Post redundante sobre a decadência da Veja

Falar mal da Veja está se tornando mais redundante do que comentar a decadência e a chatice de Jô Soares. Mas não cansa.

A edição desta semana traz chamada de capa para uma entrevista com Rosane Collor, que se ergueu da tumba do olvido. A entrevista passa a impressão um tanto forte demais de não ser mais que uma tentativa de tirar algum dinheiro do ex-marido — ex-mulheres de políticos com trajetórias duvidosas sabem que têm em sua memória um bom capital de giro. Nada novo nisso; incompreensível é a razão por que a maior revista nacional em circulação se rebaixou a esse ponto, já que se o presidente do impeachment não é notícia há muito tempo, menos ainda sua ex-mulher, de triste memória em sua passagem pela LBA. A entrevista sequer diz algo novo, com exceção da confirmação das sessões de macumba a que o presidente ia. A revista, esquecendo o que ela mesma noticiava há 16 anos, até aceita sem perguntas a versão de Rosane sobre seu suposto caso extra-conjugal.

A entrevista de Rosane Collor é apenas um sintoma da decadência da revista. Mas não é o mais importante. O buraco é bem mais embaixo.

Em 100 anos de regime republicano, as Forças Armadas foram os fiadores da elite brasileira. Graças a essa simbiose, a estabilidade institucional brasileira foi inviabilizada por uma longa seqüência de golpes e contra-golpes, respostas a ameaças externas a essa elite, como a Intentona Comunista, ou internas, como as lutas de setores diferentes.

Com a Nova República isso mudou. Desgastados pelos 20 anos de ditadura militar, os militares foram postos em escanteio pela primeira vez na história — e até com certo exagero, mas isso é assunto para outro post. A elite brasileira, então, ficou sem os seus cães de guarda.

Sobrou a ela a mídia. Última trincheira legítima em um regime democrático — e última trincheira possível quando não se está no poder –, durante o final da década de 80 e boa parte da de 90 ela foi ocupada de maneira quase equilibrada, embora já combativa. A conjuntura permitia: era época de hegemonia clara do pensamento liberal, o que permitia ainda um certo nível de elegância.

Mas os tempos continuaram a mudar. Por mais que essa mídia tente negar, houve uma mudança importante de modelo administrativo nos últimos anos, a partir do início do governo Lula. E por mais que a Neo-UDN queira a paternidade da bonança que o Brasil vem atravessando, e se recuse a admitir que a mudança de enfoque — da estabilidade a qualquer custo para a ênfase na distribuição de renda, ainda que eventualmente tímida; e da quase exclusividade das obras de interesse imediato da tal elite para programas estruturantes como o ProUni e o Luz Para Todos (eleitoralmente tão importante para a reeleição de Lula quanto o Bolsa Família, embora o PSDB tente evitar a armadilha que seria discutir isso) — está fazendo diferença na vida de milhões de brasileiros, o fato é que aquela elite representada pela Veja perdeu poder e espaço; e isso dói, principalmente no bolso.

Dentro desse contexto a Veja não tem alternativa que não arregaçar as mangas. Partir para a briga, assumir sua posição e defender o seu lado. Da posição arrogantemente olímpica que ocupou nos seus primeiros 20 anos, ela se viu obrigada a descer para a lama do combate político, do tipo mais rasteiro. Nada que seja estranho ao jornalismo, mas que era convenientemente disfarçada pela tranquilidade da sua posição. Hoje a Veja, como outros meios de comunicação, é obrigada a desempenhar dentro de suas condições o papel que antigamente era exercido pelos tanques e pelas estrelas dos generais. Em vez de fuzis, reacionários obscurantistas e hidrofóbicos como Reinaldo Azevedo; no lugar de Urutus, matérias porcas como aquela sobre Che Guevara assinada por Diogo Schelp e ridicularizada por um jornalista da New Yorker. Ou o achincalhe e calúnia puros, como a infame matéria, em 2005, sobre os dólares de Cuba para o PT: apenas difamação, sem nenhuma fonte, sem sequer uma testemunha.

Isso se refletiu, por exemplo, na mudança mais perceptível de orientação editorial, a proliferação de colunas assinadas. De uma revista em que praticamente ninguém assinava matérias, ela passou a ser um repositório de opiniões — a grande maioria impressionantemente ruim, o que caracteriza, antes de mais nada, a necessidade de assumir um lado e intervir no debate político. (Na edição desta semana salva-se o bom artigo do Gustavo Ioschpe.)

Na Veja de 1979 seria impensável uma coluna como a do Diogo Mainardi, histérica e de baixo nível (esta semana ele faz muxoxo e apela para o “mas – eu – tenho – mais – leitores – que – você” porque um jornalista disse que o acha um merda, opinião compartilhada por mais gente). Dos tempos em que reinava absoluta como a grande revista semanal brasileira, hoje ela se depara com um mercado que apenas encolhe em tempos de internet e com concorrência à sua altura, como a Época lembrada pelo Pedro Dória.

De revista razoavelmente respeitada, a Veja se transformou em um panfleto. Pior, em um panfleto ruim — a edição desta semana não tem praticamente nada que preste, mesmo o que passa ao largo da política. Talvez seja isso o que acontece com revistas importantes quando perdem a própria dignidade.

28 thoughts on “Post redundante sobre a decadência da Veja

  1. Acho que eu nunca esperava decadência tão deprimente e patética como a que aconteceu com a Veja e a Superinteressante. Ambas foram downhill em poucos anos, perderam totalmente a credibilidade – q é o maior bem de um bom veículo de comunicação, como bem disse o Pedro Doria. Triste.

  2. e adecadencia da CARTA CAPITAL?? e a decadência de Lulla agora uma metamorfose ambulante defendendo com unhas e dentes tudo aquilo q elle se opôs em toda sua vida política? bááán!… vcs lulistas são ridículos!

  3. É uma tristeza e dá uma raiva danada confirmar, a cada semana, a estupidez daquele hebdomadário (êpa!). É triste ver como o ‘sistema’ ainda locupleta de publicidade 50% de cada edição!

  4. Neiva,

    Em vez de apelar para o “vocês são ridículos”, ou correr da discussão racional sobre méritos e deméritos do governo Lula, você bem que podia procurar uns argumentos decentes tentando explicar que “não, a Veja não é uma revista decadente e ruim”.

    Se bem que concordo que partir para o xingamento é uma tarefa muito mais fácil.

  5. “Se bem que concordo que partir para o xingamento é uma tarefa muito mais fácil.”

    partir para o xingamento virou o esporte número um da elite brasileira.

  6. Você pode criticar o Diogo Mainardi por ter opiniões que não são as suas, mas dizer que a coluna dele é anular todo o restante do que você escreveu. Baixo nível ? Onde ? O seu texto é de alto nível ? Quem disse ?

    Fui dar uma olhada nos outros textos deste blog. Encontrei um texto questionando porque o Brasil valoriza tanto o Paulo Francis e não faz o mesmo com o Darcy Ribeiro. Dali temos todos os argumentos para selecionar se devemos ler a Veja ou este blog.

  7. Paulo,

    (Seu e-mail é mesmo jackboy? Vige.) Este blog não concorre com a Veja. Iso é um blog. A Veja é uma revista. Isto é gratuito. A Veja é paga. Além disso, não sei quanto a você, mas eu pelo menos posso ler um e outra. Outras pessoas também. Não precisa escolher. Embora eu prefira ler uma série de outros blogs em vez da Veja.

    Quanto a você achar que a importância de Paulo Francis é maior que a de Darcy Ribeiro, eu respeito sua opinião. Respeito as baratas também.

    Quanto ao meu texto, eu nunca disse que é de alto nível. Nem precisa ser. Enquanto eu continuar irritando você, vai estar de bom tamanho.

  8. seu texto é apenas de um petista encastelado nas tetas estatais, ou não??? 2010 vem aí macacada. ou vcs vão armar um golpe do continuísmo??? kkkk

  9. Neiva,

    Por favor. Agora você partiu para o escárnio irônico e, obviamente, sem substância.

    Sabe o que se diz de 2010? Que o governo tem programa mas não tem candidato, enquanto a Nova UDN tem candidatos mas não tem programa.

    Reza a sabedoria que candidato é mais fácil de achar que programa. E olha, essa de terceiro mandato é típica de vocês: como não têM nada novo para falar, ficam inventando ameaças que não existem.

    Em vez de ficar escrevendo kkk, que para mim é só a sigla da Ku Klux Klan, vocês bem que podiam repensar seu projeto e apresentar algo que prestasse. Sabe por quê? Porque 2010 vem aí.

  10. e qual o programa do PT? aquele q ele jogou no lixo depois de ter ganho as eleições de 2002 e se aliou com sarney, acm, collor e tais? o PT roubou os programas e projetos socias do governo FHC, a bolsa escola virou a bolsa família, a politica econômica é a mesma, só q mais conservadora, as alianças políticas com gente ainda mais reacionária.

    sua conversa tá muito é da fiada, viu rafa? aliás q nem a conversa (a)fiada de paulo henrique amorim…

  11. Ah, não, Neiva. Essa ladainha aí até colava antes das eleições de 2006. Isso aí é antigo. O que mostra que você não aprendeu nada com a derrota do projeto (ou da falta de) da UDN. Não vou me repetir, mas você pode ler os posts em que já falei sobre isso, se quiser:

    Vamos lá:

    Bolsa Família:
    http://www.rafael.galvao.org/2006/10/sobre_o_bolsa_familia.php

    Eleições 2006:
    http://www.rafael.galvao.org/2007/01/a_diferenca_entre_marketing_po.php

    Mas é nessas horas que eu quase fico com vontade de ver a UDN ganhar as eleições em 2010. Quase.

  12. e quem disse a vc q sou da UDN ou simpatizante da direita? vcs lullo petistas são tão arrogantes q se acham os ÚNICOS da esquerda. pára com isso, rapá…
    quer dizer q a politica econômica de Lulla não é a mesma de FHC, é?

    vcs são totalmente ridículos. eu lembro do q Lulla falava qdo estava na oposição, meu caro.

    e agora quem vê Lulla defendendo aquilo q elle era contra e aponta essa contradição é tachado por vcs de golpista, direitista, udenista. o projeto do PT não era esse~q está aí não.

    sua missa luba não cola não. inventa outra, meu caro.

  13. Sr. Galvão

    Sobre o “POST REDUNDANTE SOBRE A DECADENCIA DA REVISTA VEJA” lhe digo o seguinte: A revista Veja nem boa é, mas o único resquicio de jornalismo que podemos dizer que ainda existe é nela que está. Todo petista detesta que falem mal da aberração que é esse governo, esse presidente e toda sua currióla. Não se pode falar nada. O atual presidente quando era candidato achava que podia fazar tudo e falava; tanto de falou o que falou da CPMF e agora faz o que faz!

    A Veja é uma revista chocha, sem conteúdo que não vale seu preço na banca, mas, inquestionavelmente, derrubou, ou ajudou muito a derrubar, o Collor o que possibilitou, indiretamente, que esse acéfalo do PT chegasse a presidência com sua quadrilha que não sai das páginas policiais.

    O fato dela estar descendo a ladeira da dignidade com a Dna. Rosane, deve ser para combater os inúmeros blogs que falam o que querem de acordo com sua opinião deturpada, preconcietuosa, revanchista o o pior, mal intencionada.

    Os jornalistas Reinaldo Azevedo e Diogo Mainardi nâo são santos; muito longe disso, mas, hoje, do que se entende por jornalismo, são os únicos que fazem seu papel; estejam eles certos ou errados, (no que tange ao governo Lula estão sempre certos), ao contrario dos déspotas que apoiam, com blogs, o PT e seu governo, que querem aplauso pelo que não fizeram – vide a bacia de petróleo em Santos- e não querem ser recriminados pelos seus erros que explodem a todo momento.

    Amigo, sai dessa. Se você é inteligente com se diz ser, tome outro rumo.

    Tenha pelo menos vergonha, que é o que falta neste país. Vá trabalhar! Isso que você faz é nojento!

    Diego Malavolta.

  14. ler o debate nos comentários é quase tão divertido e interessante quanto seus textos… fico feliz que voce fique a vontade com eles.
    Também sinto uma lamentável decadência na revista Veja. Com certeza, ela perdeu sua identidade.
    Um abraço
    pat

  15. rafael, teu texto está impecável e as observações dos para-quedistas, como sempre, hilários. acho que falar mal da veja só não é mais redundante que falar da franja da aline moraes, rs. e por falar em governo, duas chamadas para matérias me chamaram a atenção na capa de o globo de hoje: “país cresce 5,7% puxado por mercado interno” e “cresce a aprovação do governo”. sem comentários. bjs!

  16. Bem lembrada pela Lucia Malla, a decadência da Superinteressante deixou muita gente órfã.

    Tem gente que ainda acha que o Diogo Mainardi é jornalista. Essa é boa! hehehe

    Como um simpatizante do governo Lula digo o seguinte em bom português: Cagaram-no-pau-sim-senhor! Mudaram o discurso, prometeram e não cumpriram, se envolveram em esquemas de corrupção, etc e tal, mas ainda é o melhor governo que esse país teve desde o começo da Ditadura Militar (e até de um pouco antes), o presidente ficou à margem da sujeira, mostrando mais que a sua inocência, a sua condição de melhor político (sabem o que é um político? entre outras coisas é alguém que faz política…dã!) do Brasil, respeitado e reverenciado pela base aliada e pela oposição.

    Suas conquistas foram muito além do que FHC fez, aliás, depois que saiu do Planalto FH parece ter ficado extremamente confuso quanto à sua função de ex-Presidente, não sabia se virava palestrante como Bill Clinton, ou se virava embaixador da ONU/LBV/Anistia Internacional/Turma da Mônica como Jimmy Carter, acabou que foi dar pitaco no governo atual e só fez macular sua reputação, mas tergiverso.

    Entre as conquistas desse governo é comum mais à direita dizer que tudo começou com FH, que ele deu início à tudo que de bom tem no Brasil hoje, sobre isso você já falou melhor que eu, Rafael, mas é mais comum ainda esquecer dos esquemas de corrupção nos quais o governo dele também se envolveu, sendo o mais notório a compra dos votos que garantiram o estatuto da reeleição no Brasil, além das inúmeras promessas que também foram feitas e não cumpridas (alguém falou no Rio São Francisco?).

    Tudo isso digo apenas pra concordar contigo num ponto específico (além de todos os outros), a direita não tem programa e tem mêda, muita mêda de que até 2010 apareça um candidato pro PT, o que eu acho dificílimo, mas não impossível, e se aparecer a pessoa certa aí o problema vai ser grande porque sabem que a disputa interna deles já vai ser um empecilho daqueles pras ambições que estão nutrindo agora!

  17. Parabéns pelo post: muito maior prêmio do que o reconhecimento dos amigos é o ódio dos imbecis.
    Não é apenas um problema político. Basta comparar a porcaria da Veja com a revista Letras Libres do México. É uma revista cultural, portanto de um perfil obviamente diferente, mas defende obviamente uma posição de centro-direita [pró-PAN e Calderón]. Só que Letras Libres o faz com ensaios de altíssimo nível de Enrique Krause, Gabriel Zaid e Guillermo Sheridan e não com essas imitações porcas de Paulo Francis que tentam compensar com estridência o que falta em termos de substância.

  18. Pô, Malavolta, você escreve um comentário de quase duas laudas e o autor do blog é quem tem que ir trabalhar?

  19. Prezado Rafael,
    Esta é a primeira vez que venho ao ser espaço, cheguei aqui através de uma pesquisa sobre a seleção de 82.
    Não creio que uma revista que em sua tiragem dobra a segunda colocada no mercado possa ser chamada de decadente; A revista Veja vem nestes últimos quase 5 anos desnudando o “grande” legado que o governo Lula e o partido dos trabalhadores nos brindaram, A CORRUPÇÃO, O DESCASO; Posso dizer que o que acho decadente é uma nação ou um povo todo não ter chiado…
    Decadente e falta de vergonha estamos nós o tal povo brasileiro.
    Hoje em dia marginal e ladrão são coitados pois não tiveram a chance socialmente, isto é balela…
    Menina fica presa, é estrupada e a governadora e seu séquito ainda dizem que ela era culpada…E kd a resposta do povo…
    Posso dizer que toda edição da Veja que recebo sinto que não estou sozinha nesta busca pelo resgate da dignidade de uma nação!
    Um prazer estar aqui, gostei do debate e dos teus textos…
    Boas Festas

  20. Acredite Felipe; a raiva é tanta desse governo que escrevi estas ‘quase duas laudas’ em quinze minutos, o restante do dia trabalhei.

  21. Diego Malavolta? Li direito? É esse mesmo seu nome? Coincidência! Será que somos parentes? Eu também sou Malavolta. Se for permitido, pegue meu e-mail com o autor deste blog e me escreva. Se não for possível, envie outra postagem que na próxima posto meu e-mail. Estou procurando outros Malavolta que não conheço exatamente para conhecê-los.

    Amplexos sinfônicos!

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