A Julia diz que em Recife não há professores analfabetos.
Pode ser. Mas qual é mesmo aquele lugar onde falam “tu visse” em vez de “tu viste”?
A Julia diz que em Recife não há professores analfabetos.
Pode ser. Mas qual é mesmo aquele lugar onde falam “tu visse” em vez de “tu viste”?
Eu tenho um nível alto de dependência do computador. Não digo que sou um sujeito totalmente “wired” porque não tenho um palmtop com conexão à Internet via satélite, mas a verdade é que minha vida, em grande parte, depende do computador.
Alguns exemplos: eu trabalho aqui, de um jeito que não poderia antes. Já aconteceu várias vezes de criar uma peça aqui, fazer o layout, aprovar por e-mail, encomendar as imagens e mandar para o jornal também por e-mail. Um processo que até há alguns anos levaria dias para ser realizado foi feito em poucas horas. Consegui alguns jobs, como campanhas eleitorais, exclusivamente através de e-mail.
Me comunico com minha filha através de uma webcam, com minha mãe por e-mail; converso com amigos em vários Estados preferencialmente por e-mail ou instant messaging; se quisesse poderia até arranjar namoradas aqui. O limite seria a pura e velha sacanagem, mas tem gente que até isso encara. Deve haver um monte de teclados melecados por aí.
Eu me informo aqui. Todas as manhãs recebo newsletters do New York Times, da CNN, do Financial Times, da BBC, e de alguns sites de propaganda, negócios e tecnologia. Leio minhas revistas preferidas — Wired, Business 2.0, Atlantic Monthly, Business Week, agora a New Yorker — na Internet. Se quisesse poderia ler livros inteiros aqui.
Me divirto aqui. Basicamente ouço música no computador, baixada da Internet, e jogo aqui também (o mesmo jogo há 7 anos, Quake; eu devo ser um demente alucinado). Vejo filmes aqui também (já aconteceu de ver filmes aqui antes que fossem lançados nos cinemas do Brasil, mas não é lá muito recomendável).
A questão é que existem maneiras diferentes de lidar com o computador. A maior parte das pessoas que conheço usa da forma mais básica, que apenas torna um pouco mais fácil a execução de tarefas rotineiras, como escrever ou elaborar uma planilha; às vezes até atrapalha. Uma intermediária agrega novas formas a processos antigos, potencializando a produtividade; e, finalmente, o nível mais avançado de interação cria necessidades e costumes novos. Acho que estou nessa.
Uma das coisas que sempre me chamaram a atenção no Ceará é a importância que dão a um diploma. Qualquer um. Isso faz parte da tradição ibérica, certo, mas aqui no Ceará é mais acentuado. Provavelmente é uma reação ao alto nível de analfabetismo no Estado. É uma forma das classes médias e altas se distinguirem e ascenderem socialmente.
Mas nunca vi, em nenhum outro lugar, tantos professores praticamente analfabetos.
Em frente a uma escola infantil da Barão de Studart, uma bela frase é atribuída ao grande astrônomo Carl Segan. A crase, coitada, vive entrando de gaiata em lugares onde não é chamada. E já vi professores formados e reformados escreverem vídio, pretencioso, infelismente e outras pequenas jóias da última flor do Lácio, bela e, principalmente, inculta.
Mas o grande exemplo, para mim, aconteceu quando flagrei um professor graduado saindo de uma banca de jornais carregado de revistas. Ele se justificou: “Tem que ter cultura, né?”.
Se revistas para ele são a principal fonte de cultura, eu não sei o que dizer além de agradecer aos céus por não ter sido seu aluno. Livros para ele devem ser revelações sobrenaturais. Entalhadas por Deus em pedra e levadas a alguns poucos escolhidos, para que parem de adorar Baal.
Uma das razões para eu não gostar realmente de nenhuma cidade do Nordeste além de Salvador, descubro agora, é o quanto é difícil achar minha marca de cigarros por aqui.
E não é sequer uma marca rara: o velho e bom Lucky Strike, White. E assim, de vez em quando me vejo obrigado a fumar Carlton ou Free. Como se não bastassem as proibições cada vez piores, ainda tenho que aturar esse desrespeito ao consumidor.
Tem gente que consegue ver mais valor agregado em diretores de arte que em redatores. Isso acontece principalmente em cidades pequenas. Acham que escrever é muito fácil, e que conceituar um layout é muito mais difícil. É simples: todo mundo sabe escrever, mas nem todo mundo sabe desenhar.
A base do raciocínio é até correta. Mas eu acredito piamente que, embora seja realmente mais fácil ser redator que diretor de arte, ser um redator brilhante é mais difícil que ser um diretor de arte brilhante. Muito mais. Escrever todo mundo pode, é verdade. Mas escrever bem, bem mesmo, não é para todo mundo.
Aproveitando a TV a cabo para rever Married With Children, no Sony.
Esse é um dos mais hilários, e mais canalhas, seriados de todos os tempos. Simpsons? Não são nada perto da família Bundy.
O seriado durou cerca de 10 anos. Mostra uma família absolutamente “disfuncional”, como diria um americano. O pai, Al Bundy, é um vendedor de sapatos absolutamente fracassado, preso a uma família medíocre e sufocante, cujo único motivo de orgulho é ter feito 4 touchdowns em única partida, no secundário. A mãe, Peggy, é uma dona de casa preguiçosa e insatisfeita, mas que se recusa a levantar do sofá para fazer alguma coisa. A filha, Kelly, é uma moça muito burra e muito “dada”, o arquétipo da loura burra. E o filho, Bud, é um adolescente cujos únicos relacionamentos se dão com bonecas infláveis.
Essa família só se mantém junta por uma razão: o fracasso. Todos eles são perdedores confessos, e levam a vida com uma moral, no mínimo, duvidosa. Se os Cosby representavam o sonho americano, os Bundy são o pesadelo. O que os leva para a frente é a certeza de que sempre poderão ser cruéis uns com os outros. E por isso Bud acusa Kelly de dar mais que xuxu em cerca, Al acusa Peg de ser a razão de seus infortúnios, Peg reclama que Al é um fracasso total e simplesmente não agüenta fazer sexo com ela, Kelly ri da inapetência social e sexual de Bud. Eles estão juntos porque não têm para onde ir, e porque o fracasso do outros, de uma forma estranha, alivia as suas próprias derrotas.
E, no meio dessa confusão, eles são provavelmente os personagens mais calhordamente engraçados que já vi na televisão.
Curiosamente, eu não conhecia ninguém que ainda gostasse de Married With Children. Mas no início do ano Walter Mosley (um dos melhores autores policiais dos últimos tempos; o filme “O Diabo Veste Azul” é baseado em seu primeiro livro da série de Easy Rawlins) escreveu um artigo no New York Times manifestando essa mesma opinião.
Mme. D’Aiglemont, o interessante naquele link dos Men Without Hats não era a discussão sobre a qualidade do MP3, e sim sua posição a respeito da briga entre gravadoras e downloaders.
De qualquer forma, nesse aspecto ele está equivocado.
Uma música em MP3, com qualidade razoável, tem uma taxa de transmissão de 128 Kbps. A qualidade dessa música é um pouco maior que a transmissão em FM. Não é tão ruim assim, a não ser para audiófilos. Mas pode-se utilizar em taxas de compressão menores, como 160, 192, 256 ou até mesmo 512 Kbps. A perda de picos é mínima, nesses casos. Se é que existe. Para o ouvinte médio, isso não faz diferença.
De qualquer forma, durante décadas, ouvimos música a partir de discos de vinil, e ninguém reclamou.
Infelizmente, para os Men Without Hats, o futuro continua sendo do MP3.
Este artigo da Business Week dá uma visão diferente sobre a estratégia da Apple. Ela pode estar simplesmente ampliando seus horizontes e seguindo o modelo da sony.
Ainda assim eu tenho cá minhas dúvidas.
Assistindo alguns programas na TV a cabo, que eu não via há algum tempo, fico impressionado com a situação deplorável da produção de entretenimento dos Estados Unidos.
Todos eles estão engajados na doutrina Bush, uma visão não apenas canalha, mas absolutamente estúpida do mundo. E dentro desse panorama, boa parte da mídia tem se tornado sustentáculos dessa visão imbecil e que não está fazendo nenhum bem ao mundo.
Um dos programas que me assustaram é Jag, a que nunca assisti antes. Nesse episódio específico, uma militar em Riyad se recusa a usar abayas na cidade, por não ser costume do país dela, e porque ela, como uma dos donos do mundo, se acha no direito de fazer o que quiser. Ela invoca a liberdade constitucional americana para desrespeitar os costumes de outro povo.
O outro programa é 24 Hours, com Kiefer Sutherland, que começou bastante interessante. Hoje, indiretamente, defende a tortura como método de conseguir informações.
A mídia americana sempre foi um suporte importante das posições oficiais do governo; a propaganda maciça durante a II Guerra é o melhor exemplo. Mas quando a coisa ameaçava sair de controle, como durante o mccarthismo, sabia apresentar um determinado nível de resistência.
Os Estados Unidos são responsáveis por algumas das mais belas páginas da história da humanidade, e um modelo para a definição do conceito de liberdade atual. É triste, sim, mas também preocupante, que o país esteja adotando uma política tão descaradamente imperialista. Mas é ainda mais preocupante que a sociedade americana apóie cegamente aquele pastiche de cowboy cocainômano e alcoólatra em sua cruzada.
Eu não faço idéia do que seja o Men Without Hats. Nunca os vi mais gordos ou mais magros. Mas o sujeito que é entrevistado aqui tem mais simples, lúcidas e conseqüentes posições acerca do compartilhamento de músicas na Internet do que qualquer outro músico que eu já tenha visto.