Por que Marina Silva não será candidata

A idéia por trás de cada uma das tentativas da mídia e da oposição de inflar a candidatura de Marina Silva para presidente da república — e virão mais por aí, ao longo dos próximos meses; o nome de Ciro Gomes é um dos mais prováveis — é declaradamente impedir que as eleições de 2010 assumam um caráter plebiscitário, em que o eleitor utilize o seu voto para, mais que eleger um novo presidente, aprovar ou não o governo Lula. A parcela da sociedade que se empolga com a candidatura de Marina faz isso porque acha que ela poderia evitar esse cenário em potencial, aterrador diante dos índices de popularidade do presidente.

Sem essa possibilidade, sua candidatura aderna e naufraga. É o que deve acontecer.

O desespero é mau conselheiro, e é apenas ele que explica o fato de algumas pessoas terem visto na senadora e ex-ministra uma possível anti-Dilma, uma mulher que embolaria o meio de campo de uma eleição que começa a ser definida cedo demais e a favor do governo; que garantiria um segundo turno e, com uma boa dose de sonho, poderia até tirar a candidata de Lula da disputa, abrindo caminho para uma candidatura mais sólida do PSDB — Serra, por exemplo, embora o Luís Nassif já tenha demonstrado com precisão por quê a sua candidatura não vai funcionar.

Mas eu insisto que Marina Silva não vai ser candidata — ou, se for, vai ser candidata nanica, sem apoio político, sem horário na TV, sem repercussão, sem nada, infelizmente candidata com menos expressão do que Heloísa Helena nas eleições passadas.

Marina não vai ser candidata porque não agrega nada à oposição. Se em um primeiro momento as pessoas se empolgaram porque ela poderia ser uma espécie de “Lula da oposição”, por causa do seu sexo e por causa de sua história, basta uma olhadinha simples para ver que ela, além de não oferecer uma solução real para o dilema da oposição, pode representar também um problema.

O que a direita não entendeu, e eu faço aqui o favor de explicar de maneira bem didática e simples, é que não foi só o país que mudou nesses oito anos: a história de Lula também. Não é mais a história do pau-de-arara nordestino que enfrentou a ditadura e chegou à presidência da República. É a história de um homem que, presidente, transformou o país. Além disso, falta à oposição entender que em 2002 não foi apenas a história de Lula que o elegeu: foi o conjunto de propostas, tudo o que a sua figura representava ao longo de pouco mais de 20 anos de trajetória política. Se as pessoas finalmente votaram em Lula foi porque queriam por à prova o seu discurso e as suas propostas.

Marina não representa uma substituta à altura em termos eleitorais, em primeiro lugar, porque não oferece uma proposta real de governo. Tem apenas um discurso fácil que mistura exemplo pessoal, posicionamento de defesa aparentemente intransigente do meio-ambiente e talvez uma fatia indefinível de eleitores evangélicos. O problema é que candidatos de uma plataforma só não vão a lugar nenhum, e Cristovam Buarque está aí para provar.

Mas o grande entrave diante da candidatura de Marina Silva, e é isso que provavelmente impedirá que ela seja candidata, é que ela canibaliza a verdadeira candidatura da oposição — um Serra, digamos –, sem agregar força suficiente para se tornar a opção preferencial.

Apesar do que a maioria dos analistas acha, Marina não deve tirar uma parcela realmente significativa dos votos que Lula deve transferir para Dilma, porque o seu discurso diz pouco ou nada a essa parcela da população. O nicho de Marina seria justamente boa parte de uma classe média que já tem uma inclinação clara pelo voto contra o candidato de Lula — gente preocupada com temas como aquecimento global e razoavelmente seguras de sua própria estabilidade econômica. O mais provável é que Marina tire os votos que já são do PSDB, os votos da oposição. No Rio de Janeiro, como apontou o Maurício Dias na revista Carta Capital, ela destrói a base eleitoral do PSDB, que em tese seria a base de Gabeira. No Nordeste, a região que mais cresceu nesses oito anos, reduzindo bastante o nível de pobreza, e historicamente infenso a esse discurso, a situação é ainda mais crítica.

No fim das contas a candidatura de Marina, se se confirmar, será um desserviço a ela mesma e à sua história. Este blog elogiou Gabeira quando saiu do PT, naquele momento um movimento coerente e digno — elogios que hoje, ao ver a sua transformação em vestal udenista hipócrita, não mantém. Mas olha decepcionado para Marina — pela sua ingenuidade ao se prestar ao papel de boi de piranha da oposição em nome da construção do seu próprio projeto político, pelo oportunismo demonstrado no momento escolhido para saída do PT e pelo namoro com um partido que, já há pelo menos uns bons quinze anos, tem se mostrado pouco mais que acessório de luxo do que a política brasileira tem de mais conservador. É decepcionante que uma mulher de valor inegável, uma pessoa que um país inteiro aprendeu a respeitar pelo seu exemplo, acabe voltando as costas para a sua história e tente se transformar na musa do verão 2009/2010 da república Morumbi-Leblon.

Do esquecimento

Durante muito tempo, em vez de deitar-me cedo, eu apenas não soube de verdade o que significava a palavra esquecer. Via nos filmes alguém se despedindo e dizendo “eu nunca vou esquecer você”, e então me pegava pensando que idiota, claro que não vai esquecer, depois de passar por tudo isso é impossível esquecer.

Foi só ao ver uma cena semelhante pela enésima vez que eu finalmente entendi. A TV passava “Dança com Lobos” e Kevin Costner se despedia de Graham Greene: “Eu nunca vou esquecer você”.

Eu já estava mais velho, já conhecia um pouco mais dessa humanidade impossível de conhecer de verdade. Foi só então, aí pelos vinte e poucos, que entendi o que se quer dizer com isso: não é esquecer a pessoa, que isso não se esquece, mas nunca deixar morrer o que se sentia por ela. É o tipo de coisa que só quando você passou por um bocado de gente na vida pode entender de verdade.

E é esse o problema das gentes, o fato de que no fim das contas todos seremos esquecidos. Eu tento conviver com isso; mas sei bem que a ilusão de que seremos lembrados ajuda a dar um sentido à vida. Imagino que para algumas pessoas a consciência real de que não há memória, só há esquecimento faria da vida algo um pouco mais triste, talvez até a fizesse não valer a pena.

A essas pessoas deve ser vedada a entrada em cemitérios. Porque um cemitério é isso, é esquecimento, e se disserem que é outra coisa estarão enganando você. Um cemitério é um lembrete constante de que você será esquecido, irrevogavelmente. E será esquecido apesar dos seus esforços, tão mais ridículos quanto maiores forem, de tentar ser lembrado.

As pessoas erigem monumentos, botam estátuas de anjos e de santos para guardar seus ossos inúteis, colocam na pedra ou no bronze seus nomes, colocam até panegíricos que ultrapassam o limite do ridículo, ostentam os títulos que lhe orgulhavam e lhe engrandeciam aos seus próprios olhos. Fazem o que está ao seu alcance para alcançar uma imortalidade, se não na alma, pelo menos na memória e nos tempos deste mundo.

E no entanto eles serão esquecidos, e se forem lembrados será para serem ridicularizados, olha que idiota, tanta pompa e tanto dinheiro gasto para nada, quem esse merda achava que era, fulano de tal, que diabo ele fez para achar que lembraríamos dele?

No começo do ano vi uma pequena multidão diante de um túmulo novo no Pére Lachaise. Flores, muitas flores, inclusive uma coroa do Olympia. Devia ser um artista.

Artista morre a três por quatro, normalmente velho, esquecido e fora da ribalta, mas aquele pelo visto era alguém, porque o tanto de flores e o tantinho de gente à sua volta eram um atestado, senão de glória, pelo menos de fama.

Um sujeito jovem, drogado e bêbado, trazendo na cara loura e de traços grosseiros marcas de uma ou mais brigas recentes, era um dos mais comovidos. Estava em pé diante do túmulo e pela bagagem que carregava tinha vindo de longe apenas para prestar ao falecido uma última homenagem, talvez para adorar seu novo santo em seu próprio altar.

Perguntei a uma moça velha também parada ali quem era o ilustre defunto, quase pedindo desculpas por não saber quem jazia ali, e a senhora não sabia. Então o sujeito veio falar comigo, e como eu só gosto dos malucos da minha terra larguei um jenecompranpá, um aidonspicfrentch, e para ter certeza de que ele compreendeu mandei também um balançar de cabeça e um dar de ombros e levantar de mãos súplices. E quando ele viu que eu não entendia, ele também deu de ombros, e voltou a sua atenção ao pequeno jardim à nossa frente.

Ele olhava o túmulo como a Rosinha de Caymmi olhava o mar, Rosinha que era bonita e agora parece que endoideceu, na beira da praia, olhando pras ondas, andando, rondando, dizendo baixinho “Morreu… Morreu…”, e eu que não endoideci nem nada olhava para ele, esperando a hora em que iria desmaiar ou morrer de overdose ali, um pequeno sacrifício romântico e estúpido diante do altar do seu ídolo.

Um velho gordo, baixinho, com aquela cara de provinciano do vale do Loire, passou pelo sujeito e viu o aglomerado e disse em voz alta que o morto não era ninguém, não era nada. E o rapaz se irritou, porque a gente não mexe impune com a fé dos outros, e começou a discutir com o velho, ele era um grande compositor, um gênio lírico, um grande cantor, um grande ídolo e modelo da juventude, e o velho gordote e baixinho sem tirar as mãos dos bolsos deu também de ombros e soltou aquele pequeno flato oral que franceses gostam de soltar e se afastou.

Eu me afastei também.

Mais tarde eu descobriria quem era o sujeito. Se chamava Alain Bashung, era conhecido como “le dandy du rock” apesar de já ter passado os 60 anos, tinha morrido uma semana antes. Em vez de viver rápido, morrer cedo e deixar um cadáver bonito, como sói fazer qualquer roqueiro que se respeite, morreu em idade quase provecta de um câncer prosaico, e morte por câncer na velhice é morte indigna de roqueiro, mas fazer o quê, os tempos mudaram muito desde a época em que Jim Morrison, enterrado ali perto, morria por excesso de vida. Diziam as capas das revistas que Bashung era um grande ídolo — e talvez fosse mesmo, e me disponho a admitir isso porque certamente não conheço todos os grandes ídolos universais que existem por aí.

Daqui a 50 anos o túmulo de Bashung provavelmente estará esquecido como outros tantos no mesmo Pére Lachaise. E o ardor do seu fã embriagado e entorpecido não terá significado nada. Diante do túmulo de Bashung, onde num dia de março do início do século um garoto fora de si quase brigou em defesa de sua memória, um bocado de gente vai passar e vai dar de ombros, se sequer se der a esse trabalho, como hoje diante do túmulo dos generais e políticos e escritores e gente que se supunha imortal e inesquecível — algo de que o tempo discordava.

Palavras como medo, vergonha e orgulho

E daí que eu estava escrevendo um texto hoje e me faltou uma palavra.

Isso acontece de vez em quando. A palavra mais simples, mais comum me falta, dela fica apenas uma sombra pálida. Durante alguns segundos eu fico angustiado porque esqueci palavra tão boba; ficaria alguns minutos assim se não fosse a minha preguiça, aquela que me faz procurar logo um sinônimo. Não precisa ser um sinônimo perfeito. Le mot juste que se foda, que Flaubert era um vagabundo que não tinha o que fazer e podia passar dias rolando no chão e espumando pela boca atrás de uma palavra. O que vier para mim está bom.

Então por alguns segundos ela ficou ali, flutuando em algum lugar do éter, mas quando eu olhava para ela a desgraçada desaparecia; parecia um tipo particularmente irritante de mulher, aquelas que jogam charme apenas para depois sair graciosamente de seu alcance. Era uma palavra simples, e sabia que começava com “con”. Con-alguma coisa-ar.

Belial apareceu nessa hora e soprou uma palavra no meu ouvido. O diabo da palavra que me apareceu foi “conjuminar”.

Eu teria vergonha de, algum dia, escrever conjuminar. Não sei nem onde aprendi uma palavra dessas — deve ter sido junto com outras palavras de baixíssimo calão que me ensinaram na rua e que reservo para momentos especiais na vida, como xingar a mãe de alguém de quem eu realmente não goste. Meu repertório de palavrões é particularmente invejável; mas “conjuminar” deve ter sido esquecido porque há limites que eu não ouso ultrapassar.

Não faço idéia do que se passa na cabeça de uma criatura que se sujeita a escrever, em sã consciência e em quaisquer situações, a palavra conjuminar. Preferia inclusive continuar sem saber, porque os grotões da mente humana são escuros e assustadores, são como pequenas caixinhas de Pandora que uma vez abertas espalham a dor, o medo e a vergonha entre os viventes.

Talvez por isso eu sempre tenha tido orgulho de nunca ter escrito essa palavra. Talvez porque eu não tenha lá muitos motivos de orgulho da vida. É olhar para trás e ver um bocado de bobagens, um bocado de coisas erradas que fiz e das quais, se eu tivesse um pouco de vergonha na cara, deveria me arrepender.

Mas até agora eu tinha orgulho de jamais ter escrito ou mesmo conjugado mentalmente a palavra conjuminar. Alguém pode dizer que grandes merdas ter esse orgulho, milhões de brasileiros tampouco escreveram conjuminar alguma vez em suas vidas, e nem por isso vêm se vangloriar disso; que conjuminar é palavra bestial utilizada apenas por advogados e escritores de academias de letras, que orgulho deve ter é quem jamais mandou alguém se foder, porque resistir a essa tentação é tão mais difícil quanto mais os anos passam. Mas cada um tem os orgulhos que pode ter, bobos ou não, e eu tinha orgulho de nunca ter escrito conjuminar.

Mais que orgulho, mais que vergonha, eu tinha medo. Porque lá no fundo sempre tive a certeza irracional de que, se escrevesse essa palavra maldita, se sequer pensasse nessa palavra hedionda e tenebrosa, a minha decadência se aceleraria e um dia, diante de uma neguinha organizadinha que passasse balançando as ancas por mim, eu arranjaria minha melhor cara de pau, meu melhor sorriso e diria a ela “Bora ali, fia, conjuminar nossos corpos”, e então não haveria mais volta possível.

Esse orgulho que me sustentou durante tanto tempo começa a morrer hoje, porque eu pensei nessa palavra, ousei pensar em vocábulo tão chulo que envergonharia até o marinheiro mais baixo, e agora o inferno está aberto para mim.

Pequeno post melancólico e quase nostálgico

O Idelber vai voltar. Ele já parou antes e voltou, deixa só a barra folgar um pouco e ele volta, nem que seja para escrever sobre o melhor time que ele já viu em sua vida, o Flamengo de Zico e Leandro e Adílio e Júnior e Andrade.

Mas a sua despedida, neste momento, faz com que eu lembre que o tempo está passando, e passando rápido. Se o Idelber parasse sozinho eu não acharia nada, mas aí vou ao blog do Bia e não vejo nada, e o do Ina e não vejo nada, e o Bruno parece ocupado com outras coisas.

Os ciclos de vida parecem mais curtos aqui. E agora eu paro e me lembro daquele inverno de 2005 — o inverno de que Serge Gainsbourg fez a trilha sonora, o inverno das brigas na blogoseira, dos astrólogos de Maria e pseudo-feministas no meu pé, dos encontros histéricos no Rio onde o Alex lambia os pés de uma lourinha antes de ir para os estrangeiros fugir de furacões, e o Doni que tinha tempo para aparecer de surpresa no Rio, e o Hermê que mandava malucas para o hospital a beliscões, e a Tata que ainda era carioca de Copacabana com o sotaque de zona sul, e a Carol que chicoteava os moços e dizia “não vá colocar isso no seu blog!”, e o Bia que tentava comer todo mundo fazendo experimentos com pequenas pílulas azuis e se sentindo uma mistura de Aldous Huxley e Jack Kerouac.

É engraçado lembrar disso, porque hoje o Alex é um sujeito que agora sabe que o racismo existe, e a Carol também foi para lá longe porque a ninfeta do demônio cresceu e encontrou o homem de sua vida e resolveu ir para onde ele fosse, e o Doni é um psicólogo que chega para as meninas da faculdade e joga um “quer ver o tamanho da minha subjetividade?”, e o Bia é um homem sério que trabalha o tempo todo e empresta sua cara à TV e daqui a pouco vai estar fazendo churrascos para os amigos no quintal de casa, conversando sobre qual carro é melhor para uma família daquele tamanho, e eu continuo aqui na minha cidadezinha, olhando da varanda o rio que corre aqui em frente e tentando adivinhar se hoje vai ter vento.

E aí, enquanto a gente olha em volta e vê que todo mundo cresceu, fica a sensação de que é tudo tão chato, todo mundo falando as mesmas coisas com a mesma seriedade e a mesma sensação de importância, um bocado de gente se levando a sério demais e valorizando em excesso seus poucos caraminguás, que a blogoseira anda tão chata. Mas nunca é bom esquecer que quando alguém acha algo chato, pode ter certeza de que há 50% de chances de que o chato seja ele. Na verdade as chances são maiores, bem maiores do que eu gostaria que fossem, e a história parece ter superado todos nós.

Assim estamos todos morrendo, porque parece que nessa blogoseira tudo é rápido demais, que as pessoas vivem aqui em um ritmo diferente daquele lá fora, e nascem e crescem e morrem rapidinho como efêmeras, e a sua morte nunca é um câncer tomando conta do fígado, ou um corpo jogado numa esquina, é apenas cansaço e desistência, e ao perceberem isso elas lembram como a vida lá fora é tão melhor e mais pragmática. E se alguém perguntar ao Bia se existe vida após a morte ele vai dizer que sim, que depois de morrer virou um senhor burguês que junta a família para assistir à Bela Adormecida nos sábados à tarde.

É o spleen de fin de siècle, versão blogoseira. Mas como não tem Baudelaire para escrever um poema, ficam só os arquivos do Blogger e do WordPress e do Movable Type, e pairando sobre eles uma certa falta de vontade de escrever, uma sensação de que afinal de contas tudo o que tínhamos para dizer já foi dito e redito. Um cansaço que agora parece atávico, uma sensação de que não há nada a fazer diante do w.bloggar. E aí, vou escrever o quê? O Bia desistiu há meses, o Alex não se preocupa mais com suas prisões, agora o Idelber resolveu parar.

De repente me vêm à visão os 80 anos, os meus 80 anos, e me vejo pedindo a prostitutas feias e já em fim de carreira que fiquem mais um pouco, que conversem comigo. Sobre qualquer coisa. Que inventem uma história sobre como foram parar nessa vida, que dêm a um velho sozinho e solitário um pouco de companhia, algo pelo qual ele tem que pagar por causa de tudo o que fez em sua vida.

Aí eu começo a rir, porque essa do velhinho foi de matar, e se minha mulher ler isso vai me encher de porrada.

As alegrias que o Google me dá (XXXIX)

jogo daquele que o menino tras as cacha con as mão
Chama-se “estivador”. É um jogo que muito menino que não quis estudar, assim como você, acaba jogando.

videos de sexxo gratis freira dando o cu e chupando os coroinhas
Como a vida engana a gente, hein? Você resolveu ser coroinha pensando que ia ter tudo isso aí. Imaginou que as freiras iriam jogar os hábitos a seus pés em orgias divinas; mas Deus nem sempre é justo e você acabou no colo do padre. E hoje, tantos anos depois, fica tentando achar no Google algum indício de que aquilo que você imaginava era real, infelizmente sem sucesso. A vida tem dessas coisas.

simpatia do jilo para broxar alguem
E precisa de simpatia para isso, precisa da intervenção de Exu ou Oxum para coisa tão simples? Eu pensava que era só dar um bom prato de jiló para alguém comer que o serviço estava feito.

video porno gratis de maridos que gostam de serem cornos
Desculpe a sinceridade, mas você é um idiota. Em vez de procurar vídeos desses maridos que, afinal de contas, apenas fizeram uma opção de vida e têm gostos singulares dos quais não devem satisfações a ninguém, você devia procurar era pelas mulheres deles, que certamente são muito mais interessantes. Tem gente que não vê o que está debaixo do nariz. Credo.

o que foi o aparteith
Sistema político desenvolvido na Suazilândia, muito semelhante ao apartheid sul-africano, em que uma minoria letrada subjugou e segregou uma maioria analfa que nem você.

homem morre em motel acompanhado de amante na bahia
Deu no jornal: “Morre feliz um baiano”.

ele;me;acha;doida;mais;sivo;para;faze.sexo
Ô, minha filha, pelo menos para alguma coisa você tinha que prestar, não é?

baixa gratis musica gospel para bebe recenascido
E assim começa a triste passagem de um pobre coitado por este vale de lágrimas.

eu queria entender a vida como ela é
Leia bem este post. Veja a que desvãos da sanidade a mente humana pode chegar. Veja a variedade de taras, de deturpações humanas e sociais — e saiba que há ainda piores, que eu não coloco aqui porque tenho medo de sequer pensar no assunto. Isso é a vida como ela é, meu caro. Inclui tarados, doentes, espertos, burros, inocentes e culpados. Você tem certeza de que quer mesmo entender a vida como ela é? Porque eu, se fosse você, não quereria, e ganharia algumas noites de sono e um pouco de paz de espírito.

como xingar educadamente
Qual a graça de xingar educadamente? A graça da ofensa é justamente a de ser mal-educado, a de explodir e tirar do peito a raiva e a frustração que lhe consomem. Xingar educadamente é como beber água salgada, amigo. Não resolve nada. Xingar com educação é como fazer certas coisas com comedimento. Não vale nada.

jogos de torturar os homens com a bunda
Se estiver precisando de voluntário, é só dar um toque, tá?

kit de som para igreja completo por 1200
Não importa que os incréus aleguem, desesperados diante do som que vem das igrejas, que Deus não é surdo. Os crentes e os pios vão continuar querendo um som mais alto, porque o proselitismo tem na tecnologia e no mau gosto um grande aliado, e afinal de contas o dízimo paga tudo isso.

fotos de homens metendo o dedo na bumda da mulher e ai comesa a fazer sexo amoroso
Porque o amor se manifesta de tantas formas diferentes, e vai, e vem, e é doce e forte ao mesmo tempo.

quero ir pra cama com uma pessoa muito especial
Desista. Você não vai conseguir. No máximo vai encontrar um cafajeste como eu, que nem sequer ligaria no dia seguinte.

mulheres que paga boquete nos colegas do filho
Ah, se você tivesse a sorte de ter bons amigos assim, hein?

fotos de xuxa fazendo sexocom satanas na casa de maconha
E pela sua criatividade, meu caro doente, eu te outorgo o prêmio “Alucinado do Google 2009”.

afinal lsd aparece em raio x em aeroporto
Não. De maneira alguma. E por favor, me mande lembranças da cadeia de Cingapura quando chegar lá, certo?

materia veja uruaçu exporta puta
Tá vendo, Goiás? Tá vendo? Todo mundo já sabe que Uruaçu exporta puta para a Espanha. Depois vocês vêm dizer que é implicância minha.

como ficou o rosto do michael jackson embalsamado
Continuou feio como o cão.

garoto em goiania leva um tiro na testa
Foi mexer com o bofe dos outros, deu nisso.

o maior talento de robin wood era
Cortar lenha. Robin Wood era um grande lenhador, campeão absoluto e orgulho de seu país. Nas Olimpíadas de 1944, quando esse ainda era um esporte olímpico, levou para a Inglaterra três medalhas de ouro e se tornou herói nacional. Morreu esquecido em 1976, de um ataque cardíaco enquanto tomava sua cerveja num pub perto das docas de St. Catharine.

jogos que o homen faz o que a gata manda se nao leva chicotada
Masoquista, o moço — porém com alto padrão estético.

conselhos sobre marido chato
Amiga, olhe em sua volta. Veja o número de adolescentes de 30 desesperadas atrás de um homem para chamar de seu, que vivem reclamando que os homens que existem são casados ou cafajestes ou gays, se atolando na pipoca enquanto conversam nas salas de bate-papo online com homens que são sempre lindos, ricos, inteligentes e disponíveis apesar da esposa embarangada que vê televisão na sala ao lado. Viu? Então, agora eu posso te dar um conselho: agüente, minha filha, que é melhor um marido chato que marido nenhum.

brincadeira violenta no escotismo
Chama-se “atentado violento ao pudor” e é muito semelhante às brincadeiras de padres irlandeses e bostonianos costumam fazer, com a única diferença que o catecismo não entra na história.

o fantasma andando no corredor de michael jackson no floro dele
Por “floro” eu vou entender “velório”, certo? Bem, uns paranormais realmente viram o fantasma de Michael Jackson vagando pelo seu seu velório. Dizem que ele gritava “I’m bad! I’m bad!”, mas estava muito feliz, porque finalmente tinha ficado branco, e circulava em meio a inúmeros anjinhos de sexo indefinido.

bons conselhos para a vida
Se eu tivesse algum bom conselho para dar eu não era blogueiro, era guru de auto-ajuda e estava enchendo o rabo de dinheiro.

video brasileiras peidam fazendo sexo
Não conheço o vídeo, mas isso é uma boa advertência para que não apertem as pobres brasileiras.

ainda vale apena fazer faculdade de jornalismo
Vale. Mas só se antes você fizer um curso de português. Porque pelo menos você vai poder dizer aprendeu isso na faculdade.

filmes pornos raros baixar
Um connaisseur da putaria, vejam só. Um gourmet da safadeza, procurando os legendários filminhos da Jean Harlow, ou então um obscuro pornô iraniano da década de 1960. Este é um mundo maravilhoso.

voçe sete tesao quando chupam seus seios ?
Olha, não muito. Geralmente meus seios estão no corpo de outra mulher, e entre as minhas taras, infelizmente, não está o voyeurismo.

relatos eróticos de netos
Caro editor, leio este fórum há muito tempo e acompanho as aventuras dos outros leitores, mas nunca pensei que isso pudesse acontecer comigo. Mas aconteceu, e eu quero compartilhar minha experiência. Tudo começou quando eu estava passando as férias na vasa de minha avozinha querida. Ela tinha 106 anos, mas um corpinho de 97 que sempre me fez imaginar coisas e prazeres inauditos. Certa noite, eu estava na sala ouvindo a Voz do Brasil quando ouvi um gemido sensual vindo do canto onde ficava a cadeira de rodas de minha avó. Foi um alarme falso: era só a velha peidando. Voltei a assistir o programa de Marcia Goldschmidt, quando de repente ouvi um gemido sensual vindo da cadeira de rodas. Excitado, com o meu membro túrgido e latejante, fui até a velha e perguntei: “E aí, vovó, tamos aí nessas carnes?” Ela, no entanto, só gemia. Me posicionei sensualmente diante dela, e comecei a fazer um strip tease. Ela arfava cada vez mais. Só então descobri que a velha estava tendo um ataque cardíaco e estava morrendo, e até hoje vou chorar em sua cova.

vincent van google histori vida e morte
Vincent queria ser bibliotecário, desde pequenininho. Seu maior prazer quando criança era organizar os livros do pai, numa estante antiga que tinha sido herdada de seu bisavô. Por autor? Por ano de publicação? Por assunto? Esses eram os dilemas de Vincent van Google diante daqueles poucos livros. À medida que crescia, Vincent ia comprando mais livros. Não que tivesse algum interesse especial em leitura, mas porque eram mais livros para organizar. Lia um bocadinho, apenas o suficiente para saber onde colocar cada um deles. Aí pelos 25 anos Vincent tinha 3 mil livros em casa e se casou com uma moça que conheceu no curso de biblioteconomia de uma faculdade particular. Aos 40, tinha 8 mil livros. Por causa de sua mania de organizar livros sua mulher se separou dele aos 45. Mas nem isso o abateu, porque ele sabia que o seu trabalho tinha muita importância e biblioteconomia era a profissão do futuro. Vincent tinha 50 anos quando surgiu o Google. E então ele percebeu que o seu mundo começava a se desabar, que grandes bibliotecas pertenciam definitivamente, ao passado, e então Vincent se angustiou, e revoltado cortou sua própria orelha, e amarrou um pano sobre ela mas o pano era o mesmo que ele usava para limpar seus livros, e o pano infeccionou o buraco onde um dia houvera uma orelha e Vincent morreu. Como último pedido insistiu para que seus amigos não deixassem que o Google indexasse as páginas com a notícia de sua morte.

O futuro é em outra direção

Depois dizem que é exagero meu.

Alguns políticos do DEM, aqueles com mais chances na disputa eleitoral do ano que vem, acabam de voltar da Espanha, onde participaram de um curso de oratória e marketing político patrocinado pelo diretório municipal. Entre eles estavam José Roberto Arruda, do Distrito Federal, Paulo Souto, da Bahia, e João Alves Filho, de Sergipe.

É uma atitude louvável do DEM, que em vez de fazer o já tradicional biquinho udenista tenta correr atrás do prejuízo, oferecendo aos seus militantes cursos de Bolsa Família e, agora, cursos de marketing político.

É também coisa de gente chique, que faz cursos na Espanha, porque certamente são mais agradáveis aquelas bandas madrilenhas.

E coisa de gente que não consegue entender o mundo, porque o curso foi dado pela equipe de marketing de John McCain, candidato (derrotado) à presidência dos Estados Unidos (e não do Brasil).

A triste sina do PSDB, que não consegue mais olhar para a frente

Acredito que em 2002 os tucanos, diante de sua derrota eleitoral, se consolaram um pouco achando que em 2006 voltariam nos braços do povo para salvar o país da tragédia que teria sido o governo lula.

Admito até que em 2006, quando a derrota vergonhosa — eu nunca tinha visto um candidato ter menos votos no segundo turno do que no primeiro — foi bem mais significativa do que a de 2002, alguns menos dotados de inteligência, sem conseguir compreender como Lula tinha sobrevivido à crise do mensalão, acreditaram que em 2010 o país estaria pronto para eles; que mesmo que o governo não fizesse nenhuma grande besteira, seu desgaste seria tamanho que pavimentaria uma vitória relativamente fácil de Serra ou Aécio.

Enquanto o tempo passava, as táticas de ataque utilizadas variaram pouco. No começo, diziam que Lula tinha voltado as costas para o social e estava aparelhando o Estado — quando, na verdade, preparava o maior programa de distribuição de renda do Ocidente e “desaparelhava” a máquina estatal da revoada de tucanos encastelados em cargos no governo. Mais tarde se tornaram arautos de uma “ética” que eles mesmos jamais praticaram, nem mesmo fora do poder, como testemunham os amigos generosos do deputado Arthur Virgílio. Na falta de mais argumentos, reivindicaram a paternidade da política econômica de Lula, ainda que, ao lado de uma profunda pretensão que os faz se julgarem donos de fundamentos econômicos, esse argumento venha se esgarçando continuamente ao longo dos anos em que o governo tomou decisões que o distanciavam do monetarismo desgastado dos tucanos.

Mesmo há tão pouco tempo como 2008, apostaram que a crise mundial iria derrubar finalmente o governo, e riram antecipadamente quando o presidente falou que aqui ela seria apenas uma “marolinha”. Na sua cabeça estava ainda o Brasil de FHC, aquele que caía de cama quando os Estados Unidos espirravam. A reação do Brasil à crise, e principalmente as medidas tomadas pelo governo, deveriam enterrar de vez os pedidos tucanos de paternidade da política econômica de Lula, porque mostra acima de tudo a diferença na maneira e no conteúdo das decisões tomada; mas não é difícil reconhecer que, dado o seu histórico, isso talvez não seja suficiente.

Ainda assim, não acredito que agora algum deles tenha realmente alguma esperança de, a continuarem as coisas como estão, conseguirem tomar de volta o país.

Qualquer tucano sabe que, ao escolher Dilma Rousseff como sua candidata à presidência, Lula fez uma escolha magistral. Dilma é uma mulher com qualidades “masculinas”, provavelmente o melhor meio-termo possível em política: pode representar uma mistura de renovação com segurança. Uma mulher forte, de história invejável e competência administrativa reconhecida. Uma mulher identificada, acima de tudo, com o governo Lula, muito mais do que outras personalidades petistas, que sempre tiveram carreiras paralelas à do presidente — e aqui se pode citar um Aloísio Mercadante ou uma Marta Suplicy. Dilma atravessou incólume a crise do mensalão, e está à frente de um dos mais importantes projetos de infra-estrutura do país, o PAC. Assustados, tucanos apontam pesquisas que indicam Serra na frente — mas mesmo eles sabem que isso, a esta altura, não significa nada, significa apenas que ela está crescendo, o que é um cenário ainda pior do que o que eles gostariam.

O PSDB sabe que quando Lula aparecer na TV e no rádio, colocar a mão no ombro de Dilma e disser “Dilma sou eu na presidência, mas ainda melhor”, milhões de brasileiros decidirão imediatamente os seus votos.

O que eles ainda não conseguiram entender com clareza é a razão disso.

Infelizmente para o discurso tucano, isso não vai acontecer apenas por causa do Bolsa Família, apesar de sua importância (tardiamente reconhecida pelo PSDB, que agora oferece bisonhos “cursos de Bolsa Família” aos seus militantes). Ou porque Obama diz que Lula é seu chapa. Parece que ao PSDB é impossível admitir, se não publicamente, ao menos intimamente, que o governo Lula ainda é o que há de mais moderno, e apresenta uma alternativa de país superior à que eles estão preparados para oferecer.

E aqui está um pequeno conjunto incompleto da obra de Lula: avanços sociais que só tiveram paralelo na era Vargas, uma mudança significativa na forma como o país se comporta perante o mundo, a consolidação da variedade de parceiros comerciais, a solidificação das instituições democráticas apesar de todos os pesares (e, sim, apesar de muitos erros políticos).

Seria de se esperar que esse projeto, depois de oito anos, já se tivesse esgotado. No entanto, a nada disso o PSDB se mostra capaz de oferecer uma alternativa superior. É lamentável que nesses quase 8 anos os tucanos não tenham conseguido avançar em sua concepção de mundo. Pode-se até imaginar que o seu papel histórico tinha fôlego reduzido, realizar as reformas que Fernando Henrique Cardoso realizou em seu primeiro mandato e ser superado por conceitos mais modernos. E esse é o seu verdadeiro drama. O problema do PSDB não pode ser resolvido em uma discussão sobre ética ou sobre nomes.

Se se pode alegar que há 20 anos a esquerda era atrasada — e eu poderia discutir isso, admitindo sem muita vergonha que em muitas coisas estava, sim –, o fato é que é essa direita que um dia se pretendeu moderna hoje se vê superada até mesmo em seu próprio campo. O mundo que eles enxergam é o mundo de 1989, quando Mário Covas apontava uma concepção de Estado bastante pertinente e melhor que a que defendíamos. Mas o tempo passou e agora o PSDB não consegue apresentar um projeto superior ao da esquerda, aquele que será defendido no ano que vem por Lula e Dilma. Mostraram que não conseguiram se reciclar, e assistem às suas concepções serem superadas pela história — ao contrário do lado de cá, que entendeu que muitas de suas concepções filosóficas eram equivocadas e muitas vezes soube fazer correções de rota necessárias.

É como se para os tucanos esses 20 anos não tivessem passado. Talvez por necessidade política de uma oposição acuada e constantemente minada, talvez por mera incapacidade, mesmo, o PSDB que já foi uma força progressista importante preferiu regredir e se transformar em uma espécie de nova UDN lacerdista, olhando para o passado em vez de se voltar para o futuro.

Aparecida

Tá, eu sou baiano.

Eu já disse aqui: a minha Bahia é a de Caymmi, não é a de Ivete Sangalo. A Bahia que eu conheci ainda tinha os encanadores esperando fregueses no relógio de São Pedro, e esse para mim é o grande símbolo de uma Bahia que trazia bem claros em si seus elos com o passado, porque os encanadores com seus maçaricos e suas expressões de desânimo eram os últimos remanescentes dos cantos de escravos que se espalhavam pela cidade desde muitos séculos atrás.

As coisas mudaram, Caymmi morreu e a Bahia não é mais o celeiro cultural deste país — se alguém quer ver o futuro que olhe para Pernambuco, porque é de lá que vem o novo de braços dados com a tradição. Se eu pelo menos gostasse de Recife.

Mas morta ou não, soterrada pela indústria do axé e do trio elétrico ou não, a Bahia ainda me dá régua e compasso para que eu avalie o mundo — assim, um tantinho menores que os de Gil, mas suficientes para que eu faça bom uso deles.

É à Bahia que recorro quando vejo os comentários que uma moça chamada Aparecida deixa aqui. Quase todo dia ela vem a este blog, deixando comentários irritados nos posts mais inapropriados, reclamando do “dinheiro sujo dos políticos que me patrocinam”, pedindo para eu tergiversar sobre Sarney com a minha “verve sem diploma”, coisas assim, sempre assim, sempre as mesmas. A Aparecida não gosta de mim e faz questão que eu saiba disso.

Aparecida, minha filha, fica assim não.

Eu não sei se Aparecida é jornalista, deve ser. Não sei se ela tem algum problema, deve ter. Mas em minha ignorância fico entre o assustado e o lisonjeado quando vejo seus comentários, todo dia, todo dia. É esse buscar constante de atenção, essa necessidade de se fazer notar através de um comportamento agressivo, às vezes ofensivo, que torna a Aparecida fascinante. Fascinante é também a sua persistência, porque não importa quantos comentários sejam bloqueados, ela vai voltar e reclamar de mim, e me forçar a dizer coisas que eu não quero dizer. Aparecida vem aqui há tanto tempo, sempre dando com a cara na porta mas sempre voltando, moça persistente e tenaz, que acho que é chegada a hora de lhe prestar alguma explicação, de reconhecer a sua existência e admitir que sim, eu sei quem é a Aparecida, eu sei que ela vem aqui todos os dias, e eu sei que ela tem uma relação estranha de amor e ódio comigo.

E para isso tenho que recorrer à Bahia, porque um dos princípios imutáveis da vida é o de que não há nada que se possa pensar em dizer que não tenha sido dito antes por algum baiano, num discurso em Haia por um Ruy Barbosa ou numa mesa de um brega da Ladeira da Montanha por um vendedor de fitinhas do Senhor do Bonfim.

Antes que eu pudesse sequer pensar em uma resposta a Aparecida, Renato Fechine, provavelmente o melhor cronista da Bahia moderna e do seu falar, essa que se embaralha em novas avenidas tortuosas e em plataformas de metrô e se estapeia no Saboeiro, já tinha tranqüilizado a moça:

Aparecida, tu sois mió do que Neide,
Edileusa e Corrinha,
Tu sois mió do que Creide

Neide é menor de idade
E ainda depende dos pais
Sou doido pra azarar ela
Mas vai me criar pobrema dimais
Seu sonho é ser eriomoça
Ou trabalhar in ni televisão
Ela quer ser atriz de novela
E além de amarela não curte negão

Aparecida, tu sois mió do que Neide,
Edileusa e Corrinha,
Tu sois mió do que Creide

Edileusa enganchou-se com um gringo
Que conheceu lá no Candeal
E ni dezembro ela vai pras Oropa
Mas volta perto do carnaval
Sonhava em ser manequinha
E ser modela profissional
E hoje é triste a sua labuta
Virou protistuta externacional

Aparecida, tu sois mió do que Neide,
Edileusa e Corrinha,
Tu sois mió do que Creide

Corrinha só fede a cigarro
E é ausviciada em mausconha
Não pode ver um macho num carro
Eita muié sem vergonha
Só veve embrenhada nos morro
Eu acho que é até traficante
Já foi uma gata retada
Hoje tá derrubada e num tem quem levante

Aparecida, tu sois mió do que Neide,
Edileusa e Corrinha,
Tu sois mió do que Creide

Creide dançava pagode
A vida dela era quebrar
Depois que estorou umas varize
Ela teve que se aposentar
Deixou muito marmanjo barbado
Com aqueles olhos aziuis
Ela fazia a alegria da gente
Mas hoje ela é crente e só serve a Jesus