Por que os Beatles fizeram tanto sucesso?

Esta é uma das poucas questões filosóficas que tomam meu tempo. As outras seguem acima.

A minha teoria é bastante simples.

Em primeiro lugar, eles tinham uma dupla de compositores absolutamente fenomenal. Lennon e McCartney eram únicos. Compondo sozinhos (como Yesterday no caso de McCartney ou Strawberry Fields Forever, de Lennon) ou em dupla, eles enchiam cada disco de canções pop com o mais alto nível possível. A competitividade entre os dois faziam com que tentassem se superar constantemente.

A democracia dos Beatles foi um outro fator. Era simples: se qualquer um deles não gostasse de uma música, ela não via a luz do dia.

Eles nunca pararam de tentar inovar, nunca tentaram se ater ao “estilo beatle”. estavam sempre em busca de novas idéias, de novas formas de fazer sua música.

A banda era composta de grandes instrumentistas. McCartney é, certamente, o baixista mais influente da história da música pop, e certamente o mais revolucionário. Os guitarristas, se nao eram fenomenais, funcionavam bem dentro do conjunto da banda. E Ringo era também um dos melhores bateristas do rock and roll. Era uma banda perfeitamente entrosada, em que cada membro conhecia perfeitamente os outros.

E, principalmente, há a devoção absoluta à canção. Não há espaço para exibicionismo; eles fazem estritamente o que a música precisa. Por exemplo, McCartney é o mais melódico baixista de todos os tempos; mas se a música pedisse que ele ficasse fazendo tum-tum-tum no baixo, ele fazia. Quem toca baixo, e tenta tocar uma linha de algumas músicas dos Beatles em que o baixo tem proeminência, sabe o quanto é fácil cair no exagero, no over. A bateria de Ringo não tem os delírios de um John Bonham ou Keith Moon; mas hoje boa parte das músicas do Led Zeppelin ou do The Who soam datadas, enquanto a maioria dos Beatles permanece atual. O mesmo vale para Lennon e Harrison, bons instrumentistas mas que se encaixavam perfeitamente dentro da estrutura da banda.

Mais autistes savants

Quando morava em Fortaleza, havia uma agência que eu admirava e até invejava.

Ela fez alguns anúncios que considero brilhantes. Aliás, não só eu: esses anúncios foram premiados nacionalmente e entraram em short lists de vários festivais internacionais.

Só havia um consolo para mim, mesmo naquela época: seus anúncios podiam ser melhores que os da minha agência, que não tinha um bom diretor de arte; mas em mídia eletrônica eu os engolia. Enquanto estive aqui, nunca fizeram um comercial ou um spot de rádio melhores que os meus.

Bem, vi um anúncio deles hoje. E reforçou uma impressão que eu já tinha há algum tempo. É fácil fazer anúncios sem briefing definido, sem aquela obrigação obsessiva de vender um produto. Qualquer aluno de faculdade de comunicação faz dezenas deles. Mas quando se trata da realidade dura e cruel, quando o negócio é para ser levado a sério, a média deles é bem inferior à da minha ex-agência.

São mais ou menos como os autistes savants do post abaixo (mas estou me referindo a pesoas diferentes, aqui). E mesmo tanto tempo depois, isso me serve como um pequeno consolo.

Autistes Savants

Cada vez mais tenho certeza absoluta de que o que define um bom redator publicitário não é uma grande campanha, mas a habilidade de se sair bem de maneira regular e em coisas pequenas.

Ou seja, qualquer idiota pode fazer um grande anúncio. É só ter um insight, um estalo; e isso pode acontecer a qualquer um. Mas quando se trata de fazer aqueles anunciozinhos sem muito diferencial, de maneira constante, ah, aí é que se vê quem entende do babado e quem vê uma folha de papel em branco (ei, isso é do meu tempo; agora é “tela do computador em branco”) como um inimigo, e não como uma mulher que você tem que levar para a cama.

Lendo os jornais de Fortaleza, me bati com um anúncio cujo autor acho saber quem é.

Essa pessoa já criou um grande anúncio, brilhante, pertinente. Mas o que vejo agora não é só medíocre: é um total desrespeito ao briefing, ao bom texto, ao que se chama criatividade publicitária, que é pouco mais que criatividade aplicada aos interesses do cliente; somos todos uns “con men“, no melhor sentido possível. Essa pessoa simplesmente não sabe o que é criar e escrever um anúncio publicitário.

Não conheço nenhuma prova melhor de que os autistes savants realmente existem.

Robin Williams

Uma coisa terrível, que sempre acontece comigo, é não perceber o gênio e a beleza verdadeiros durante muito tempo. Por exemplo, só fui achar a Nicole Kidman a resposta de Deus a Jó muito tempo depois do resto do mundo.

E agora me aparece Robin Williams.

Nunca vi muito nele. Nunca o achei excessivamente engraçado. Concordei com Arnaldo Jabor quando o chamou de canastrão. Mas acabei de ver uma entrevista sua no programa “Inside Actor’s Studio”. Ele é simplesmente, absolutamente brilhante. É um gênio da comédia. É um gênio.

Acho que isso não é muito elogioso a meu respeito.

(Pausa.)

Passei alguns minutos tentando me redimir dessa falta de percepção, citando algum exemplo de gênio que percebi antes de todo mundo.

Não consegui.

À la Clinton

Neste exato momento, 6 milhões de pessoas estão fazendo sexo em todo o mundo.

Os outros 6 bilhões e esta pobre alma que vos escreve estão frustrados, imaginando por que o mundo é tão cruel.

Ou, para escrever de maneira mais lírica: neste exato momento 6 bilhões de pessoas em todo o mundo chupam o dedo. 6 milhões chupam outra coisa.

The show must go on

Aracaju não tem nada.

Mas já teve. Pouca gente sabe disso, mas até o final do ano passado o cinema mais antigo de todo o mundo em operação ficava em Aracaju. O Rio Branco era de 1904, se não me engano. Começou como teatro e acabou sendo convertido em cinema. Durante sua história foi o palco das principais “efemérides” culturais da capital de Sergipe. Pelo seu palco passou Procópio Ferreira, gente de ópera; imagine uma cidade pequena quando vê alguém vindo da metrópole e talvez se tenha uma idéia do que o Rio Branco significava.

E de repente, do dia para a noite, demoliram o Cine-Teatro Rio Branco.

É verdade que nas últimas décadas a vida tinha sido difícil para o Rio Branco. A partir de meados dos anos 80 ele tinha se transformado em cinema pornô; mas mesmo então ele teve alguns momentos de glória: em 88, acho, foi o cinema com maior público de todo o país.

Mesmo em sua decadência, o Rio Branco era a única coisa que a cidade tinha de decente; de resto Aracaju é um cu-de-mundo estagnado e atrasado. Mas, mesmo assim, a cidade, que dá aos seus símbolos culturais o valor de esterco, deixou que o Rio Branco fosse demolido. Era seu único bem cultural de valor, e foi abaixo sem que a maior parte do seu povo, mais acostumado a pré-carnavais, notasse. Alguns intelectuais, depois do fato, resolveram protestar — mas esses mesmos intelectuais não falaram nada quando os outros cinemas do centro da cidade foram sendo desativados, um a um. Tão burros que não perceberam que, se deixassem um cinema ir embora, os outros iriam também.

As coisas são curiosas. Aracaju, praticamente sem saber, tinha algo de classe mundial, e deixou que fosse ao chão. Enquanto isso, prefere gastar tempo e dinheiro promovendo anacronismos folclóricos mortalmente entediantes como reisados e maracatus e concursos de quadrilhas caricaturizadas e deturpadas.

É uma vergonha. Mas se você conhecesse Aracaju você entenderia.

For All

O Ceará tem um problema.

É impossível achar uma empregada doméstica.

Todas decidiram que eram cantoras e entraram numa banda de forró.

Se há uma razão para o Ceará ser execrado pelas gerações vindouras, é pela invenção dessa coisa bizarra que são as bandas de forró tipo Mastruz com Leite, Mel com Terra, Cu com Merda, Magníficos, Calcinha Preta e tantas outras que atentam contra uma das mais belas tradições brasileiras.

O forró, o baião são uma das mais interessantes tradições nordestinas. Luiz Gonzaga é um gênio absoluto; basta ouvir “Karolina com K” e “Sá Marica Parteira” para se perceber, imediatamente, que se está diante de um dos maiores cronistas do espírito nordestino, no que ele tem de maior. E mesmo intépretes menores, como Genival Lacerda, refletem aquela característica sacana e safada do nordestino, com o duplo sentido sempre presente, com aquela vontade de falar sacanagem. E os discos de Genival eram produzidos por Sivuca.

Mas essas bandas cearenses, e todas aquelas que seguiram a sua inspiração, são, em uma palavra, asquerosas. A música é podre, um pastiche que mistura um laivo de forró ao mais ignóbil brega. É música ruim pasteurizada ao extremo, com cantoras sem nenhuma qualificação e dançarinas saídas diretamente do puteiro mais próximo.

Nao dá para sentir um pouco de revolta ao ouvir o que fizeram da música nordestina. E isso é culpa do Ceará. Aqui se dança um forró esquisito — fazendo “treatro”, como diria Luiz Gonzaga. No resto do Nordeste forró é uma dança a ser dançada a dois, pertinho, agarradinho, com as coxas entrelaçadas; mas no Ceará os parceiros apenas tentam se exibir de todas as formas possíveis. E aí é um tal de jogar a mulher para cá, jogar para lá, e todos dão voltinhas e giram como piões sem rumo.

Um dia o resto do Nordeste ensina esses cabecinhas-chatas a dançarem forró de verdade.

Apressado come cru

Um amigo lammer comprou um GPS há alguns anos.

Como sempre acontece nesses casos, ele logo inventou necessidades para ter o GPS. Eu achei coisa de geek que quer comprar todo e qualquer gadget que aparece à sua frente. Disse que só compraria um quando o GPS e o Palm se fundissem em um só. Afinal, o GPS só lhe dá suas coordenadas geográficas, o que para uma anta espacial como eu não significa muita coisa. E sabia que esssa fusão aconteceria em poucos anos.

O novo iQue é o primeiro resultado dessa convergência.

Sacanagem

Laurinha, minha única leitora — além de mim mesmo — está precisando assinar outro canal de sacanagem.

Não que nu frontal masculino faça falta a alguém. Aliás, por mais que eu tente, ainda não consegui entender como é que alguém, tendo a oportunidade de ver a Tish Ambrose (uma estrela efêmera do cinema de putaria dos anos 80, absurdamente fenomenal) vai ficar prestando atenção ao John Holmes.