles era exatamente um clássico, eram ao menos cinema. Utilizavam de maneira apropriada a imagem de Elvis e construíam uma narrativa a partir daí.

O que se seguiu era muito pior. Elvis era um ator abaixo do medíocre, e seus filmes — com algumas poucas exceções, como Flaming Star, dirigido por Don Siegel — estavam no seu nível. Eram simples e esquemáticos, servindo apenas como veículos para sua imagem já domesticada. Iam longe os tempo de The Pelvis: em cada filme ele usualmente cantava duas ou três músicas horrorosas, enquanto se via às voltas com moças do século retrasado (sempre brancas e preferencialmente louras, mesmo nos seus filmes no Havaí) e se distanciava cada vez mais da cultura que tinha ajudado a criar.

Essa distância está clara em um filme de 1967, Easy Come, Easy Go, onde Elvis se depara com um grupo de hipsters praticando ioga e debocha deles. É irônico, porque tudo aquilo, em parte, é cria sua, e deriva do seu papel na consolidação de uma nova cultura, na ponte entre a música branca e a negra que ele criou. No entanto Elvis foi um pai desnaturado: isso nunca lhe interessou, essa geração não lhe dizia nada. Elvis mirou no público que considerava mais lucrativo e sólido: o americano médio do interior, o tabaréu reacionário do corn belt. Daí tantos filmes em que ele é um caipira, ou soldado, ou qualquer coisa que apele a esse segmento. De certa forma, era a coisa mais honesta que ele podia fazer.

Em 1968/1969, no entanto, ele abandonou o cinema e voltou à música. Não foi à toa. Sua carreira no cinema estava desgastada, ele já não tinha o mesmo apelo de público. Elvis tinha envelhecido; o mundo tinha corrido muito mais rápido do que ele era capaz. Por isso o especial de TV Elvis, mais conhecido como ‘68 Comeback Special.

É engraçado que críticos se refiram ao programa dizendo que “aqui ele volta às raízes”, “aqui ele volta a tocar com Scotty Moore”, quando nada disso importa. O especial não é uma volta nostálgica ao passado: ao contrário, nesse programa um Elvis completamente vestido de branco, com direito a sapato tipo Jacinto Figueira Júnior e jaquetão tipo José Sarney (iam longe os tempos do paletó de lamê dourado) aponta para o futuro. É ao cantar If I Can Dream, com toda a canastrice de um crooner da mais reles banda de baile, que Elvis redefine sua carreira e se reposiciona como cantor, brigando por público não com os Doors ou Jimi Hendrix, mas com Frank Sinatra, Paul Anka e Neil Sedaka. O especial representou para Elvis o que o Festival de San Remo representou para Roberto Carlos: a guinada na carreira rumo ao romantismo mais deslavado. E aquela foi, também, a última vez que ele tocou com Scotty.

Fãs de Elvis apontam para o fato de ele ter conseguido se reinventar ali. Estão certos, mas esquecem um detalhe: em sua reinvenção, Elvis abandonou qualquer aspiração a alguma importância musical real. Paradoxalmente, agiu com uma humildade impressionante, porque àquela altura, já um ícone da cultura pop americana, ele poderia insistir em voltar ao caminho que o consagrou, se contentando, como Chuck Berry, Jerry Lee ou Little Richard, em reprisar seus sucessos nos palcos e ganhar a vida dessa forma (eu, pelo menos, não consideraria justo esperar outra alternativa: que Elvis, em uma das épocas mais criativas da música popular em toda a história, tentasse ir além no rock and roll). Mas ele era um matuto do interior, não entendia e não queria entender essa história de contracultura. Seu coração apontava para Nixon e para as platéias patéticas de Las Vegas. E, do seu ponto de vista, ele estava certo.

Cigarros, religiões e o mal que eles fazem

Ao contrário do que o Bia disse nos comentários ao post anterior, não é uma questão de discutir se ateus são mais ou menos tolerantes — eu acho que são, pelo menos por enquanto, mas isso não importa aqui. A questão é o teor classista no texto mencionado no post anterior e no que eu considero ser parte bem significativa da abordagem da classe média em relação aos evangélicos.

O Bia disse que os católicos não são tão intrusivos, “ficam lá na igreja deles”. Isso não é totalmente verdade, e me lembrou aquele branco que diz não existir racismo no Brasil porque pretos podem ir para a escola pública como qualquer branco.

Se a Igreja Católica não parece tão intrusiva é por algumas razões. A primeira é que a gente simplesmente não percebe, porque já faz parte do nosso cotidiano. A segunda é porque ela não precisa. Por exemplo, não precisa criar seu próprio canal de televisão (embora faça isso), porque na maior de todas ela exibe a Santa Missa em Seu Lar há décadas. (Alguém já percebeu que se fala muito do bisonho “Fala Que Eu Te Escuto”, mas ninguém questiona uma aberração como a missa televisada?) Além disso, nenhum meio de comunicação de porte tem coragem de se posicionar claramente contra os valores que ela prega, bons ou ruins. Jornais, rádios — essas mídias não precisam pertencer à ICAR nem vender espaços a ela para lhe dar voz.

Mais que qualquer coisa, no entanto, a Igreja Católica se beneficia de um certo tipo de inércia característico de quem exerce poder há tempo demais.

Os filhos de quantos ateus são batizados na boa e velha Santa Madre Igreja, apenas porque não faz diferença para eles atender a esse desejo do pai ou da mãe ou dos avós? Quantos ateus são padrinhos de crianças, e fazem isso apenas porque gostam de seus pais e querem fazer parte dessa homenagem mútua?

Em tudo isso, são os valores católicos que estão em questão. E sua presença é tão grande que não conseguimos mais ver. A Igreja Católica não precisa ser tão obviamente intrusiva porque seus valores estão tão entranhados na sociedade brasileira que isso seria redundante.

Isso não quer dizer que não seja ativa. E incomoda ver as pessoas continuarem a insistir nessa falsa dicotomia: igreja evangélica ruim, igreja católica boazinha. É essa insistência em ver o diabo nas igrejas evangélicas e os anjinhos na Igreja Católica (e olha que nem mesmo estou falando de padres gulosos e bispos coniventes) que na minha opinião denota o viés classista presente em determinado tipo de abordagem.

Alexandre, nos comentários:

(…) São pobres os eleitores da maioria do legislativo – por óbvio – já que vivemos num país de miseráveis. Há muitos “candidato dos pobres” muito embora todos – ou quase todos, incluindo os bispos – pertençam às elites. O que assusta, Rafael, é que a bancada evangélica está usando a influência e o dinheiro que possui para financiar uma política de retrocesso, de preconceito e de cunho evidentemente religioso. Nada além disso.

Eram pobres também os eleitores de Lula em 2006, e boa parte dos de Dilma em 2010. Mas pobre só vota certo quando vota com a gente. Já os ricos que votam em candidatos identificados com a Igreja Católica, bem, desses ninguém lembra. Ou, se lembra, eles são ruins não porque defendem o ideário da Igreja Católica, mas porque pertencem a partidos reacionários.

O Alexandre certamente não acompanha a influência católica sobre as bancadas parlamentares (os links incluídos no post anterior mostram padres fazendo política rasteira e reacionária em seus púlpitos, mas não parecem ser suficientes). Pois a Igreja Católica exerce muito mais poder sobre os parlamentos do que as bancadas evangélicas. Só recentemente as bancadas evangélicas passaram a ter poder. Mas o atraso não precisava delas: o divórcio civil só foi legalizado há pouco mais de 30 anos, o aborto não foi até hoje. As igrejas evangélicas apenas parecem mais conspícuas e conseguem mais propaganda — por interesses de classe ou comerciais, ou porque sua militância é mais ostensiva. E elas assustam a classe média.

E tem o exemplo do cigarro.

Ele foi usado para mostrar que não é exatamente o proselitismo que incomoda, porque eu sabia que alguém viria defender o antitabagismo ao mesmo tempo em que condenaria o antiateísmo ou anticatolicismo ou anti-qualquer coisa. Se é verdade que o Brasil está ficando menos cordial, a responsabilidade não é apenas dos evangélicos. Alexandre e Daniel acharam que o exemplo do cigarro não se aplicava, porque fumar é ruim. E assim demonstraram o básico: que ninguém se incomoda com pressão social, nem vê ameaças à cordialidade nacional, se são as suas idéias empurradas goela abaixo das outras pessoas.

Cigarro faz mal? Faz, claro. Mas religiões também fazem; a diferença é que cigarros fazem mal a indivíduos que fumam por escolha própria, enquanto religiões fazem mal a sociedades inteiras. A questão, no entanto, não é essa. Quando o Alexandre justificou a perseguição social sofrida pelos fumantes — e como ex-fumante eu sei bem do que estou falando — mas continuou a atacar as igrejas neopentecostais, justificou perfeitamente a escolha do exemplo, demonstrando que quando é a sua fé que está no ataque, ninguém se incomoda muito com essa tal de cordialidade. Ou seja: o evangélico não é cordial quando tenta me fazer abraçar a fé dele, algo que ele sinceramente acha que vai me fazer bem, por errado que esteja, porque certamente lhe fez; mas o anti-tabagista tem toda a razão do mundo quando tenta me proibir de fazer algo que afinal só prejudica a mim.

Tanto o Alexandre quanto o Daniel, imbuídos da ideologia de sua classe — cada vez mais laica, por sorte, e chata, por azar –, se apressaram a defender o bullying que fumantes sofrem, e que é basicamente o cerceamento ao exercício de um direito. Eles não entendem que, assim como para o ateu o militante evangélico é intrusivo, desagradável e burro, para o fumante o antitabagista materializa os mesmos adjetivos. E por isso, quando um certo setor da sociedade reclama do efeito deletério da falta de cordialidade do pobre evangélico que não sabe o seu lugar, mas não vê problemas na agressividade e intrusão dos militantes antitabagistas, definitivamente reflete, também, os valores de uma classe social.

Essa gente diferenciada e suas religiões nada cordiais

Em política costuma-se dizer que evangélicos podem eleger bancadas fortes nos parlamentos, mas não conseguem chegar ao executivo; porque ainda são minoria, e porque na hora H o resto da sociedade — católica, atéia, xintoísta — se une contra eles. Marcelo Crivella deve ter algo a dizer sobre isso.

Lembro disso porque me incomoda ver alguém falando em “vida dura de ateus”, como neste texto da Eliane Brum republicado pelo Milton há alguns dias. Alguém — não lembro quem nem onde, infelizmente; mas um comentário do Matheus Lopes a esse post no Milton diz basicamente a mesma coisa, e este post do Gravataí Merengue deixa tudo mais claro — já disse que nunca viu um ateu ser perseguido ou espancado por ser ateu. Eu também não vi. Ateus não andam por aí com estrelas amarelas pregadas na roupa. Além disso, ateísmo é praticamente a outra religião da classe média brasileira, muitas vezes disfarçado sob agnosticismo.

Eu gostaria apenas que todas as mulheres que apanham de seus maridos e não podem fazer nada por causa de suas famílias, os negros que nascem pobres e estão condenados a morrerem pobres, e os homossexuais que apanham e morrem apenas porque algum enrustido tem medo do reflexo de si próprio que vê neles tivessem uma vida igualmente dura. Quem entrou na justiça contra o direito de alguém ser ateu, assim como entram contra as cotas, sociais ou raciais? Quantos ateus andam apanhando de uma hipotética Brigada São Tomás de Torquemada, como gays em todo o país estão apanhando?

Isso é mimimi de classe média que está desacostumada ao contraditório, ainda que medíocre, porque ficou fácil defender as idéias de sempre.

Esse, no entanto, não é o ponto principal. O que me impressionou de verdade no texto da Eliane Brum foi o quanto há de preconceito de classe nele. Porque o problema com os evangélicos não é propriamente religioso. É social. O crescimento dos evangélicos assusta em grande parte porque representa a ascensão das classes mais baixas, e cada vez mais o desconforto da antiga classe média é impressionante. Aquela gente feia e brega ocupando sua poltrona nos aviões, lotando os shoppings no dia posterior ao pagamento, causando com seus carros — ônibus não devia ser suficiente para eles? — congestionamentos cada vez maiores; tudo isso tem gerado na velha classe média uma sensação de desconforto e de insatisfação que muitas vezes parece não ter causa definida.

A impressão que o texto me deixou foi essa, a de que o neopentecostalismo incomoda mesmo porque é a religião pouco sofisticada de gente diferenciada, que agora resolve se sentir superior à classe média.

Afinal de contas, a vida naquele táxi foi dura por quê? Porque o sujeito tentou fazer proselitismo? Porque ele demonstrou ter uma certa “pena” por ela ser atéia? — a “superioridade” que ela percebeu em sua atitude a incomodou o bastante para ser notada no texto.

Ele não bateu na jornalista, não a xingou, não a obrigou a fazer nada. Riu. Discutiu, expôs suas idéias, por pobres que sejam. Pelo que li, também posso dizer que o taxista foi respeitoso. Tentou ser simpático e a convidou para se juntar a ele na tal Igreja. Grande parte do que a jornalista inferiu (“O taxista estava confuso. A passageira era ateia, mas parecia do bem. Era tranquila, doce e divertida”) exsuda um paternalismo e um senso de superioridade tão grandes (além do fato de que elogio em boca própria é sempre estranho) que é difícil não ver, nisso, o mais básico preconceito de classe. É quase como se o taxista, além de ser burro por ser evangélico, tivesse esquecido qual o seu lugar ao se achar melhor que uma atéia de classe média.

Crenças, quaisquer que sejam elas, fazem isso com as pessoas. Evangélicos no entanto não estão sozinhos nisso; ateus também costumam se sentir superiores aos pobres supersticiosos que ainda acreditam numa noção de sobrenatural criada na pré-história, assim como uma certa elite cultural se julga superior a quem gosta de Calypso — que por sua vez despreza essa elite que “não sabe se divertir”.

É aí que entra o viés de classe, talvez não percebido pela jornalista. Um preconceito que fica ainda mais claro quando ela fala na tolerância da Igreja Católica ao ateísmo.

Associar as igrejas evangélicas à intolerância enquanto livra a cara da ICAR só pode ser brincadeira. Primeiro, porque em vários campos as igrejas neopentecostais são mais tolerantes que a igreja do papa Bento — costumam ser mais liberais em termos de costumes, por exemplo, aceitando divórcios e uso de preservativos. Segundo, porque basta olhar para as últimas eleições para ver que essa tolerância católica (procure no YouTube por “Dilma e aborto) não tem absolutamente nada de proverbial.

Uma coisa deve ficar bem clara: ao contrário do que diz o texto, o catolicismo não mantém, nunca manteve relação de tolerância com o ateísmo; aliás, tudo o que essas igrejas neopentecostais fazem é copiar procedimentos de evangelização dos primeiros tempos do cristianismo. Quem mantém relação de tolerância são os católicos. Não porque são católicos, mas porque são de classe média, educados em um meio sociocultural naturalmente tolerante, a não ser quando se sente ameaçado pela classe C. Na verdade — e isso os ateus que reclamam de perseguição costumam esquecer — toleram o ateísmo muito mais do que toleram outras religiões associadas às classes mais baixas, como o candomblé e, agora, o protestantismo. Ateísmo é religião de rico, que pode pensar e chegar a conclusões racionais, e essas coisas de rico são vistas com bons olhos pela classe média.

A condescendência com a Igreja Católica, clara no texto, é um dos grandes sintomas desse preconceito de classe disfarçado. Ela não incomoda porque, afinal de contas, faz parte do status quo. Não importa o quanto combata o direito ao aborto, o uso de camisinha, não importa que faça campanha para candidatos de direita — ela é tolerante porque é a religião de uma classe média pouco religiosa, e por isso não representa mal nenhum; afinal, essa classe média pode fazer aborto quando quiser.

Em vez de se alarmar com a “inevitável” destruição do brazilian way of life por essa horda de pobres evangélicos e evangelizadores, essa classe média iluminada devia se perguntar por que, afinal, as igrejas neopentecostais têm crescido tanto. Que respostas elas oferecem ao povo. O fato é que essas igrejas melhoram de verdade a vida dos seus fiéis. Não por causa de uma eventual noção de Deus, mas por causa do apoio de grupo que podem dar em um tempo de desagregação social. Talvez elas devolvam ao indivíduo um senso de propósito e senso de tribo, algo cada vez mais raro na sociedade da informação. Não sei. O que sei é que como antes se reclamava dos pretos macumbeiros, dos ebós no meio das encruzilhadas, e como os franceses hoje reclamam dos muçulmanos com suas burcas e véus, a classe média brasileira se apavora com o crescimento dessa religião de gente diferenciada.

***

Se em vez de ateísmo o tema em questão fosse tabagismo, por exemplo, o diálogo seria bem parecido:

– Esse cigarro no seu bolso… Você fuma?
– Fumo.
– Deus me livre! Para de fumar.
– Não, eu não quero. Eu gosto de fumar.
– Deus me livre!
– Engraçado isso. Eu respeito a sua escolha, mas você não respeita a minha.
– (riso nervoso).
– Eu sou uma pessoa decente, honesta, trato as pessoas com respeito, trabalho duro e tento fazer a minha parte para o mundo ser um lugar melhor. Por que eu seria pior por gostar de fumar?
– Porque cigarro mata.
– E daí?
– A gente precisa viver com qualidade de vida. Se você não parar de fumar, não vai ter qualidade de vida.
– Mas eu não quero isso, eu quero fumar.
– Deus me livre!
– Eu não acredito nisso de qualidade de vida, porque qualidade de vida significa ficar contente como fico ao acender um cigarro. Acredito em viver cada dia da melhor forma possível.
– Acho que você é maratonista.
– Não, já disse a você. Sou fumante.
– É que o câncer não te pegou ainda. Mas ele vai pegar.
– Olha, sinceramente, acho difícil que o câncer vá me pegar. É mais fácil o enfisema. Mas sabe o que acho curioso? Que eu não queira fazer você fumar, mas você queira acabar com o meu direito de fumar. Não acho que você seja pior do que eu por ser anti-tabagista, mas você parece achar que é melhor do que eu porque não fuma. Não era Jesus que pregava a tolerância?
– É, talvez seja melhor a gente mudar de assunto…

Milhares de fumantes em todo o país ouvem isso todos os dias. Nem por isso saem por aí dizendo que “o anti-tabagismo está destruindo a cordialidade brasileira”.

As alegrias que o Google me dá (XLIV)

macumba para fazer uma virar prostituta
Vou completar a sua frase e achar que o despacho é para uma mulher virar prostituta, porque não me parece que você tenha algum interesse em fazer uma lhama vender o corpo. Vou além: acho que a mulher é aquela que seu marido está comendo, em vez de comparecer em casa. E aí me pergunto: você não pode ser tão burra assim. Eu não acredito. Porque se a moça cair na vida, e passar a caprichar, aí é que o bobão do seu marido não volta mesmo para casa.

trabalhinhos de adolescente de 31 anos
Tem assim, ó, na APAE.

trabalhinhos evangelicos
Tem assim, ó, na APAE.

gueis asima 18 anos
Agora você me deixou numa situação complicada. Vem cá: para não correr o risco de ser taxado de homofóbico, e levando em consideração o seu respeito admirável à idade mínima legal para fazer saliência, posso pelo menos debochar do seu português? Eu sei, é recurso de última, mas vi a frase e queria brincar com ela, e já encheu saco associar “guei” ao Biajoni — eu não tenho mais piada para fazer com o Bia —, e se eu fizer piada de bicha vão cair matando em cima de mim que os tempos de Costinha já vão longe e o próprio Costinha já vai longe, e aí me resta dizer porra, acima é com C.

fotos de mulheres com clitoris bem dotados
Infelizmente não sei onde conseguir. Mas algo me diz que se eu arranjar fotos de travestis mal dotados vai dar no mesmo para você, né?

elvis presley usava preservativos?
Não faço idéia. O que eu sei é que quando viu a filha casar com Michael Jackson, enquanto rolava em sua tumba em Graceland ele se arrependeu de não ter usado naquele fatídico dia.

tomei plasil na veia e vi a morte
Mas viu de longe, né? Tanto que ficou aí para contar sua história. E a gente cá fica pensando: nem para ela chegar perto e te levar. Você e o Peter Fonda viram a morte, e se tornaram chatos por causa disso. Mas o Fonda quase morreu de tiro, e você quase morreu de Plasil. Morrer por causa de Plasil é humilhante, eu não contaria para ninguém se acontecesse comigo — a não ser que morresse de cocaína como aquela cantora, e então o Plasil seria uma desculpa válida. Talvez tenha sido por isso que o Fonda ganhou uma música de John Lennon e você ganhou umas linhas cá neste bloguinho vagabundo.

e sina aumenta o pesnes com as mâe
Desculpe, mas complexo de Édipo não é sina, é problema psicológico. Talvez agravado pelo fato de você ter um pintinho tão pequenininho. Seu caso é grave.

exodus e diminuição da libido
Claro que diminui. O filme é um porre. O livro deve ser pior ainda. Não tem circuncisão que aguente um treco daqueles.

arvores barriguda estranhas
Foi o pau-rosa, aquele safado, não foi? Mas tudo bem. Casa amanhã.

porque algumas pessoas são a favor do porte de armas?
Porque algumas pessoas, como você, despertam umas vontades estranhas nas gentes.

efebos pagando boquete
O moço aí quer ser Sócrates, pelo visto. Sonha com a Grécia antiga. Para além dos grandes debates filosóficos e daquela bobagem de cavernas, ele quer mais. Ele quer efebos — efebos altos, fortes, gentis e glabros, um Alcibíades para chamar de seu, jogando aquela conversa de “só sei que nada sei, mas ai, meu gostoso”. E eu sempre disse que nessas faculdades de filosofia só dá viado.

tenho me sentido triste desanimada para tudo hipocondriaca achando que vou morrer com dor de cabeça e no corpo e enjoo o que pode ser
O dotô Rafael Galvão tem uma boa e uma má notícia para você. A boa: você não é hipocondríaca, pode respirar aliviada. A má: pelos seus sintomas, você não passa de amanhã.

todas musicas de rafael galvão
Meu talento musical só é maior que o talento para a matemática, mas vamos lá. “Dá Pra Mim, Gostosa”; “Se Cobrar Eu Não Pago”; “Chato, Eu?”, e o meu maior sucesso: “Não Dei Certo Na Vida, Aí Virei Blogueiro”. Fiz uma grande turnê por casas de boa reputação em Cabrobó, Santa Brígida, Uauá, Capim Grosso e Olho d’Água do Casado. Tive tudo o que um ídolo do rock poderia ter. Certo, minhas tietes eram velhinhas desdentadas — mas rapaz, que boquetes inesquecíveis. Então tive alguns problemas quando disse que éramos maiores que o Google. E aquilo me emputeceu tanto que deixei a música e fui ser gari.

exemplo rimas pobres
Das Dores morava lá no Pavão,
E só tinha vestido de chitão.
Pegava todo dia o mesmo busão,
Para limpar a casa do patrão.
Almoçava sempre no bandejão,
Comia com garfo mas preferia a mão,
Jogava na Sena mas sorte não tinha, não.
Morreu de esquistossomose — um baita buchão
E foi enterrada numa carneira sem identificação.

donaren retard para que serve
Sei não, mas pelo nome é o remédio que você pediu a Deus.

quem botou fogo em roma – galvão
Fui eu, não; foi a Neidinha. A Neidinha era um moço de Goiânia que foi tentar a vida na Itália. Botou peito e botou botox, e de repente todo mundo na bota só falava na nova travesti brasileira que estava tocando fogo em Roma. Ia gente de toda a Europa atrás da Neidinha — dizem que foi ela quem iniciou Ronaldo nas delícias do amor que não ousa dizer seu nome. Aqui no Brasil os despeitados diziam que ela estava na pior — aquilo era estar na pior? Mas Neidinha foi burra, porque se empolgou com o sucesso, achou que ia durar para sempre e cortou o pinto fora, e foi como se tivesse matado a galinha dos ovos de ouro (sem trocadilhos, por favor, que este é um blog de respeito), e então ninguém mais quis saber da Neidinha, oh, Neidinha. Hoje a Neidinha faz programa por quaisquer 10 euros na Via Ápia.

eu lirico é com hifem ou sem hifem
Não sei e não quero saber, porque qualquer pessoa que tenha algo a falar sobre o seu “eu lírico” não me interessa, e dela eu quero distância.

putas loucas a forder na holanda em toda a maneira chopando na piça e levar no cu ouvidos
O luso aí é um triste. Primeiro, por ser português — não tem aquela conversa de melancolia portuguesa? Segundo, por ser analfabeto e escrever “foder” com um R a mais e confundir a velha e boa felação com uma serpentina de chope — também velha e boa, mas ó, pá, tem hora para tudo. E terceiro por ter um pinto tão pequeno que cabe no ouvido de uma holandesa. Na boa: no lugar dele eu também seria um triste.

fotos de freiras depravadas peitos grandes
Finalmente achei, nas brenhas das taras do Google, um irmão em espírito. Uma alma gêmea com as mesmas altas aspirações estéticas. Ou, se preferir, outro doente frustrado como eu.

como fuder uma mina
Dá um tempo, paulista burro, que isso até as cobras do Butantã sabem.

fluoxetina e sertralina tiram o efeito dos anticoncepcionais?
Pelo amor de Deus, não diz uma coisa dessas. Nem em sonho. Porque se tirarem o resultado vai ser outras coisas como você.

porque a galinha não tem umbigo
Porque o umbigo impedia que ela atravessasse a rua.

simpatias para diminuir a vagina
Conheço nenhuma, não, senhora. Mas se ajudar, conte com a minha. Simpatia, claro.

porque os jacares e as galinhas nao tem umbigo e os homens e macacos tem ?
Jacaré tem umbigo, sim. Se duvida, chegue bem perto de um, vire-o de costas e verifique. Se não tiver, volte aqui que eu te pago uma cerveja.

as praias do sergipe são feias
São, mas sua mãe é mais.

como detectar um homem gigolô
Pelo sorriso no rosto e pelo orgulho altivo com que anda na rua.

tem efeito colateral misurar viagra com rivotril?
Não sei. Mas que vai ser muito engraçado ver você dormindo de pau duro, vai; e a moça vai rir tanto que vai estourar a tripa gaiteira, e vai embora porque ela se respeita, e aí para que você gastou o dinheiro do Viagra, mesmo?, era melhor ter comprado só o Rivotril e dormido para esquecer que você não tem mais jeito, é um caso perdido.

putas baratas no limao
Faz sentido. Comida a gente tempera com limão.

como escolher mandioca
Ora, sente em cima.

uma rimas com o nome rafaela
Tem essa menina, a Rafaela
De pele opaca, meio amarela
Quase morreu de erisipela
E também de febre amarela
Moça feia, mas singela
De cara redonda como uma panela
Para burra só falta a sela
E ainda por cima a desgraçada é banguela.

para uma mulher o que e fuder bem
É você parar de encher o saco com suas perguntas cretinas, desocupar a moita e deixar que ela arranje um homem que preste.

que ano os candangos saiu de brasilia o que aconteceu?
Foi aos poucos. De acordo com Niemeyer, os candangos perceberam que morar no Plano Piloto era muito desagradável, precisava de carro para qualquer coisa. Colocaram seus picuás na canga de um jegue e se mudaram para recantos aprazíveis como Samambaia e Ceilândia.

duas gostosas necessitadas dando o cuzinho pra um macaco
Você é doente. E acho que sabe disso. Mas devo reconhecer que sua imaginação, mesmo absolutamente psicótica, é capaz de imagens surreais.

exodo de prostitutas para holanda
Aqueles flamengos miseráveis. Já não basta terem invadido Recife, não basta fazerem todo pernambucano falar com orgulho idiota de Maurício de Nassau, não basta ferrarem nossa indústria açucareira, ainda por cima levam o que nos resta de melhor? Delenda Nederland, é o que eu digo. E devolvam as nossas putas que elas fazem uma falta danada.

existe algum tipo de preconceito semelhante atualmente no brasil justifique
Eu tenho preconceito contra você. E ele é autojustificável.

o que é uma mulher que fode muito
É outro nome para definir uma mulher feliz.

posso ter ficado bipolar por ter usado medicamento?
E a gente pensando que era o contrário, hein? Que coisa.

falta de concentração nó na boca do estômago vontade de chorar
Foi o seu contracheque que chegou, né? Eu entendo sua dor.

o que e classicos da literatura infanto juvenio
Não se preocupe, não são nada demais. São apenas mais alguns dos tantos e tantos e tantos livros que você não leu, a julgar pelo seu português.

fenomenos incomplienssivel
Porra, Cebolinha, para com isso! Eu já lhe expliquei o que é essa sua língua presa, e já disse que não tem jeito! Deixa de encher o saco!

boquete pecado?
É. E por isso você vai mesmo para o inferno. Agora cala a boca e continua a chupar, que o moço já está ficando impaciente.

video devaginas mais feias e fedidas do mundo fazendo sexo
Fedidas, tudo bem. Mas feias? Feias? Não quer procurar pelo Abominável Homem das Neves, não? Vai dar no mesmo.

quais sensações sem o somalium?
Semelhantes às sensações sem o Biafrum e sem o Etiopium: fastio. Esses remédios são uma bosta, tiram o apetite da gente.

simpatias para deixar um homem broxar na cama com amantes
Minha amiga, deixa eu te bater a real, se é que o João Bidu ainda não te ensinou o básico da vida: se o sujeito não broxa nem com você, imagina com carne mais nova, mais bonita e mais gostosa.

fazer cirurgia de hemorroidas particular qual o valor na santa casa de presidente prudente
É um absurdo. Custa o olho da cara. Mas se você for um menininho bonitinho, assim tipo cara de querubim, o padre vai se apiedar de você e vai custar só o olho do cu.

depois de um ano tomando antidepressivos meu marido me deixou
O que mostra que demorou, mas os remédios finalmente fizeram efeito e pelo menos a autoestima dele aumentou.

esposa parou tomar topiramato
E aí ela viu a desgraça com quem tinha se casado, e agora está lhe atazanando o juízo. Volta a dar o remédio dessa moça porque senão quem vai pirar é você.

meu marido toma somalium e dalmadorm É perigoso eu engravidar
Claro que é. Mas não pelos remédios que ele toma: o perigo é sair outra anta que nem você.

tomei rivotril as 8 horas da noite com que tempo posso tomar um cerveja
Qualquer hora. Nada vai impedir um cachaceiro como você de encher a lata.

quem dizia que uma boa idéia deve ser copiada
Eu.

como aumentar o volume do penis na calça
Durante anos este blog foi assolado por uma legião de maldotados querendo aumentar seus pequenos atributos de graça. Você, pelo visto, faz parte de uma nova geração, que já sabe que para a sua tragédia não tem jeito e se conforma com a mistificação. Eu não sei se te dou os parabéns ou não.

quando dilma pretende começar o trabalho sobre obolsa famila na cida de de duque de caxias
Tem que ser logo, né? Porque a coisa pelo visto está ficando preta, e se demorar mais um pouquinho você morre de fome.

ted o comedor de empregada ta com aids
Grandes merdas. Os sujeitos que comiam a Sandra Bréa e a Cláudia Magno também estão — se é que ainda estão vivos, porque elas já morreram, ó, faz tempo. E daí? Vai com teu preconceito de classe para a puta que o pariu, que domésticas aqui são encaradas com o respeito e a mão boba que merecem.

eu sou de virgem e só de imaginar me dá vertigem significado
Além da rima? Olha, entendo muito dessas coisas, não, mas sua vertigem é boa ou ruim? Porque se é boa você é uma moça normal. Se é ruim, você tem problemas e provavelmente vai continuar assim o resto da vida.

meu amante morreucomo eu gostava de trasar com ele
Que merda, né? Condenada a voltar a transar com seu marido. Triste, triste. Só isso justifica qualquer pacto de suicídio.

seu cabra safado
Ah, não. Você de novo? Me esquece. Já passou.

para que serve o furo do filtro de cigarros parliament
Para lembrar onde você vai tomar se continuar fumando. (Essa resposta bonitinha, hipócrita e absolutamente cretina, e que eu escrevi rindo da minha própria cara de pau, é só para compensar as grosserias que falei acima.)

lesbicas transado sadomarxguismo
Depois de anos fuçando o Awstats, finalmente descubro uma nova tara. Isso não é comum: é raro e merece ser comemorado. O sadomarxismo é uma variedade materialista dialética do velho e bom sado-masô. Implica em uma pessoa vestida de rica batendo e sodomizando outra vestida de pobre. Além disso, é indispensável que o masoquista esteja acorrentado a grilhões pesados. Outro detalhe sempre lembrado na ainda parca literatura sobre o assunto é que, em eventuais surubas sadomarxistas, os masôs devem ficar afastados uns dos outros, ou seja: não podem se unir em hipótese alguma. Isto posto, devo lembrar que existem ainda outras variações dessa condição. No sadotrotskismo o masoquista apanha, se afasta e fica xingando o sádico, que ao final lhe bate com uma picareta de borracha na cabeça. O sadoleninismo, por sua vez, é mais violento. Nele, o masoquista se veste de czar russo e diz: “Me chama de Nicolau II! Me chama de Nicolau II!” Mas ainda mais barra pesada é o sadostalinismo. É um sádico só fodendo milhões de masoquistas.

perguntar para o galvao
Não faça isso. Você não vai gostar da resposta.

Sobre Rafael Galvão

Quando este blog começou, eu morava no Rio. De lá para cá muita coisa rolou debaixo da ponte, e então eu vejo que sete anos se passaram. É tempo demais.

Comecei este blog por duas razões: dar minha opinião sobre o que quisesse e fazer dele um exercício, me desobrigando de escrever em “publicitês”, e porque na época eu tinha suficiente tempo livro para me divertir com isso.

Ele começou no Blogger.br, e se chamava Pensamentos Mal Passados e tinha um subtítulo: “Um pouco de nada, e nada de muito importante”. Pedi à Dani Parahyba que fizesse um template novo para mim, a partir de um layout que fiz, e finalmente o blog passou a ter a minha cara. A Dani mudou as cores e o resultado ficou melhor do que eu pretendia. Além disso, o blog passou a se chamar Rafael Galvão; o subtítulo sobreviveu mais algum tempo.

Em 2004, cansado do Blogger, comprei hospedagem e transferi o blog para o Movable Type, na época a melhor plataforma de blogs disponível. Além de RSS e outras bobagens, eu passei a fazer meus próprios templates. E cansava rápido dos layouts, e entre 2004 e 26 fiz uma infinidade deles. De alguns lembro bem, até hoje. O primeiro layout tentava aproveitar da melhor maneira possível as idéias do layout anterior, mas isso acabou logo.

Depois, com o tempo cada vez mais escasso, passei a simplesmente pegar templates prontos. Em 2008 o Movable Type se revelou incompatível com o meu servidor e eu mudei para o WordPress, o que acabou de vez com a possibilidade de eu mesmo fazer meus templates.

Praticamente todos os blogs que foram contemporâneos deste se foram para o paraíso dos blogs. Singrando, Escrúpulos Precários, XX Ama XY, Monicômio e NCC, Smart Shade of Blue, Homem Baile, o Tiro e Queda do Bia. Eu sinto falta deles. Tinham talento e leveza, coisas que foram ficando cada vez mais raras na blogoseira. Essa é a minha geração, uma geração que escrevia porque gostava e porque precisava — a ponto de ter cogitado se chamar Blogniks em 2005 –, e que tinha o descompromisso que, na minha opinião, é o que faz um blog. Nós não precisávamos ser lembrados que blog é conversação. Nós sabíamos disso.

E o blog foi mudando, se tornando mais auto-consciente. De uma enxurrada de posts diários (em agosto de 2003 foram 100 posts, a maioria bem curtos) ele passou a publicar um por dia, depois um a cada dois dias — e em todo o ano de 2009 foram 89. Os posts, de modo geral, foram se tornando cada vez mais longos.

Quase dois mil posts, quase 20 mil comentários, e um blog que, apesar de tudo, me dá orgulho. Porque a modéstia é uma moça que eu vi de longe muito tempo atrás, e eu acho que este blog teve alguns bons momentos. Não me envergonho da maioria dos textos, e de alguns eu gosto muito.

Foram tantos blogs que li e admirei nestes anos: o do Ina, o do Milton, o do Allan, os tantos do Marcos, o finado do Tiagón, tanta gente. E isso me lembra que apesar de não acreditar em internet, acabei fazendo grandes amigos a partir do blog. As longuíssimas conversas com o Alex e com a Tata (que eu ainda amo, e vou amar para sempre); a Carol, inesquecível, que me deu com seu marido uma tarde agradabilíssima em Notting Hill; a Viva e o Bruno numa noite inesquecível no Belmonte; a Raquel se perdendo em São Paulo comigo; a Malla que ainda me impressiona pela sua tranquilidade; o Doni na Cinelândia e no Picuí; o Ricardo no Ferreiro ou num boteco de Copacabana; o Idelber nos botecos de fim de noite ou me contando que “Uzbequistão bom, Tadjiquistão ruim” — ou algo assim; e o Bia, talvez o único que lê isto aqui desde o início. Eles provavelmente não sabem o que aprendi com eles. Talvez algum dia eu conte.

Mas a vida passa. Nesses sete anos tanta coisa aconteceu. Mudei de cidade, meu apartamento se incendiou e fiquei sem ter onde morar durante alguns meses, me mudei, me mudei de novo, me mudei mais uma vez e agora não quero mais sair da frente do rio, namorei mais do que é saudável, fiz um bocado de campanhas — algumas inesquecíveis, outras nem tanto –, fui diretor de marketing e secretário de comunicação de uma prefeitura, e diretor de marketing de um governo. Casei de novo, separei de novo. Minha filha, que era quase um bebê quando este blog começou, cresceu para se tornar uma das pessoas que mais admiro neste mundo.

E com tudo isso o tempo passou e escrever um blog deixou de ser tão divertido e sete anos é tempo demais para se escrever um blog e é por isso que este acaba aqui. Obrigado.